A Caridade

Senhor, fazei que, por meio da caridade, eu participe verdadeiramente na Vossa vida de amor.

1 – A fé une-te a Deus por meio do conhecimento e, por conseguinte, relaciona-se sobretudo coma tua mente; a esperança une-te a Deus por meio da convicção de que O possuirás um dia na vida bem-aventurada e, portanto, relaciona-se sobretudo com o eu desejo de felicidade; mas a caridade apodera-se de todo o teu ser e, por meio do amor, lança-o para Deus. A fé diz-te quem é Deus, revela-te o mistério da sua vida íntima na qual foste chamado a participar; a esperança diz-te que esse Deus quer ser o teu bem por toda a eternidade, mas a caridade permite-te alcançá-lo imediatamente em virtude da força unitiva que lhe é própria. “A caridade – ensina S.. Tomás – faz tender para Deus, unindo o afeto do homem a Deus, de tal modo que o homem já não viva por si, mas por Deus” (IIª IIª, q. 17, a. 6, ad 3).

Mas que caridade é esta que tem o poder de nos unir a Deus, de nos fazer viver em relações íntimas com Ele a tal ponto que “quem permanece na caridade, permanece em Deus e Deus nele”? (I Jo. 4, 16). É uma participação na caridade, no amor infinito com que Deus Se ama a Si mesmo, ou seja, no amor com que o Pai ama o Filho, com que o Filho ama o Pai e com que um e outro Se amam no Espírito Santo. Por meio da caridade és chamado a entrar nesta corrente, neste círculo de amor eterno, que une entre Si as três Pessoas da Santíssima Trindade. A fé, tornando-te participante no conhecimento que Deus tem de Si próprio, já te introduz na intimidade da vida divina, mas a caridade faz-te penetrar ainda mais adentro, inserindo-te, por assim dizer, no movimento de amor, de amizade incomparável que existe no seio da trindade Santíssima. A caridade lança-te para o centro da vida íntima de Deus, torna-te capaz de te associares ao amor infinito das três divinas Pessoas: por ela, juntamente com o Pai, amas o Filho, com o Filho amas o Pai e amas o pai e o Filho no amor do Espírito Santo.

2 – Por meio da esperança também amas a Deus, mas amá-lO pelo auxílio, pela ajuda que dEle esperas; a caridade, pelo contrário, torna-te capaz de amar a Deus por Si mesmo, porque Ele é a bondade, a beleza, a sabedoria infinita, numa palavra, porque é Deus. O amor que acompanha a esperança, apesar de ser preciosíssimo, é ainda imperfeito porque é amor de concupiscência por meio do qual se ama a Deus pelos benefícios que dEle se recebem. O amor de caridade, ao contrário, é perfeito, porque é puro amor de complacência, de benevolência, quer dizer, amor que se compraz no bem infinito de Deus e que quer este Seu bem, não em vista do proveito próprio, mas por Ele, pela Sua felicidade e pela Sua glória. A caridade eleva o teu amor a tais alturas que o torna capaz de amar realmente a Deus como Ele mesmo Se ama, embora não com a mesma intensidade. Deus ama-Se a Si próprio com amor de complacência e de benevolência infinitas: o Pai compraz-Se infinitamente no bem infinito do Filho e quere-o infinitamente; por Sua vez, o Filho deleita-Se no bem infinito do Pai e quere-o infinitamente e do mesmo modo o Pai e o Filho a respeito do Espírito Santo e vice-versa. Entre as três Pessoas divinas há, portanto, um amor de amizade puríssima pelo qual Se deleita cada uma no bem e na felicidade da outra e cada uma quer a glória da outra. A caridade torna-te capaz de amar a Deus com este amor de amizade, ou seja, de O amar sobretudo por Ele, pela Sua glória e pela Sua felicidade. É verdade que tu, pequena criatura, nada podes acrescentar á felicidade e à glória intrínseca de Deus; contudo, a caridade para com Ele leva-te a empenhares-te com todas as tuas forças em agradar-Lhe, em dar-Lhe, se é lícito falar assim, a alegria de te ver corresponder plenamente ao Seu amor; impele-te a consagrares-Lhe toda a tua vida, a dares-te a Ele sem reservas; move-te a buscar, acima de tudo, a Sua vontade, os Seus interesse, a Sua glória, pondo de parte a tua vontade, os teus interesses pessoais. Agora compreendes melhor a sentença de S. Tomás: “A caridade une o afeto do homem a Deus, de tal modo que já não viva por si, mas por Deus”.

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

Este texto foi útil para você? Compartilhe!

Deixe um comentário