A Paixão do Senhor: A tristeza de Jesus Cristo

El Greco, a agonia no jardim, cerca de 1590, domínio público, Wikimedia Commons

O Senhor teve muitos motivos para ficar triste, e como não quis que fossem atenuados, sofreu uma angústia de morte no coração.

Aquele dia fora exaustivo para Jesus. Havia caminhado de Betânia a Jerusalém, celebrado a ceia pascal, lavado os pés dos apóstolos e instituído o Sacramento da Eucaristia. Tinha conversa do durante muito tempo, procurando animá-los e confortá-lo. Disse que eles eram os seus amigos, os escolhidos, os companheiros de suas penas; quedeveriam estar mais unidos a Ele que o sarmento à videira; que a dor seria breve e a alegria grande; que enviaria o Espírito Santo, para defendê-los e ensiná-los. Falou também que Ele partiria na frente recebendo no seu corpo as feridas, e eles alcançariam a vitória depois. Disse por último que os deixaria, porque estava voltando para o Pai; que deveriam ficar alegres, porque em breve retornaria.

Sofreu muito por Judas, demonstrou isto várias vezes naquela noite, até o ponto de não poder disfarçar mais a tristeza. Lutando contra a dureza do seu coração, usou leves insinuações, palavras claras e diretas, e mesmo com provas de particular amizade e carinho não conseguiu convencê-lo. Teve tanta dor e desgosto ao ver um amigo se converter em traidor.

Na despedida de sua Mãe, a dor de Maria despedaçou-lhe o coração.

Em todas as ocasiões tinha procurado dominar-se, mostrar confiança e esconder o que se passava no seu íntimo, para confortar os seus e cumprir com o dever daquela última ceia. Mas a tristeza contida trouxe ainda mais dor quando o Senhor se viu só no horto, longe dos oito discípulos que haviam ficado à entrada; começou a chorar, mostrando toda a sua amargura, desejava aliviar o coração, consolar-se com o amor e a lealdade dos três discípulos mais queridos. E foi a eles que disse: Minha alma está triste até a morte ( Mt 26, 38).

Sentia grande aflição ao ver a perversidade dos seus inimigos. Do ódio nascia o desejo de o matarem, de inventar injúrias, de o torturarem, de zombarem de sua amargura. Era como se o inimigo triunfasse e Deus o tivesse a bandonado. A sensação de ser oprimido pelos inimigos, fazia que clamasse ao Pai em seu auxílio: Olhai, Senhor, minha miséria, porque o inimigo se ensoberbece (Lm 1, 9).

Quando escutarmos o bramido de um touro ou o rugido de um leão, mesmo protegido, ficamos apavorados em imaginar o que poderia acontecer se as feras estivessem soltas; do mesmo modo, podemos pensar na angústia que sentia Jesus, rodeado de tantas pessoas furiosas e com o poder de fazer com ele o que quisessem. O povo escolhido voltou-se ferozmente contra Cristo, assim o profeta indicava: Meu povo foi para mim qual leão na floresta, a rugir contra mim (Jr 12, 8).

Em outra profecia, encontramos o ódio dos príncipes dos sacerdotes e do povo: Cercam-me touros numerosos rodeiam-me touros de Basã; contra mim eles abrem suas fauces, como leão que ruge e arrebata (SI 2 1 , 13-14).

O Senhor já conhecia os planos de seus algozes. Muito tempo antes o profeta antecipava toda dor e sofrimento: Instruído pelo Senhor eu o desvendei. Vós me fizestes conhecer seus intentos. E eu, qual manso cordeiro conduzido à matança, ignorava as maquinações tramadas contra mim (Jr 11 , 18-19).

Sabia também que nenhum amigo o defenderia quando estivesse rodeado pelos inimigos e que sofreria todo tipo de calúnia.

Olho para direita e vejo: não há ninguém que cuide de mim. Não existe para mim refúgio, ninguém que se interesse pela minha vida (SI 141, 5). O desamparo dos amigos o angustiava: Derramo-me como água, todos os meus ossos se desconjuntam; meu coração tornou-se como cera, e derrete-se nas minhas entranhas (SI 21, 15).

Com a proximidade da morte, estava em sua mente toda a dor e tormento que sofreria na cruz. Pensava na injustiça, nos insultos, nas calúnias, nos escárnios e nas agressões que sofreria. O simples fato de imaginar assustava mais que a própria morte. Os condenados tem os olhos vendados para atenuar este sentimento, mas o Senhor não teve nenhum alívio. Salvai-me, ó Deus, porque as águas me vão submergir (SI 68, 2).

Imaginava também Pilatos, por medo e respeito humano, enviado-o a Herodes, que o trataria como um louco na frente dos cortesões; depois sendo devolvido a Pilatos, que mandaria açoitá-lo; os soldados colocando em sua cabeça uma coroa de espinhos para zombar de sua realeza; a sentença de morte na cruz. A dor e humilhação em seu coração eram maiores quando imaginava sua Mãe, presenciando tudo junto às mulheres que o seguiam.

Era impossível afastar de seu pensamento aquele lugar terrível: o Calvário. Anteviu a crucificação: completamente despido, rebaixado como um marginal no meio de dois ladrões, suspenso por mais de três horas, insultado pelos Inimigos e desamparado pelos amigos.

O Senhor não foi poupado de nenhum destes sentimentos. Foi tanta dor que começou a ter pavor e angustiar-se (Mc 14, 3).

Para descansar um pouco, pediu aos três amigos: Minha alma está triste até a morte. Ficai aqui e vigiai comigo (Mt 26, 38).

A Paixão do Senhor, Luis de La Palma, 1624.

Última atualização do artigo em 10 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico

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