A Paixão do Senhor: Ecce Homo!

Antonio Ciseri, Ecce Homo eis o homem!, 1871, representação de Pôncio Pilatos apresentando ao povo Cristo flagelado. João 19, 5 [detalhe], domínio público, Wikimedia Commons

Pilatos saiu da residência em direção ao pátio, onde estavam os soldados e o povo. Todos estavam entusiasmados com o espetáculo, mas os sacerdotes começavam a ficar preocupados pela demora. Pensando que os ânimos estivessem mais calmos, Pilatos entrou e imediatamente foram cessadas as brincadeiras, cada soldado foi para seu posto, ficando somente o governador e Jesus, diante do povo. Ao vê-lo tão maltratado, sentiu pena e pensou que as pessoas também sentiriam compaixão. Os dois entraram no pretório e subiram ao pórtico, que ficava no alto da praça, onde todos poderiam ver melhor.

O Senhor foi a presentado ao público: todo machucado, sangrando, pálido, com o manto sujo e a coroa de espinhos; quase não podia ficar em pé, de tão debilitado.

Bastava olhá-lo ao lado de Pilatos para que o coração mais duro se comovesse de piedade. Todos ficaram em silêncio diante da cena. Pilatos em alta voz disse: Eu o trago aqui fora para que saibam que não encontrei nele nenhum crime, como me pressionaram, concedi que o castigassem, mas agora vocês devem conceder-lhe a liberdade.

Voltou a olhá-lo e indicou com a mão: Eis o homem! (Jo 19, 5). Queria que tivessem piedade, pois não tinha mais condição daquele homem querer ser rei.

Covarde! Pela terceira vez indica que não há culpa alguma, apesar disso o entrega a flagelação e pensa que assim o povo vai ter piedade.

Quem pudesse presenciar o Senhor, que pela própria vontade estava com as mãos amarradas por amor aos homens, sentiria os anjos do céu ajoelhados adorando o Homem-Deus. E o amor deles era gelo perto do fogo ardente da caridade de Jesus.

Como foi possível que aquele povo fosse tão cego e de coração tão duro? Por que colocaram nas mãos de um pagão a solução? Por que não aceitaram a sentença? Já que não escutavam a voz de Deus, poderiam pelo menos escutar a voz do procurador romano.

Pilatos tentava que se compadecessem de Jesus: Eis o homem! Vejam nem parece mais o mesmo que me entregaram; ele não tem poder algum; está todo despedaçado; não precisam temê-lo como rei; como está nunca mais voltará a falar do reino; não é justo, o que mais querem?

Nem a autoridade de Pilatos e a presença de Jesus todo ensanguentado valeram a lguma coisa. Os pontífices continuavam a envenenar o povo com inveja e ódio. Ao escutarem o que Pilatos pretendia , esqueceram-se de seus ofícios e sem compostura alguma começaram a gritar: Crucifica-o! Crucifica-o!

O governador ficou estupefato, não teria arriscado sua autoridade, se não tivesse certeza que suas palavras e o estado deplorável de Jesus não conseguiriam seu intento. Percebendo que não teria êxito perante a obstinação e a dureza dos sacerdotes, exaltado perdeu a prudência e gritou: Tomai-o vós e crucificai-o, pois eu não acho nele culpa alguma (Jo 19, 6). Pensam que irei me convencer aos gritos? Que serei instrumento do ódio de vocês? Eu sou juiz e não quero ser autor de uma injustiça, não costumo castigar inocentes. Flagelei pensando que isso traria um pouco de humanidade; não vou crucificar ninguém sem motivo, crucifiquem vocês mesmos, não serei culpado de nenhuma injustiça.

