Aquele que é de Deus ouve a sua palavra (Joan. VIII, 47).

Tudo aquilo que requer alguma atenção, que fornece assunto de meditação ou que desperta no espírito ideias sérias, repugna à leviandade da juventude.

Quantas jovens há que recusam assistir aos sermões por lhes parecerem desnecessários e até supérfluos. Que necedade! Porventura conheces já tão profundamente a religião que não precises de ouvir a palavra de Deus?

E ainda que assim fosse, bastar-se-ia esse conhecimento para te salvares? Para operar é preciso primeiro querer; mas entre o querer e o saber há uma grande distância. A vontade necessita de ser movida, e esta moção opera-a sobretudo a palavra vida de Deus.

Não há coisa em que a suficiência própria seja mais perigosa e difícil do que no negócio da salvação.

Julgas que sabes tudo e que nada te resta já que aprender? Como ousas dizer que possuis já a instrução necessária e que a lei do Senhor está em ti? Por desgraça não faltam penas falazes que induzam a semelhantes mentiras. Confundidos foram os sábios, porque desprezaram a palavra do Senhor, e nem vestígios de sabedoria há neles (1).

Pela audição da palavra divina estás unida com a Igreja docente e dirigente, assim como pela participação nos atos do culto o estás coma Igreja que ora e que merece. Não quebres com a tua soberba e negligência este laço tão salutar e necessário.

Quem sabe o que Deus se dignará dizer-te neste ou naquele sermão? Quem sabe se Deus quer que nele tenha exatamente princípio a tua conversão, ou dar com ele o impulso que desejavas à tua vida interior? Desprezarás esta ocasião de receber tais graças?

Poderás talvez replicar que não há nenhum mandamento que obrigue debaixo de pecado a ouvir a palavra divina nos domingos e dias de festa.

Mas não é menos verdade que és obrigada a não ignorar por tua culpa tudo o que diz respeito à religião, e a empregar os meios para conseguires a vida eterna; ora, entre estes tem lugar principal a palavra divina: além disso temos obrigação de evitar o escândalo, não nos separando dos fiéis que a ouvem.

Mas os sermões aborrecem-me! Tristes palavras estas, ó jovem cristã; mais triste seria porém, que realmente assim fosse.

Com elas depões contra ti mesma; não as pronuncies pois, não seja que sem o saberes lavres com elas a sentença da tua condenação. Ouve a palavra do Senhor, que diz: Aquele que é de Deus, ouve a sua palavra (2); logo, quem não ouve a palavra de Deus, quem não a quer ouvir, quem a despreza não é de Deus. E sabes o que significa não ser de Deus? Sabes a quem pertence quem não é de Deus?

Não vês que falando assim te estás condenando a ti mesma?

Assim como as comidas sãs e bem feitas só repugnam a quem tem a saúde abalada, assim a palavra de Deus só enfastia aos que estão doentes espiritualmente.

Por outro lado, deixando de ouvir a palavra divina, negas a Deus a honra que Lhe pertence. As conversas mundanas, as mofas, e as futilidades não te cansam; e não há de a palavra de Deus ter virtude para prender a tua atenção uma vez por semana, apenas por espaço de meia hora?

Ainda que alguma vez te sentisses tentada a atribuir à palavra divina o aborrecimento que te causou este ou aquele sermão pouco oportuno, ainda assim, seria leviandade, indiscrição e injustiça, generalizar algum caso particular.

Vai à Igreja com amis espírito de fé e menos estima de ti, e verás como esses pretextos desaparecem!

Desagrada-te efetivamente a palavra divina? Talvez a razão seja porque não quer ouvir a voz da graça, nem ver perturbada a tua vida de tíbia e pecadora.

Muda pois, de vida, e toma por costume incluir nas tuas devoções do domingo ouvir algum sermão ou a explicação da doutrina.

Quando fores assistir a ele, procura fazê-lo com docilidade de espírito. Já que o Senhor se digna manifestar-nos a sua vontade, devemos-Lhe abrir o coração e os ouvidos. O Senhor aproxima-se (3), vai ao seu encontro.

Recebe a doutrina com espírito de fé, como se a ouvisses ao próprio Deus; aplica-a a ti mesma, e deixa-a penetrar no teu coração; tira as conclusões que ela encerra; e não saias da Igreja sem fazer algum bom propósito conforme com o que ouvistes. Imita a Santíssima Virgem, da qual está escrito: Maria conservava todas estas palavras, meditando-as, no seu coração (4).

Há três coisas que se opõem à palavra de Deus, e que a impedem de frutificar no coração das donzelas: a obstinação, a leviandade e o mundanismo.

A palavra de Deus é: semente que cai entre pedras (5) ou à borda do caminho, e comem-na as avezinhas do céu (6); ou semente que é sufocada pelos espinhos dos cuidados temporais (7).

Vence todos estes obstáculos, não deixes que se aproximem de ti estes inimigos, e a palavra de Deus produzirá no teu coração trinta, sessenta e até cento por um (8).

Sabe, querida jovem, que a palavra divina nunca é estéril: se não produz frutos de salvação é princípio de condenação.

A palavra divina nas mãos de Deus é uma espada de dois gumes, que sempre fere e que não torna a entrar na bainha sem ter produzido algum efeito (9); se não fere para nossa salvação, fere para nossa ruína.

Ó espada do Senhor! Até quando deixarás de descansar? Entra na bainha e não firas mais (10). Mas não! não descanses, não voltes à bainha; fere-me, não me perdoes; penetra cada vez mais fundo no meu duro coração e trespassa-o de lado a lado! Falai, Senhor, ao meu coração; não seja, que se Vos calardes eu desça à sepultura (11).

A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.

(1) Jer. VIII, 9.
(2) Joan. VII, 47.
(3) Fil. IV, 5.
(4) Luc. II, 19.
(5) Luc. VIII, 9.
(6) Luc. VIII, 5.
(7) Luc. VIII, 14.
(8) Luc. VIII, 8.
(9) Hebr. IV, 12; Is. LV, 11.
(10) Jer. XLVII, 6.
(11) Sal; XXVII, 1.

Última atualização do artigo em 9 de março de 2025 por Arsenal Católico

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