A compaixão de Jesus – Sexto Domingo depois do Pentecostes

Ó Jesus, meu Senhor e meu Pai, tende compaixão da minha pobre alma e sustentai-a com a Vossa graça.

1 – Há na liturgia de hoje um pensamento totalmente predominante: o Senhor é o Pai misericordioso que tem compaixão de nós e alimenta as nossas almas. A nossa alma está sempre faminta. Tem sempre necessidade de alimentar e sustentar a sua vida sobrenatural; só Deus nos pode dar o alimento adequado e por isso a Igreja convida-nos hoje a dirigir-Lhe esta bela oração: “Deus todo-poderoso, fonte de tudo quanto é perfeito, infundi em nossos corações o amor… aumentai em nós o espírito em nossos corações o amor… aumentai em nós o espírito de religião… o bem que em nós há, fortalecei-o e assim fortalecido, conservai-o” (Colecta). O Pai celeste acolhe benignamente a nossa súplica e responde-nos encaminhando-nos para o Seu divino Filho, o Seu Unigênito que enviou ao mundo a fim de que nEle tivéssemos a vida. Na Epístola (Rom. 6, 3-11), S. Paulo recorda-nos que “fomos batizados na morte de Cristo” para “vivermos uma vida nova” e nEle podermos “viver para Deus”. Por conseguinte, em Jesus, na Sua Redenção, encontramos tudo aquilo de que temos necessidade para alimentar a vida das nossas almas; encontramos a graça, o amor, a fé, o amparo dos nossos bons propósitos, exatamente como pedimos na Colecta. É uma grande alegria para nós ouvir repetir que ressuscitamos em Cristo para “uma vida nova”; é um grande conforto para a nossa fraqueza. Contudo, há ainda um ponto obscuro: mas então, porque continuamos a cair e nos vemos sempre tão miseráveis? Uma leitura mais atenta totalmente “mortos” com Cristo, em nós “o homem velho” não foi ainda “crucificado” até ao ponto de “não servirmos jamais ao pecado”. Numa palavra, se queremos viver plenamente a vida que Cristo nos conquistou com a Sua morte, devemos primeiro morrer com Ele. E como se trata não da morte material do corpo, mas duma morte espiritual aos nossos defeitos, às nossas paixões, esta morte deve renovar-se continuamente: “quotidie morior” (I Cor. 15, 31): todos os dias morro a mim mesmo. A fraqueza da nossa vida espiritual provém da insuficiência desta morte.

2 – Ouçamos, no Evangelho (Mc. 8, 1-9), as palavras bondosas de Jesus: “Tenho compaixão deste povo”. Jesus tem compaixão de nós, das nossas fraquezas, da nossa debilidade, da indecisão da nossa vontade. Vê as nossas almas cansadas, famintas, necessitadas de auxílio e, como outrora às turbas que vinham para O ouvir, repete-nos também a nós: “Tenho compaixão”. A compaixão de Jesus volta-se primeiro para as nossas necessidades espirituais; com a Sua Paixão e Morte já proveu com liberalidade a essas necessidades, mas deseja continuar a cuidar delas todos os dias de um modo mais pessoal e direto, oferecendo-Se como alimento às nossas almas. O Evangelho fala-nos da segunda multiplicação dos pães, mas para nós, mais afortunados que as multidões da Palestina, Jesus reservou um pão infinitamente mais nutritivo e mais precioso: a Eucaristia.

Fascinadas pelas palavras de Jesus, as turbas haviam-nO seguido, esquecendo até as próprias necessidades: andavam com Ele há três dias e não tinham nada para comer. Que lição para nós, muitas vezes mais solícitos pelo pão material do que pelo espiritual! E Jesus, depois de ter provido largamente às necessidades do espírito, pensa também nas do corpo. Os discípulos, por sua vez, ficam admirados: “como poderá alguém saciá-los de pão aqui no deserto?” Já tinham assistido à primeira multiplicação dos pães, mas agora parece não terem dela a menor lembrança e ficam desconfiados. Quantas vezes palpamos nós de igual modo os milagres da graça, os milagres da divina Providência! Porém, não é raro ficarmos perplexos em face de novos casos difíceis e obscuros, com se puséssemos em dúvida a onipotência de Deus. Pensemos, por exemplo, na nossa vida espiritual: existem ainda pontos por vencer, por superar… experimentamo-lo tantas vezes e talvez agora não tenhamos já coragem para recomeçar de novo. Oh! se tivéssemos mais fé, se nos lançássemos em Deus com maior confiança! Bastaria talvez um belo ato de confiança total para conseguir a vitória. Jesus olha-nos e repete-nos: “tenho compaixão deste povo”; e a Sua compaixão não é estéril; É ação vital, é auxílio e graça atual para a nossa alma; porque não temos, pois, mais confiança nEle?

Colóquio – “Ah, Senhor meu! Tenho necessidade da Vossa ajuda, porque sem ela nada posso fazer. Por Vossa misericórdia não consintais que a minha alma seja enganada, deixando o caminho começado. Dai-me luz para que veja como está nisto todo o meu bem…

“Fazei-me compreender que a minha fé em Vós deve apoderar-se da minha miséria e não me devo espantar… se me acontecer sentir temor e fraqueza. Devo deixar que a carne faça o seu ofício, lembrando-me de que Vós, ó Jesus, dissestes na oração do horto: ‘a carne é fraca’… Se a Vossa carne divina e sem pecado é enferma, com quererei que a minha seja tão forte que não sinta temor? Portanto não me quero queixar de temores nem desanimar por ver fraco o meu natural. Quero confiar na Vossa misericórdia desconfiando das minhas forças, porque toda a minha fraqueza está em me apoiar nelas” (T.J. M. II, 6, P. 3, 10 e 12).

“A Vós recorro, ó Senhor; não permitais que eu seja confundido para sempre; livrai-me segundo a Vossa justiça! Inclinai para mim o Vosso ouvido, acudi prontamente a livrar-me. Sede para mim uma rocha de refúgio, uma cidadela fortificada para me pordes a salvo; porque Vós sois a minha rocha e a minha cidadela; por amor do Vosso nome conduzi-me e guiai-me. Nas Vossas mãos encomendo o meu espírito; Vós me libertastes, ó Senhor, Deus fiel. Regozijar-me-ei e alegrar-me-ei com a Vossa misericórdia porque olhastes para a minha miséria, socorrestes a minha alma nas angústias e não me entregastes nas mãos do inimigo, antes pusestes os meus pés em em lugar seguro… Eu confio em Vós, Senhor, salvai-me pela Vossa misericórdia! Não seja eu confundido porque Vos invoquei… porque grande bondade tendes reservada para os que Vos temem e a concedeis aos que se refugiam em Vós. Esforçai-vos e fortalecei o vosso coração, vós todos que esperais no Senhor” (Sal. 30).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

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