Os sacerdotes entenderam a mensagem. Magoados com os dizeres do governador, atacaram com uma nova acusação, tentando confundi-lo: Nós temos uma lei, e segundo essa lei ele deve morrer, porque se declarou filho de Deus (Jo 19, 7). Você, Pilatos, afirmou várias vezes que este homem é inocente e manda que nós o crucifiquemos, como se fossemos pessoas sem lei e sem Deus. Para vocês que acreditam em vários deuses, talvez não seja nenhum absurdo que esses deuses tenham filhos e façam deles homens. Mas conforme a nossa santa lei, existe somente um único e verdadeiro Deus; e este homem merece a morte pela blasfêmia de se proclamar filho de Deus.

Os judeus estavam cegos, gabavam-se de ter recebido a lei de Deus e de que eram fiéis observantes. Não entravam no pretório para não se contaminarem; o Senhor já os havia repreendido uma vez: Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas! Pagais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e desprezais os preceitos mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia, a fidelidade (Mt 23, 23).

O governador teve misericórdia, mas os sacerdotes não tiveram. A justiça estava tão longe que mudaram a acusação e cometeram toda espécie de atropelos para conseguirem o que queriam. Primeiro acusaram de que se fazia rei em oposição a César e impedia que se pagassem os impostos; depois que era filho de Deus, acusação que Pilatos não entendia, mas o preocupava mais; para confundir mais o caso, citaram uma lei que o governador não conhecia e nem tinha obrigação de conhecer.

Quem blasfemar o nome do Senhor será punido de morte: toda a assembléia o apedrejará (Lv 24, 16). Esta deve ser a passagem que alegavam para punir Jesus. Consideravam uma blasfêmia que Jesus dissesse que era Deus ou Filho de Deus. Numa ocasião, os judeus pegaram pela segunda vez em pedras para o apedrejar. Disse-lhes Jesus: Tenho-vos mostrado muitas obras boas da parte de meu Pai. Por qual dessas obras me apedrejais? Os judeus responderam-lhe: Não é por causa de alguma boa obra que te queremos apedrejar, mas por uma blasfêmia, porque, sendo homem, te fazes Deus (Jo 10, 3 1-33). Se a lei diz que devem apedrejar um blasfemo, por que querem crucificar? Portanto não cumprem a lei, entregaram um blasfemador na mão de um gentio e pedem que o crucifiquem; se não é permitido dar a pena, como é possível que seja lícito pedi-la? Se o crime que o acusam não merece a morte como pedem algo que não está na lei? Como podem pedir que o crucifiquem pela lei romana, se nela não existe nenhuma cláusula que se condene por blasfêmia? Tudo isso demonstra a cegueira, o ódio, a inveja, a injustiça e a soberba dos judeus.

Caifás, sem conhecer plenamente a verdade, disse que era melhor que um homem morresse do que toda a nação. Igualmente disse uma grande verdade: os judeus receberam a Lei de Deus.

Estava escrito na lei que Jesus era Filho de Deus; que era necessário que morresse e como iria morrer. Inclusive o Senhor tomou da lei uma comparação para mostrar o gênero de sua morte: como Moisés levantou a serpente no deserto, para os que olhassem para ela ficassem curados, assim convinha que o Filho de Deus fosse levantado na cruz e todos que olhassem com fé e amor fossem salvos, pois estavam mortos pela mordida do pecado.

Quando Pilatos disse: Olhai, eis aqui o homem. Não foi em vão. Muitos judeus que estavam presentes, depois de olharem com tanto amor, percebendo os próprios pecados, foram curados e agora estão açoitados, coroados de espinhos e crucificados junto do Coração de Jesus.

Necessitamos todos olhar para este Homem, a quem tantos reis, profetas e patriarcas desejaram ver e não viram. Devemos escutar suas palavras, pois é Mestre. Precisamos imitar sua vida e seguir seus passos, porque não há outro caminho. Olhai para este Homem, para podermos chorar nossos pecados e pedir perdão; para não morrer e ser perdoados, pois quem não olhar, não escapará da morte eterna.

Última atualização do artigo em 11 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico

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