Ó Espírito Santo, ajudai-me a estabelecer o meu coração na paz.
1 – A alma que saboreou Deus sob o influxo do dom de sabedoria, olha o mundo com um olhar cheio de Deus e desta forma torna-se capaz de julgar todas as coisas “secundum rationes divinas” (S. Tomás, IIª, IIª, q. 45, a. 3 ad 3), segundo as razões divinas, os motivos sobrenaturais, e não segundo as acanhadas razões humanas. São estes os juízos verdadeiramente “sábios” aos quais jamais poderemos chegar sem o auxílio do Espírito Santo. Com efeito, “o homem animal [o homem dos sentidos e da pura razão] não percebe aquelas coisas que são do Espírito de Deus; para ele são uma estultícia e não as pode entender, porque elas ponderam-se espiritualmente. Mas o espiritual [o homem de fé, guiado pelo Espírito Santo] julga todas as coisas” (I Cor. 2, 14 e 15). Julga tudo em ordem à Causa suprema, Deus, e portanto dirige todos os seus atos e regula toda a sua vida em relação a Deus. Desta ordem – a única verdadeira – nasce a paz, fruto da sábia direção do dom de sabedoria; por isso o homem que vive habitualmente sob o influxo de tal dom, é o homem “pacífico” por excelência. O seu coração está estabelecido na paz: nele não há desordem alguma, pois todos os seus afetos, desejos, pensamentos e ações estão absolutamente ordenados segundo Deus, isto é, plenamente conformes e sujeitos à Sua lei, à Sua vontade, ao Seu beneplácito. Possuindo a paz, torna-se semeador de paz: pacífico, no sentido etimológico, é aquele que estabelece a paz, que cultiva a paz e a difunde à sua volta. Esta é a razão porque ao dom de sabedoria corresponde a bem-aventurança da paz: “Bem-aventurados os pacíficos”. Só quem vive sob o influxo deste dom pode verdadeiramente julgar e ordenar tudo em relação a Deus, e deste modo nada, nem mesmo o sofrimento, poderá perturbar a sua paz interior, pois sabe que até os acontecimentos mais dolorosos são permitidos e ordenados por Deus para o bem dos Seus eleitos: “todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus” (Rom. 8, 28).
Desta maneira o dom de sabedoria imprime uma nota de suavidade, não só à oração, mas também à vida prática: “sob o influxo deste dom a amargura transforma-se em doçura; a fadiga em descanso” (IIª IIª, q. 45, a. 3, ad 3).
2 – O dom de sabedoria conduz-nos à paz: paz interior da alma que, tendo saboreado a Deus, se entrega a Ele sem reserva, totalmente rendida à Sua divina vontade; paz serena daquele que, vendo Deus em tudo, aceita, sem se perturbar, as adversidades da vida, adorando nelas as divinas disposições; e também paz social de quem, considerando os homens em relação a Deus, como criaturas e filhos Seus, ama a todos e quer viver em paz com todos. Quanto mais perfeita for esta paz, mais nos levará a saborear o prêmio prometido por Jesus: “Bem-aventurados os pacíficos porque serão chamados filhos de Deus” (Mt. 5, 9).
Todos os cristãos são filhos de Deus pela graça, mas aqui trata-se de uma recompensa particular, a saber, duma superabundância da graça de adoção; há aqui algo de experimental pelo que a alma não somente sabe, mas sente e saboreia que é filha de Deus. É o sentimento saboroso da filiação divina, que nasce na alma sob o influxo do dom de sabedoria. “O mesmo Espírito dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus” (Rom. 8, 16); esta afirmação de S. Paulo torna-se uma realidade viva e uma experiência saborosa; a alma sente-se chamada filha de Deus, não pelos homens, mas pelo próprio Deus; não lhe fala nenhuma voz sensível, mas quanto mais atraída se sente por Deus e em mais íntima união O saboreia, tanto mais sente que Ele é o seu Pai e ela, pequena criatura, Sua filha.
O nosso Deus é o Deus da paz; por isso é muito justo que o pacífico, aquele que possui e difunde a paz, se sinta, de um modo especialíssimo, Seu filho. Se os homens se sentem geralmente tão pouco filhos de Deus, é porque são muito pouco pacíficos: mais propensos às discórdias, às lutas, às guerras do que à paz. Fala-se de paz, mas não se faz a paz, porque o homem não se deixa guiar pelo Espírito de sabedoria e quer guiar-se, ao contrário, a si mesmo pela sua ignorância; assim, é dominado pelo orgulho, pelo interesse, pela cobiça. Vive na desordem e semeia a desordem.
Quanto mais a nossa alma se estabelecer na paz e nós formos mensageiros de paz, tanto mais o Espírito Santo infundirá nas nossas almas este sentimento saboroso da nossa filiação divina, que será para nós uma imensa bem-aventurança, verdadeiro prelúdio da bem-aventurança eterna.
Colóquio – “Dai-me, ó Espírito, a Vossa sabedoria para que nos ensine a conduzir e reconduzir todas as coisas para Vós donde procederam. Oh! se voltássemos deveras para Vós, como de Vós saímos, tal como os rios voltam para o mar onde tiveram a origem; oh! se efetuássemos este completo retorno para Vós, estaríamos em perpétua felicidade e perpétua paz!
“A Vossa sabedoria é a perfeição que ordena todas as coisas em relação a Vós, que sois o seu fim; considera o passado, olha o presente e vê o futuro sempre em relação a Vós. Daqui nasce a paz no nosso coração, doce fruto da sabedoria. Quem possui esta paz fica sempre calmo: calmo nas recordações do passado, nas coisas presentes e pacífico na previsão das futuras, porque sabe que tudo é permitido e disposto pela Vossa Bondade soberana.
“Ó Pai eterno, dai-nos luz para conhecer esta paz, causa de tantos bens e sem a qual se cai em tantos defeitos e em tantos males!
“Oh! porque não posso eu comunicar esta santa paz a todas as criaturas? Oh! se fosse o que devia ser, poderia muito bem difundi-la por toda a parte. Dai-me, Senhor, a Vossa paz: paz do coração que vive unido a Vós, porque de mim nenhum bem posso ter e sem Vós não posso ter paz” (cfr. S.ta M. Madalena de Pazzi).
“Ó benigníssimo Jesus, concedei-me que descanse em Vós, mais do que em tudo quanto posso desejar e que em Vós encontre a paz do meu coração. Vós sois a verdadeira paz do coração; vós o seu único descanso: fora de Vós, tudo é inquietação e desassossego. Nesta paz, isto é, em Vós, único, sumo e eterno Bem, adormecerei e descansarei” (Imit. III, 15, 4).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.
Última atualização do artigo em 25 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico