A piedade para tudo é útil (I Tim. IV, 8).
Há muitos que não sabem o que é a verdadeira piedade; por isso, enquanto ela é para uns objeto de irrisão, para outros é-o de ódio.
Mas a verdadeira piedade é sempre nobre, bela e digna de estima.
Ser piedoso ou querer parecê-lo são coisas muito diferentes.
Fazer ostentação de piedade, é hipocrisia e maldade; é enganar mais ou menos intencionalmente os outros, é enganar-se a si mesmo.
A verdadeira piedade funda-se no conhecimento das relações que há entre o homem e Deus; põe-nos na presença do Senhor, nosso Criador e Benfeitor, e ensina-nos a adorá-lO, louvá-lo, suplicar-lhe e dar-Lhe graças. E não é este o compêndio da vida do homem sobre a terra, e o cumprimento dos deveres supremos da nossa vida?
A verdadeira piedade tem a sua sede no coração: Louva, minha alma o Senhor, e tudo o que há dentro de mim bendiga o seu santo nome (1); e todos os meus ossos, o meu corpo e os meus sentidos exteriores, dirão exultando de alegria: Senhor, quem semelhante a vós? (2)
Devemos pois honrar a Deus interior e exteriormente, mas sobretudo submetendo-nos à Sua santíssima vontade e vivendo segundo o seu beneplácito.
O homem verdadeiramente devoto é também virtuoso, ou pelo menos está no caminho de o ser. Doutro modo, a sua piedade teria um valor muito escasso.
E que é o que busca a verdadeira piedade?
longe de se buscar a si mesma, procura só a Deus.
Por isso, não depende do sentimento ou da imaginação, nem procura as consolações sensíveis; ainda que as desejasse, conformar-se-ia com a vontade de Deus. Além disso a verdadeira piedade sabe deixar a Deus por amor do mesmo Deus, pois é sua condição essencial sacrificar-se de boa vontade ao beneplácito divino.
Não toma sobre si nenhuma prática de devoção com prejuízo dos deveres do próprio estado, nem dos que lhe prescreve a caridade.
Mas sabe encontrar o tempo necessário para poder tratar com Deus na oração e meditação.
Converte todas as suas ações em obras do serviço de Deus, porque tudo faz em Deus e por Deus. A verdadeira piedade, não ignorando que Deus olha principalmente ao interior e, foge de tudo o que seja ostentação; contudo, não se envergonha de mostrar exteriormente, pela sua compostura respeitosa, que tributa a Deus o culto devido.
A verdadeira piedade não se atém ao próprio parecer; deixa-se guiar e ensinar, submete o seu juízo, não é caprichosa, dura, impaciente, taciturna ou melancólica. Como poderá sê-lo, o coração que vive em comunicação quase contínua com Deus, fonte de toda a luz e dispensador de toda a consolação?
Sim: a verdadeira piedade enobrece o homem; faz que a sua vida seja meritória na presença de Deus, e digna de amor aos olhos dos homens.
A verdadeira piedade torna a vida agradável, porque o trato com Deus tem a virtude de consolar o homem na adversidade. Aos que tratam familiarmente com Deus, nada lhes falta (3). O Senhor é bom para os que nEle esperam, e para a alma que o busca (4).
Em verdade diz o Apóstolo: A verdadeira piedade para tudo é útil, pois goza das promessas da vida presente, e das da futura (5).
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) Salm. CII, 1.
(2) Salm. XXXIV, 10.
(3) Salm. XXXIII, 10-11.
(4) Tren. III, 25.
(5) Tim. IV, 8.