A oração litúrgica

Ó Jesus, Cabeça do Corpo Místico, fazei que, rezando com a Igreja, eu possa unir-me à Vossa oração.

1 – O cristão não é um ser isolado; como homem, pertence à grande família humana, e como batizado, está enxertado em Cristo, na qualidade de membro do Seu Corpo Místico que é a Igreja. O cristão é filho de Deus e é filho da Igreja, pois é justamente no seio da Igreja que se torna filho de Deus; por isso toda a sua vida espiritual, ainda que tenha um caráter pessoal que tende ao contato íntimo com Deus, deve também ter um caráter social, litúrgico, participando na vida da Igreja. por outras palavras, a vida espiritual do cristão deve estar enquadrada na da Igreja, sua mãe, deve estar associada a tudo o que a Igreja faz, em união com Cristo, Sua Cabeça, para prolongar no mundo a Sua ação santificadora.

Como a nossa vida espiritual nasce, cresce e se desenvolve no seio da Igreja, assim a nossa oração – que é a expressão mais alta da vida espiritual – deve estar inserida na oração da Igreja, ou seja, na oração litúrgica. A oração litúrgica é duma excelência muito particular porque não é propriamente a oração de cada alma, por mais sublime e elevada que seja, mas a oração que toda a Igreja dirige a Deus em união com Jesus, seu Esposo e sua Cabeça. É como um prolongamento da oração de Jesus, ou antes, é uma participação naquelas súplicas que Ele próprio, na glória do céu e na humilde solidão dos nossos altares, sempre oferece ao Pai, louvando-O em nome de todas as criaturas e intercedendo pelas necessidades de todas e de cada alma. “A sagrada liturgia é o culto público que o nosso Redentor presta ao Pai, como Cabeça da Igreja e é o culto que a sociedade dos fiéis rende à sua Cabeça e, por meio dEla, ao Eterno Pai” (Enc. Mediator Dei).

Quando sentirmos a pobreza da nossa oração pessoal, ofereçamos a Deus a grande oração de Jesus e da Igreja e associemo-nos espiritualmente a ela.

2 – A oração litúrgica, sendo a oração pública da Igreja, dá necessariamente um grande lugar aos atos de culto externo, como cerimônias, cânticos, recitações coletivas, etc., que devem ser executados com grande cuidado. Todavia, isso não seria suficiente se não fosse acompanhado pelo culto interno. “A sagrada liturgia requer que estes dois elementos – culto interno e culto externo – estejam intimamente ligados” (Med. Dei). Não basta, portanto, assistir aos ritos sagrados, participar nas cerimônias, nas orações coletivas; tudo isso deve ser vivificado pela oração interior e pessoal que eleva o coração a Deus no desejo de O honrar e de se entreter com Ele. Na própria vida espiritual, cada alma tem a liberdade de dar maior lugar à oração litúrgica ou à oração pessoal, segundo a sua devoção; porém estas duas formas de oração nunca se devem contrapor ou separar, mas devem unir-se de modo que uma compenetre e sustente a outra. Como a oração litúrgica deve ser vivificada pela oração pessoal, assim esta deve ser enquadrada na oração litúrgica e alimentada por ela. De fato, como verdadeiros filhos da Igreja, devemos procurar apoiar a nossa oração pessoal na liturgia. Seguindo as orações litúrgicas – ao menos através dos textos do Missal e do Vesperal festivo – poderemos sintonizar a nossa vida de oração com os grandes mistérios da vida de Cristo que a Igreja nos apesenta nos vários tempos litúrgicos, convidando-nos não só a considerar tais mistérios, mas também a associarmo-nos a eles. Assim, no Advento, a nossa oração deve centrar-se no mistério da Incarnação; na Quaresma, no da Paixão e Morte de Jesus, e assim por diante.

Deste modo, a liturgia torna-se o grande binário da nossa vida de oração e oferece-lhe um alimento deveras substancial. Assim, a oração pessoal penetra na oração litúrgica e vice-versa, visto que, depois de termos contemplado, na oração, os mistérios que a liturgia nos apresenta, voltaremos à oração litúrgica com maior capacidade para a compreender e saborear.

Colóquio – “Ó meu Deus, como ficaria desanimada por causa da minha fraqueza e nulidade se, para Vos louvar, reverenciar e glorificar, não tivesse Jesus Cristo, meu único Bem, que o faz tão excelentemente! Confio-Lhe as minhas impotências e alegro-me porque Ele é tudo e eu nada… Sim, ó Jesus, em Vós eu possuo tudo, Vós sois a minha Cabeça e eu sou realmente um membro Vosso. Vós rezais, adorais, humilhais-Vos e agradeceis em mim e por mim e eu em Vós, porque o membro forma um todo com a Cabeça. A Vossa vida tão santa e tão grande, absorve a minha, tão vil e tão mesquinha” (cfr. B. M. Teresa de Soubiran).

Ó Jesus que, estando à direita do Pai, intercedeis continuamente por nós, dignai-Vos absorver na Vossa grande oração, a minha tão pobre.

“Ó Jesus, concedei-me a graça de adorar o Pai ‘em espírito e verdade’, concedei-me a graça de O adorar por meio de Vós e em união conVosco porque só Vós sois o único Adorador em espírito e verdade” (cfr. I.T. I, 9). Só Vós sois o verdadeiro Orante cuja oração e adoração são perfeitamente dignas da Majestade infinita. Só Vós sois o louvor perfeito da Santíssima Trindade, mas a este louvor quereis associar a Igreja, Vossa Esposa e minha Mãe, quereis associar-me também a mim, Vosso membro e filho da Igreja. Fazei portanto que, participando na oração da Igreja, eu participe também na Vossa oração. Não olheis para a pobreza da minha oração pessoal, mas vede-a associada à oração sublime e incessante da Vossa Esposa, vede-a unida ao coro perene de louvores e de súplicas que, de todos os lugares da terra, os Vosso Sacerdotes, as almas a Vós consagradas e todos os Vosso eleitos, elevam continuamente ao Vosso trono. Fazei que neste magnífico coro a minha voz não destoe. Para isso ajudai-me a rezar com verdadeiro espírito de piedade, com a alma atenta e devota, de modo que o coração acompanhe sempre o movimento dos lábios, e que o movimento interior vivifique todos os gestos, todos os cânticos, todas as palavras.

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

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