Um subalterno de Pilatos notificou o Senhor da sentença e ele aceitou com humildade e amor, por obediência ao Pai.
Fazer a vossa vontade, meu Deus, é o que me agrada, porque vossa lei está no íntimo de meu coração (SI 39, 9). Holocaustos e sacrifícios pelo pecado não te agradam. Então eu disse: eis que venho porque é de mim que está escrito no rolo do livro, venho, ó Deus, para fazer a tua vontade (Hb 1O, 6-7).
Naquele momento o coração de Jesus estava cheio destes sentimentos e obedecia decidido por amor a Deus e aos homens: Para isso nasci, Pai, para isso vim ao mundo, não para buscar o meu triunfo, mas a sua glória; não para o meu proveito, mas para a salvação das almas. Os homens são os réus e merecem a morte, mas eu quero livrá-los da sua justiça; Pai, recebe a sentença contra mim como se fosse contra eles. Eu sou condenado no lugar dos homens, como sou inocente e justo, que eles fiquem absolvidos e livres pela minha entrega.
Pilatos retornou à residência, deixando a cargo dos subordinados a execução da sentença. Os sacerdotes divulgaram a notícia de que finalmente o procurador tinha se convencido sobre as mentiras e blasfémias daquele homem e mandava crucificá-lo. Aglomerou-se uma multidão diante da casa de Pilatos, moradores e os que visitavam a cidade pela Páscoa, todos queriam ver um acontecimento tão importante.
Como um leão que se atira ávido sobre a presa os executores tomaram Jesus e retiraram o manto (SI 16, 12). O seu corpo sangrava copiosamente pela violência empregada.
Não retiraram a coroa de espinhos e o sangue continuava escorrendo pelo rosto. Não havia razão para tirar a coroa do Rei eterno. Tiraram o manto, todo empapado de sangue, porque seu corpo místico, a Igreja, iria vesti-lo.
Como Barrabás, ladrão e assassino, tinha sido libertado, outros dois criminosos seriam crucificados com o Senhor. Talvez, os sacerdotes tenham pedido e o procurador concordou. Pensavam que assim ficaria mais solene aquele ato de pretensa justiça; o espetáculo seria mais atraente para o povo; a desonra do Senhor seria maior no meio de dois bandidos e as pessoas pensariam que o motivo da condenação era semelhante à dos marginais. Trouxeram para o pátio os dois ladrões, o Senhor olhou-os com compaixão. Eles, pelo contrário, insultaram porque suas execuções foram antecipadas por causa dele. Assim se cumpria mais uma profecia: deixou-se colocar entre os criminosos (Is 53, 12).
A Virgem Maria sentiu terrível angústia, vendo que levavam seu Filho para o crucificarem. Machucava muito todo aquele povo correndo e gritando, indo ver a desonra de Jesus. Estava um pouco afastada, mas conseguia ver o que acontecia. As mulheres que a acompanhavam começaram a chorar desconsoladas; a nossa Mãe, ao notar como estavam desoladas, também chorou com o coração desfeito pela dor. Permanecia calada, sabia como tudo acabaria. O Espírito Santo a fortalecia para que suportasse tão grande sofrimento. Assim pode subir o monte, onde também pereceria a dor da morte e compartilharia os escárnios e os tormentos do Filho. Aproximou-se de um lugar onde Jesus a pudesse ver; as piedosas mulheres foram juntas.
Fora da cidade havia um pequeno monte, situado entre a parte setentrional e ocidente do monte de Sião. Para chegar neste local era preciso sair pela porta Judiciária e virar à esquerda. Antigamente, junto à porta, costumavam os judeus julgar os criminosos e executá-los, por isso levava esse nome. Ficava perto, para que os corpos ficassem fora da cidade, mas ao alcance da vista de todos.
O local ficou conhecido como Calvário, em hebraico Gólgota. Parece significar lugar dos crânios, talvez porque não sepultassem os corpos, deixando-os consumir pelo tempo até ficarem somente os ossos.
Existe uma lenda sobre a origem da palavra Gólgota. Contam que o corpo de Adão, o primeiro homem, foi enterrado naquele local. Onde havia começado a vida, estava sepultado aquele que foi a causa da morte do gênero humano, e agora seria lavado pelo sangue de Jesus.
Os corpos dos animais, cujo sangue é levado ao santuário para expiação dos pecados, são queimados fora do acampamento (cf. Lv 16, 27). Por esta razão, Jesus, querendo purificar o povo pelo seu próprio sangue, padeceu fora das portas (Hb 13, 12).
Jerusalém estava repleta de visitantes por causa da festa da Páscoa. Tomaram Jesus e o levaram para ser crucificado. A notícia correu rapidamente, todos comentavam e trocavam informações.
O Senhor deixou o pretório acompanhado dos soldados e executores, muita gente seguiu o cortejo. Estava amarrado com uma corda no pescoço e era puxado. A porta estava lotada de gente, todos olhavam curiosos, comentavam o estado lastimável e o aspecto irreconhecível.
A cruz estava um pouco afastada, para que a comitiva que o levaria se preparasse. Como o soldado precisou de uma lança para levar o vinagre a boca do Senhor, é de supor que a cruz estivesse cerca de meio metro enterrada, para não tombar. Como Cristo media a proximadamente quase dois metros de altura; (15) portanto é razoável que a cruz estivesse uns três metros e meio de altura e a parte transversal uns dois metros. Quando viu a cruz, reconheceu como a arma para a vitória, a chave que abriria as portas do céu.
Aproximou-se da cruz, os cruéis carrascos mandaram que a carregasse sobre os ombros, até o local da execução. O procedimento era normal, mas não deixa de ser desumano que o condenado leve o instrumento da própria morte. Um homem em bom estado físico aguentaria pouco tempo todo aquele peso. Então, podemos imaginar toda fadiga e esgotamento do Senhor, que tinha sido brutalmente flagelado.
Era costume que levassem somente a trave tra nsversal sobre os ombros, a isso parece referir-se o Senhor quando disse: Se alguém me quer seguir, renuncie-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me (Mc 8, 34). Foi uma crueldade que o Senhor, esgotado como estava, tivesse que levar a trave da cruz; não se preocuparam com o cansaço, a fadiga e a debilidade pela perda de sangue. Somente queriam atravessar as ruas, para que todos vissem a humilhação de carregar um fardo tão pesado. Tomou o Senhor a cruz, com todas as suas forças, sabia que com ela faria maravilhas. Colocou sobre os ombros todos os nossos pecados, pois só Ele podia carregar.
Levando a cruz, ao lado dos dois ladrões, começou a caminhar pelas ruas da cidade, junto com a escolta de soldados; alguns estavam à frente e outros na retaguarda, no meio seguiam os verdugos, com os cravos, o martelo e as cordas. À frente da comitiva estavam muitas pessoas, entre elas: os sacerdotes, os anciãos, os doutores da lei, os fariseus e os escribas; todos alegres pelo triunfo alcançado. Atrás, seguia-o uma grande multidão de povo e de mulheres, que batiam no peito e o lamentavam ( Lc 23, 27). Eram muitos os tinham alcançado graças. Os soldados gritavam para deixarem o caminho livre, contudo todos queriam ver de perto a Jesus de Nazaré, e corriam através das vielas acompanhando o trajeto.
A Paixão do Senhor, Luis de La Palma, 1624.
(15) Medindo o Santo Sudário chega-se a uma estatura entre 1,78 m e l,83m.