O ouvido que atender às repreensões da vida, terá a sua morada entre os sábios (Prov, XV, 31).
De certo, ó jovem cristã, encontras encanto e atrativo em ler muito! É uma louvável afeição! Mas a tua leitura não se há de limitar a um entretenimento agradável, ou à instrução da tua inteligência; deves também procurar livros que alimentem o teu coração, que avivem em ti a piedade, estimulem e fomentem a virtude e encerrem prudentes conselhos e avisos.
Enfastiam-te os livros piedosos? mas não precisas de empregar na sua leitura todo o dia ou uma hora inteira. Basta que dediques a ocupação tão proveitosa um curto espaço de tempo.
O fruto não consiste em ler muito, mas sim em que a leitura seja boa, e feita com atenção, constância e regularidade.
Livros espirituais são aqueles que tratam só ou principalmente das coisas da alma.
Estes, instruem-nos acerca das nossas relações com Deus e com o próximo, acerca da virtude em geral e de cada uma em particular. Nele vemos como em espelho o que nos falta, e o que devemos corrigir em nós.
Descobrem-nos as ciladas do demônio e o modo de nos livrarmos delas; são como arsenais sagrados, onde temos armas em ambundância para nos defendermos dos inimigos da salvação.
Despertam as consciências adormecidas, abrandam os corações endurecidos, apoiam os vacilantes, ensinam os extraviados, estimulam os preguiçosos, alentam e dirigem os fervorosos. Apartam das coisas da terra, fazendo-nos aborrecê-las, despertam em nós desejos da perfeição, de fome e sede de justiça, e entusiasmo pelo céu e pelas coisas divinas.
A leitura deles aumenta em nós o amor de Deus pela consideração da sua admirável perfeição e formosura, e o temor de Deus pela revelação da sua terrível onipotência, justiça e santidade. Faz-nos penetrar no amorosíssimo Coração de Jesus, nosso Salvador, e enriquece-nos com os tesouros inesgotáveis que encerra.
Tais são os bens e riquezas que os livros espirituais nos proporcionam. Fundando-se nos princípios do evangelho, explicam-nos, desenvolvem-nos, e acomodam-nos a todos os estados e circunstâncias da vida, tornando-nos assim mais fácil, mais seguro e mais breve o caminho da salvação.
Mas para que a leitura seja frutuosa, hás de fazê-la com ordem e com um fim determinado.
Escolhe livros que sirvam mais para mover salutarmente o coração do que para satisfazer a curiosidade do entendimento.
Não leias por mera curiosidade; a minha alma, dirás contigo mesma, há de tirar proveito desta leitura; quero fazê-la por Deus e com Deus.
Recolhe-te uns momentos antes de a começares. Senhor, de quem procede todo o bem, iluminai as minhas trevas com um raio da vossa luz, a fim de que eu compreenda o que vou ler; tocai-me o coração para me resolver a pôr em prática o que li.
lê com respeito, como se fosse o próprio Deus quem te fala. Falai, Senhor, que a Vossa serva ouve (1). Lê com atenção, sem precipitação para que a torrente não desapareça com o mesmo ímpeto com que apareceu. Embebe o espírito na leitura e aplica a ti mesma a doutrina que leres. Pára uns momentos no mais importante, e tira resoluções salutares para a vida ordinária. Lê pouco cada vez, mas com muita atenção.
Lê com ordem, e parágrafo porparágrafo.
Seja só um o livro da tua predileção, e não o deixes ainda que o tenhas percorrido já várias vezes.
Lê-o com constância, todos os dias ou vários na semana, à hora marcada, nos domingos e dias festivos ou nos dias de confissão e comunhão.
Os que são de Deus, ouvem a sua palavra (2). Estas palavras do Salvador podem-se aplicar também aos livros; se a leitura espiritual não agrada a muitos, é porque lhes causa tédio o que é de Deus e a Ele conduz.
Mas tu, aproveita-te de tão excelente auxílio qual é a leitura espiritual; porque os ouvidos que ouvem as advertências, habitarão entre sábios (3).
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) 1 Reis, III, 10.
(2) Joan. VIII, 47.
(3) Prov. XV, 31.
Última atualização do artigo em 9 de março de 2025 por Arsenal Católico