Deus meu, Bem sumo e infinito, fazei que nada estime mais do que Vós e nada prefira a Vós.

1 – “Sabes o que é amar-me verdadeiramente? – dizia o Senhor a S.ta Teresa de Jesus. É entender que é mentira tudo o que não me agrada” (Vi. 40, 1). Em bora sem ruído de palavras, o Espírito Santo ensina esta lição a toda a alma que se deixa formar e purificar por Ele; quanto mais a ilumina acerca da verdade da sua miséria e da miséria de todas as criaturas, tanto mais a alma fica desiludida e deixa de pôr nelas a sua esperança, chegando verdadeiramente a estimar Deus acima de tudo, preferindo-O a todas as coisas. A atitude desta alma torna-se assim muito semelhante à de S. Paulo que exclamava: “Em verdade tudo isso tenho por perda perante… Jesus Cristo, meu Senhor, pelo qual renunciei a todas as coisas e as considero esterco, para ganhar a Cristo” (Fil. 3, 8).

O amor estimativo que o Espírito Santo infunde na alma através das trevas purificadoras, é tão forte que ela está disposta a fazer qualquer sacrifício, a enfrentar qualquer obstáculo, a suportar qualquer humilhação e sofrimento para conquistar o seu Deus. “Porque o amor de estima que tem a Deus é tão grande, embora às escuras e sem o sentir, que não só folgaria com isso, mas até de morrer muitas vezes para O satisfazer” (N. II, 13, 5). Notemos que a alma não sente nem goza o seu amor; não é um amor acompanhado de doçura e suavidade a realizar mesmo as coisas mais difíceis “para se poder encontrar com aquele que a sua alma ama” (ib.). Notemos também que não se trata de veleidades ou desejos inoperantes que imediatamente caem por terra em face de sacrifícios concretos, mas de uma decisão tão forte da vontade que nada é capaz de a demover. Quando esta alma compreendeu que, para se unir a Deus, é necessário decidir-se a dar um determinado passo, a nada atende já, nem às repugnâncias da natureza, nem às vozes do amor próprio ou do egoísmo, nem ao que os outros possam dizer ou pensar dela, mas atira-se de cabeça com grande audácia.

2 – Outro efeito do grande amor estimativo por Deus é que “o que ela mais padece e sente, nos trabalhos desta noite é a ânsia de pensar se perdeu a Deus e se Ele a deixou” (J.C. N. II, 13, 5). Como não se preocupa com nenhum ganho que não seja o ganho de Deus, assim a alma não se preocupa com nenhuma perda que não seja a perda dEle. Tudo lhe podem tirar: a saúde, a riqueza, as honras, a estima, a confiança, o afeto das criaturas mais queridas e até essas mesmas criaturas, mas nunca suportaria que lhe tirassem Deus ou que a impedissem de O amar. Assim pensavam e agiam os santos. Assim pensava S.ta Teresa Margarida do Coração de Jesus que, no seu imenso desejo de amar a Deus, se declarava disposta a sofrer as próprias penas do inferno para obter a graça; e a quem lhe perguntava como poderia resistir a tão indizíveis tormentos, respondia sem hesitar: “Creio que o amor os tornaria suportáveis e até mesmo doces porque o amor faz vencer tudo” (Sp. pg. 247). Assim pensava S.ta Teresa de Jesus que deixou às suas filhas este belíssimo aviso: “Seja o vosso desejo, ver a Deus; o vosso temor, perdê-lO; a vossa dor, não O gozar; o vosso gozo, tudo o que vos pode conduzir a Ele” (Av. 69). Esta é a característica do verdadeiro amor: criar na alma uma única preocupação, um único temor, um único desejo, uma única alegria cujo centro é só Deus.

Se queres ver até onde chega o teu amor estimativo por Deus, examina a tua conduta, e procura descobrir a verdadeira causa das tuas preocupações, dos teus temores, dos teus desejos, das tuas alegrias, se esta causa não é Deus, mas, pelo contrário, o são as criaturas, os teus interesses, a tua satisfação, tens de concordar humildemente que não chegaste ainda e estimar Deus acima de todas as coisas porque pões “na mesma balança a Deus e aquilo que de Deus está sumamente distante” (J.C. S. I, 5, 4). Perscrutando mais a fundo o teu coração, verás que não raramente colocas num mesmo plano a tua vontade e a de Deus, os teus gostos e o Seu beneplácito, os teus interesses e a Sua glória, a tua comodidade e o Seu serviço; e não somente isto, pois em teoria protestas estimar a Deus sobre todas as coisas e muito frequentemente, na prática, dás a preferência não aos Seus quereres, aos Seus gostos, aos Seus interesses, mas aos teus, e por isso cais em tantas imperfeições.

Persuade-te de que “onde há verdadeiro amor de Deus, não entra o amor de ti mesmo nem das tuas coisas” (J.C. N. 21, 10).

Colóquio – “Confesso-Vos ó amabilíssimo Filho de Deus, a minha culpa. Não sei com que juízo deixei arrastar o meu coração, criado para Vós, pelo afeto das criaturas e o manchei com a conversação profana da terra. Não foi a realidade, mas a aparência do amor artificiosamente pintado que me afastou de Vós e da lei dulcíssima do Vosso verdadeiro e único amor. Agora que com a Vossa luz dissipastes as minhas trevas, recuso toda a beleza do mundo e escolho-Vos a Vós, Filho de Deus e da Virgem Santíssima para Vos amar e firmar conVosco um pacto de eterno amor.

“Sem Vós, Bondade e Beleza infinita, nenhuma criatura pode possuir verdadeiros bens, nem fora de Vós pode a minha alma achar satisfação alguma, porque Vós lhe destes tal capacidade e fome de infinito que forçosamente não pode querer nem procurar outro bem fora de Vós. Quando olho para a terra, ó Filho do Altíssimo, todas as coisas me parecem pequenas e imperfeitas comparadas conVosco. Se me fossem dadas todas as dignidades do mundo, todas as belezas criadas, todas as comodidades da vida; se pusessem à minha disposição tudo o que de grande, nobre, rico e admirável há no universo, e pudesse gozar conjuntamente de todos oestes bens por toda a eternidade, a minha escolha permaneceria inalterável e com afeto ardentíssimo cantaria: busco e buscarei sempre a vossa face, ó Senhor.

“Fechai, Senhor, o meu coração para que nele não penetrem afetos humanos, e fazei que eu não veja, nem sinta, nem saboreie coisa alguma criada, nem criatura alguma se prenda a mim em detrimento do Vosso puro amor. Vós, Bem infinito, bastais para satisfazer todos os meus desejos e para saciar a fome que me tortura; nenhum bem, nem mesmo todos os bens juntos me bastam; antes pelo contrário, depois de os ter saboreado todos, ficarei morto de fome e desfalecerei em extremo abandono, privado de Vós” (Ven. João de J.M., o.c.d.).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

Última atualização do artigo em 8 de março de 2025 por Arsenal Católico

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