Ó Jesus que subis ao céu, fazei que pelo coração também eu habite no céu.
1 – A liturgia de hoje convida-nos a elevar os nossos corações ao céu para começarmos a habitar em espírito onde Jesus nos precedeu: “A Ascensão de Cristo – diz S. Leão – é a nossa elevação e o corpo tem a esperança de estar um dia onde o precedeu a sua gloriosa Cabeça” (BR.). De fato, já no discurso da última Ceia o Senhor tinha dito: “vou preparar o lugar para vós. E depois que eu tiver ido e vos tiver preparado o lugar, virei novamente, e tomar-vos-ei comigo, para que onde eu estou, estejais vós também” (Jo. 14, 2 e 3). A Ascensão é, portanto, uma festa de radiosa esperança, de suave antegozo do céu: ao entrar nele, jesus, nossa Cabeça, deu-nos o direito de O seguirmos um dia; assim, podemos dizer com S. Leão, “que em Cristo nós mesmos penetramos no mais alto dos céus” (BR.). Como em Cristo crucificado morremos para o pecado e em Cristo ressuscitado ressuscitamos para a vida da graça, assim, pela Sua Ascensão, também nós subimos ao céu. Esta participação vital nos mistérios de Cristo é a grande consequência da nossa incorporação nEle; sendo Ele a nossa Cabeça, nós, os Seus membros, estamos totalmente dependentes dEle e intimamente ligados à Sua sorte. “Deus, que é rico em misericórdia – ensina S. Paulo – pela Sua extrema caridade com que nos amou… convivificou-nos em Cristo… e com Ele nos ressuscitou e nos fez sentar nos céus” (Ef. 2, 4-6). O direito ao céu foi adquirido, o lugar está pronto, compete-nos agora viver de modo a merecermos ocupá-lo um dia. Entretanto, na expectativa, devemos viver a bela prece que a liturgia nos põe nos lábios: “Deus Todo-poderoso, concedei-nos a graça de também nós vivermos em espírito na morada celeste” (Colecta). “Onde está o teu tesouro, aí está também o teu coração” (Mt. 6, 21), disse Jesus um dia. Se Jesus é verdadeiramente o nosso tesouro, o nosso coração não poderá estar senão no céu junto dEle. Este é o grande anseio da alma cristã, tão bem expresso no hino de Vésperas de hoje: “Ó Jesus, sede a meta dos nossos corações, sede o conforto das nossas lágrimas, sede o doce prêmio da nossa vida” (BR.).
2 – Mas a par da esperança e da alegre expectativa do céu, a festa da Ascensão tem a sua nota de melancolia. Perante a partida definitiva de Jesus, os Apóstolos sentem-se tomados por uma sensação de temor, o temor de quem vê afastar-se para sempre o amigo e protetor mais querido e se encontra só, em face das dificuldades da vida. O Senhor vê o estado de espírito dos Seus e mais uma vez os conforta, prometendo a vinda do Espírito Santo, o Espírito Consolador: “Ordenou-lhes – lemos na Epístola (Act. 1, 1-11) – que não se afastassem de Jerusalém, mas que esperassem a promessa do Pai… Vós sereis batizados no Espírito Santo daqui a poucos dias”. Ainda desta vez os Apóstolos não compreenderam. Como tinham necessidade de ser iluminados e transformados pelo Espírito Santo para ficarem aptos para a grande missão que lhes seria confiada! E de fato Jesus repetiu: “Recebereis a virtude do Espírito Santo… e me sereis testemunhas… até às extremidades da terra”. De momento, porém, estão ali, junto do Mestre, medrosos, atemorizados, tal como as crianças que veem partir a mãe para um país longínquo e desconhecido. Efetivamente, enquanto os seus olhares estão dirigidos para Ele, Jesus eleva-Se para o alto e uma nuvem esconde-O aos seus olhos. Foi preciso virem dois Anjos para os tirarem daquele abatimento e para os chamarem à realidade do fato consumado. Então, confiando na palavra de Jesus, que é doravante o seu único apoio,, voltam para Jerusalém e fecham-se no Cenáculo, esperando, em oração, o cumprimento da promessa. Foi a primeira novena de Pentecostes: “perseveraram unanimemente em oração… com Maria, Mãe de Jesus” (Act. 1, 14).
Retiro, recolhimento, oração, concórdia com os irmãos, união com Maria Santíssima, eis as características da novena que nos deve preparar também a nós para a vinda do Espírito Santo.
Colóquio – “Ó meu Deus, ó meu Jesus, Vós Vos ides e Vos separais de nós! Oh! que alegria haverá no céu! Mas nós ficamos cá na terra. Ó Verbo eterno, que Vos fez a criatura por quem fizestes tantas coisas que até agora subis ao céu para sua maior glória? Dizei-me, que Vos fez a criatura para a amardes tanto? Que lhe dais? Que exigis dela? Amais tanto a criatura que Vós mesmo Vos dais a ela, Vós que sois tudo e fora de Vós nada mais existe. Quereis dela todo os eu querer e saber, pois que, dando-Vos isto, dá-Vos tudo o que tem. Ó Sabedoria infinita, ó Bondade suprema, ó Amor, ó Amor desconhecido, tão pouco amado e por tão poucos possuído! Ó ingratidão nossa, causa de todo o mal; ó pureza pouco conhecida e pouco desejada! Ó meu Esposo, agora que estais no céu com a Vossa Humanidade, sentado à direita do Pai eterno, criai em mim um coração puro e renovai no meu interior um espírito reto” (Sta M. Madalena de Pazzi).
“Ai de mim, Senhor, como é longo este desterro! Passam-se grandes penas com o desejo de Vos ver. Senhor, que fará uma alma metida neste cárcere?… Desejo contentar-Vos. Vedes-me aqui, Senhor! Se é necessário viver para Vos prestar algum serviço, não recuso todos e quantos trabalhos me possam vir na terra. Mas, ai dor! ai que dor tenho de mim, Senhor meu! Eu tenho só palavras, pois não valho para mais. Valham-me meus desejos, Deus meu, diante do Vosso divino beneplácito e não olheis aos meus poucos mértios.
“Ah! miseráveis são meus serviços embora Vos fizesse muitos, ó meu Deus! Para que hei de estar nesta miserável vida? Para que se faça a Vossa vontade. poderá haver maior lucro, alma minha? Espera, espera, pois não sabes quando virá o dia nem a hora. Vela com cuidado, que tudo passa com brevidade, embora o teu desejo torne certo o duvidoso e longo o tempo breve. Olha que quanto mais pelejares, mais mostrarás o amor que tens ao teu Deus e mais te regozijarás com o teu amado, em gozo e deleite que não pode ter fim” (T.J. Ex. 15).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.