Ó Senhor, dilatai o meu coração na generosidade a fim de que eu saiba dar-me totalmente ao Vosso serviço.
1 – A generosidade é uma virtude muito semelhante à magnanimidade, embora tenha um campo mais vasto, pois abrange não só coisas grandes, mas tudo o que diz respeito ao serviço de Deus, impelindo a alma a fazê-lo com a máxima dedicação. A generosidade é a virtude que nos ensina a não nos pouparmos, a não calcular, a não dizer nunca “basta”, a darmo-nos totalmente, a agir com o máximo de amor, quer nas coisas grandes, quer nas pequenas e até nas mínimas. Só a alma que se libertou dos laços do egoísmo pode tornar-se plenamente generosa, capaz de se dar totalmente ao serviço de um ideia, ao cumprimento da sua missão, sem retornos sobre si mesma, sem se deter em preocupações pessoais. Se tivéssemos compreendido verdadeiramente que a nossa vocação vem de Deus e que Deus colocou no nosso caminho todas as graças necessárias para lhe correspondermos da maneira mais perfeita, não desanimaríamos com os sacrifícios que ela nos impõe. O egoísmo, a preocupação consigo mesmo, os desânimos, tudo são inimigos da generosidade, “terra e chumbo” que pesam e que tornam mais fatigante a nossa vida espiritual, impedindo-nos o voo para as alturas. porque nos havemos de limitar a caminhar “a passo de galinha” (T.J. Vi. 13, 5) quando Deus nos tornou capazes de voar como as águias? Sta Teresa de Jesus sorri um pouco maliciosamente daquelas almas que temem fazer demais por Deus e que, sob o pretexto de prudência, medem centímetro a centímetro os seus atos de virtude: “Não tenhais medo que se matem, porque têm muito em conta a sua razão; o seu amor não é tão forte que lha faça perder. Quereria eu que a tivéssemos a ponto de não nos contentarmos com este modo de servir a Deus, sempre a passo tão lento que nunca acabaremos de percorrer este caminho. Parece-vos que se pudéssemos ir de uma terra a outra em oito dias, ficaria bem levarmos um ano?” (M. III 2, 7). O atalho para chegar depressa ao fim é a generosidade, a generosidade que é fruto do amor que que, ao mesmo tempo, é geradora de amor.
2 – Para nos tornarmos generosos é necessário aprendermos a esquecer-nos de nós: a esquecer os interesses próprios, as comodidades, os próprios direitos, a não ter em conta quanto já nos cansamos e sofremos, pensando antes em dar-nos totalmente a Deus e às almas. “Para Deus o Seu beneplácito. Para o próximo, a sua vantagem, mesmo à minha custa. Para mim o mais penoso para agradar a Deus” (B. M. Teresa de Soubiran), eis o programa da alma generosa. Quer servir-se unicamente da sua vida, das suas forças, das suas capacidades para se dar sem cessar ao Senhor porque sabe que o máximo amor consiste no dom total de si própria. “Amar é dar tudo e dar-se a si mesmo” (T.M.J. Poesia).
Pra nos tornarmos generosos é necessário aprender a fazer, com todo o coração, não só o que é de dever, mas também o que, embora não seja obrigatório, dá mais glória a Deus. Sta Teresa de Jesus dá-nos, a propósito, uma regra de ouro: põe como “primeira pedra” do edifício espiritual a decisão de “seguir o mais perfeito” (Cam. 5, 3). A proposta pode parecer muito ousada, todavia a Santa não fala ao acaso; mesmo que ao princípio a alma não consiga discernir nem fazer sempre o mais perfeito, no entanto esta resolução – se é sincera, acompanhada de humildade e de confiança no auxílio da graça – servir-lhe-á de grande incitamento para querer fazer sempre melhor, sempre mais, impedindo-a de se contentar com uma tranquila mediocridade. É muito importante que a alma desejosa de intimidade divina cultive em si esta disposição; deste modo chegará pouco a pouco ao dom total de si mesma, dom que Deus espera para Se dar de todo a ela. “Deus não Se dá de todo até que de todo nos demos a Ele” (T.J. Cam, 28, 12). Já desde este mundo Deus quer dar-Se às nossas almas, mas a medida do Seu dom será proporcionada à do nosso, estará em relação com a nossa generosidade em nos darmos a Ele.
Colóquio – “Ó Senhor, quão pouco fazemos por Vós! A menos que queiramos considerar como sinais de virtude e de mortificação alguns pequenos atos que, como o sal, não têm peso nem volume e que até um pássaro pode levar no bico.
“É grande lástima fazermos caso de algumas coisas que fazemos por Vós, ainda que sejam muitas! Eu faço sempre assim e a cada passo esqueço as mercês que recebo de Vós. Não digo que Vós não as temais em muito, porque sois bom; porém eu quereria não fazer caso delas, nem sequer ver que as faço pois nada são.
“Mas perdoai-me, Senhor meu, e não me culpeis, com alguma coisa tenho de me consolar, pois não Vos sirvo em nada; se Vos servisse em coisas grandes, não faria caso destas ninharias. Bem-aventurados os que Vos servem com obras grandes! Se me fossem tomados em conta o desejo e a inveja que lhes tenho, não ficaria atrás em Vos contentar! Mas não valho nada, Senhor meu! Dai-me Vós a força, já que tanto me amais.
“Meu Deus, fazei que eu não me contente com servir-Vos no pouco, mas que Vos sirva o mais que puder! ajudai-me a fazer-Vos o dom absoluto da minha alma, desembaraçando-a de todas as coisas para que possais pôr e tirar como coisa Vossa. Tendes direito a isso, não Vo-lo nego. Vós não forçais a nossa vontade, tomais o que Vos damos, mas não Vos dais a nós de todo até que de todo nos demos a Vós. Sois amigo da ordem e não operais na alma senão quando estiver desembaraçada e for toda Vossa” (T.J. Vi. 39, 13; 20, 23; Cam. 28, 12).
“Ó amantíssimo Verbo de Deus, ensinai-me a ser generoso, a servir-Vos como mereceis, a dar em contar, a combater sem me preocupar com as feridas, a trabalhar sem procurar repouso, a despojar-me de mim mesmo sem esperar outra recompensa além de saber que estou a fazer a Vossa santa vontade” (Sto Inácio).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.
Última atualização do artigo em 25 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico