A língua mentirosa mata a alma (Sab. I, 11).
Senhor, Vós criastes a alma para a verdade! E a minha precisa dela, porque nela está a sua vida e só ela satisfaz os seus anelos.
Vejo que a mentira envilece a alma e profana aquela imagem de Deus, em que consiste a minha principal beleza e glória.
Como não a odiareis pois, se ela vai ferir diretamente a vossa íntima natureza, que é a mesma verdade (1) Abominação para o Senhor, são os lábios mentirosos (2).
A mentira é a obra característica de Satanás; foi uma mentira sua que fez cair sobre o gênero humano toda a espécie de desgraças e tribulações. Foi daí que lhe ficou o nome de pai da mentira. Por isso, quando mente, procede como quem é (3).
Vício odioso, que imprime em mim o selo de Satanás, e que deixa no homem uma nódoa abominável (4).
Como poderá ser de pouca importância o que Deus aborrece e agrada a Satanás?
E contudo a mentira está tão generalizada, que muitos a consideram como uma coisa normal, como uma necessidade imprescindível da vida.
É certo que nem sempre estamos obrigados a dizer tudo o que sabemos, e sobretudo quando a justiça e a caridade nos impedem de revelar o segredo. mas ela em nenhum caso é lícita, ainda que fosse o único meio para podermos conjurar um mal grave, ou conseguir um grande bem. Menos desculpável ainda seria, se se proferisse com má intenção.
Ordinariamente a mentira nasce do amor próprio.
Quando pretendes ser agradável a alguém ou dar interesse à tua conversa, deitas mão da adulação: dizes do próximo o que não sentes, exageras e bordas a conversa à custa da verdade.
Quando te queres fazer estimada, aproprias-te alguma boa qualidade que não possuis, e procuras fazer valer essa qualidade imaginária.
Quando pretendes ocultar os teus defeitos e poupar-te a alguma humilhação, desfiguras os fatos e procuras desculpar-te com detrimento da verdade.
Desejas conseguir alguma vantagem sobre o próximo? Então escureces as suas boas qualidades, atribuis-lhe defeitos que não tem ou exageras os que tem, e exaltas-te e justificas-te a ti, faltando à verdade.
Deste modo evitas evidentemente a humilhação, e enganas os que te rodeiam; mas, que dirão e pensarão de ti, se um dia vierem a descobrir a verdade? Que vergonha passares por embusteira! E ainda que ninguém suspeite sequer que mentiste, acaso não te remorde a consciência debaixo da acusação de que tens impresso em ti o selo da mentira, como filha de Satanás?!
Foge pois, e aborrece a mentira, porque é abominação na presença do Senhor, porque destrói o bem natural, a fidelidade e o crédito entre os homens, e é causa de inumeráveis pecados contra a justiça e a caridade.
Repete a miúdo: Apartai de mim, Senhor, a vaidade e a mentira (5); concedei-me e conservai em mim um coração reto (6). Vós amais a verdade e persuadis-me que a ame também (7). Ponde, Senhor, um freio à minha boca, e aos meus lábios uma porta que os feche. Não permitais que o meu coração deslize em palavras de maldade, para se desculpar dos seus pecados (8).
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) Joan. XIV, 6.
(2) Prov. XII, 22.
(3) Joan. VIII, 44.
(4) Ecl. XX, 26.
(5) Prov. XXX, 8.
(6) Ecl. XXXVII, 19.
(7) Salm. CXVII, 138.
(8) Salm. CXL, 3-4.
Última atualização do artigo em 24 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico