Senhor, ensinai-me a orar!
1 – Quando os Apóstolos pediram a Jesus: “Senhor, ensina-nos a orar” (Lc. 11, 1), Ele ensinou-lhes simplesmente uma oração vocal: o Pater noster. Trata-se, sem dúvida, da fórmula mais sublime que existe e que encerra toda a essência da mais elevada oração mental. Todavia Jesus propô-la como fórmula de oração vocal: “Quando orardes, dizei” (ib. 2). Isto é suficiente ara entender o valor e a importância da oração vocal, oração acessível a todos, mesmo às crianças, aos ignorantes, aos doentes, as fatigados… Por isso é necessário compreender bem a oração não consiste só na repetição material de uma fórmula: se fosse assim, haveria uma recitação, mas não uma oração, pois que a oração exige sempre um movimento, uma elevação da alma para Deus. Foi neste sentido que Jesus instruiu os Seus discípulos: “Quando orares, entra no teu quarto e fecha a porta, em segredo ora a teu Pai… Nas vossas orações não queirais usar muitas palavras como os pagãos” (Mt. 6, 6-7). É interessante ver como em S. Mateus estas prescrições, que dizem respeito às disposições externas e internas para uma oração bem feita, precedem precisamente o ensino do Pater noster.
Portanto, para que a oração seja realmente oração é necessário antes de tudo recolher-se na presença de Deus, aproximar-se dEle, tomar contato com Ele; só com estas disposições as palavras pronunciadas com os lábios serão a expressão da devoção interior e poderão sustentá-la e alimentá-la. Infelizmente, como somos levados a atender mais ao lado material que ao espiritual das cosias, e muito fácil que na oração vocal nos contentemos com uma recitação mecânica, sem nos preocuparmos com dirigir o coração para Deus. Devemos por isso vigiar e reagir sempre. Uma oração vocal feita só com os lábios, dissipa e cansa em vez de recolher a alma em Deus e não se pode verdadeiramente dizer que seja um meio para nos unir mais a Ele.
2 – Sta Teresa de Jesus, desejosa de educar e de dispor as almas para o trato íntimo com Deus, orienta para este fim a oração vocal e diz a propósito: “recomendo-vos que unais sempre a oração mental à vocal” (Cam. 22, 3). E explica assim o seu pensamento: “Se, falando, estou perfeitamente a entender e a ver que falo com Deus, pondo nisto mais advertência do que nas palavras que digo, juntas estão a oração mental e a vocal” (ib.). A Santa não quer de maneira nenhuma descurar a exatidão da recitação – o que tem muita importância, particularmente na oração litúrgica, como no Ofício divino – mas quer dizer que o ponto fundamental está sempre em atender a Deus. Sobretudo quando se trata de orações vocais demasiado longas, é quase impossível atender ao sentido de todas as palavras que se pronunciam, mas não é impossível recitá-las mantendo-se na presença de Deus. Segundo as disposições do momento, poderá alimentar-se o desejo de O louvar ou de se unir a Ele, de suplicar de um modo geral o Seu auxílio ou de Lhe pedir uma graça particular. Poderá ainda bastar um pensamento genérico sobre o significado das fórmulas que se recitam, ou ainda um simples olhar para Deus a quem dirigimos a nossa oração. Em resumo, trata-se não só de recitar, mas de estar com Deus. Por isso a Santa insiste: “É bom que estejais olhando com quem falais e quem sois, ao menos para falar com cortesia” (ib.); e isto, conclui, é já fazer oração mental. Não se trata de uma oração mental intensa como aquela que se faz no tempo que lhe é exclusivamente reservado, sem preocupação alguma de recitação vocal; todavia, é já oração mental porque o espírito e o coração estão orientados para Deus e, mesmo durante a recitação, procuram o contato íntimo com Ele.
Praticante assim, a oração vocal tem um grande valor; primeiro, porque é feita do modo mais conveniente e respeitoso para com a majestade de Deus, e depois porque habitua gradualmente a alma à oração mental, ao trato íntimo com Ele.
Colóquio – “Nunca permitais, Senhor, que se tenha por bom que quem for falar conVosco o faça só com a boca. Como se pode suportar isso?
“Não há razão para que, por serdes Vós tão bom, seja eu descomedida, falando conVosco com menos consideração e respeito do que se falasse com um homem qualquer. Ao menos para Vos agradecer a bondade que usais como, suportando na Vossa presença um ser tão repugnante como eu, é bom que procure conhecer quem é Vossa Majestade.
“Ó Imperador meu, sumo Poder, suma Bondade, a mesma Sabedoria, sem princípio e sem fim! Vós, cujas obras não têm termo: São infinitas sem se poderem compreender, um pélago sem fundo de maravilhas, uma formosura que contém em si todas as formosuras, Vós sois a mesma Fortaleza! Oh! valha-me Deus! Quem tivera aqui juntas toda a eloquência e sabedoria dos mortais para saber bem, com aqui se pode saber, – que tudo é não saber nada – para dar a entender alguma das muitas cosias que podemos considerar para conhecer algo do que sois, meu Senhor e meu Bem?
“Sim, devemos aproximar-nos de Vós pensando e entendendo (ao chegar junto de Vós) com quem vamos falar ou com quem estamos falando. Em mil vidas como as nossas não acabaríamos de entender como Vos mereceis ser tratado, meu Deis, diante de quem tremem os Anjos… Se temos de falar a um príncipe não o devemos fazer com descortesia… Mas, meu Esposo, há de fazer-se menos caso de Vós que dos filhos dos homens? Não sei compreender como a oração seja bem feita quando apartamos o pensamento de Vós, não entendendo com quem falamos. Porventura não é obrigação, quando se reza, rezar com advertência?” (T.J. Cam. 11, 1-8; 24, 6).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.