Catecismo do Matrimônio – Capítulo 8: A fecundidade no casamento e a esterilidade voluntária

Família, foto por Joshua Reddekopp, Unsplash

A FECUNDIDADE NO CASAMENTO E A ESTERILIDADE VOLUNTÁRIA

I. A FECUNDIDADE, O PRECEITO E A BÊNÇÃO

P. – Não é a fecundidade objeto d’um preceito de Deus?

R. – Sim. Deus disse aos nossos primeiros pais: “Crescei e multiplicai-vos.” Sois homens, escreve Mgr. Besson, e, como tal, deveis dar conta ao gênero humano do depósito que vos foi confiado e do uso que dele fizestes. Não tendes apenas que guardar um sangue puro; tendes também que espalhar um sangue fecundo… (1)

P. – Este preceito de Deus não é baseado numa razão natural?

R. – Sim; a razão natural é a vontade de Deus, autor da natureza. Por vontade de Deus, autor da natureza, o ato conjugal foi dotado de fecundidade; se se torna estéril pelo homem livre, por esse mesmo fato se transforma num ato antinatural.

P. – Esse preceito visa todos os homens sem exceção?

R. – Não, porque segundo S. Tomás, dirige-se à coletividade e não ao indivíduo. Nenhum motivo, portanto, se oporá a que um jovem ou uma donzela se mantenha no celibato ou na virgindade para se consagra às coisas divinas; nada se oporá a que um homem casado limite a sua família, pela continência, por legítimos motivos, de ordem espiritual ou temporal. Este preceito não se dirige, pois, a todos sem exceção, mas não deixa de ser para a multidão, para a grande maioria, a expressão da vontade divina.

P. – Não é também a fecundidade uma bênção de Deus?

R. – Sim, é uma bênção, e Deus prometeu-a àqueles a quem ama; prometeu-a a Abraão em recompensa da sua fé. “Olha para o céu e conta as estrelas, se podes… Assim será a tua posteridade.” (Gên. XV, 5). Prometeu-a àquele que teme ao Senhor: “Sua mulher será no retiro da sua casa como vinha abundante; seus filhos como pimpolhos de oliveiras, estarão ao redor da sua mesa. Ele verá os filhos de seus filhos. Eis aqui como será abençoado o homem que teme ao Senhor” (Salmo CXXVII, 3-4).

P. – Se a fecundidade é, ao mesmo tempo, preceito e bênção de Deus, qual deve ser a oração do cristão que prefere o estado de casado?

R. – Deve dizer a Deus, como o jovem Tobias: “Bem sabeis, Senhor, que, se tomo mulher, não é para satisfazer a minha paixão, mas por amor dos filhos que devem abençoar o vosso nome pelos séculos dos séculos.” (Tobias, VIII, 9).

P. – A Igreja faz votos, no dia das núpcias, por esta fecundidade?

R. – Sim; na missa do casamento diz à jovem esposa “Que seja fecunda em filhos: Sit facunda in sebole!”. Corresponde, a este voto da santa Igreja as populações verdadeiramente católicas – Bretanha, no Canadá, na Alsácia, na Polônia, etc.

II. – OS ADVERSÁRIOS DA FECUNDIDADE

P. – Não há uma doutrina totalmente oposta ao preceito de Deus – “Crescei e multiplicai-vos”?

R. – Sim. Um economista inglês dos fins do século XVIII, Malthus, insurgiu-se contra o aumento da população. Pretendia ele que, com o decorrer do tempo, o acréscimo da gente traria a falta do sustento para os seus habitantes. E preconizava a continência para evitar esse perigo.

P. – E não parece que os fatos justificam essa teoria?

R. – Dão-lhe, pelo contrário, o mais categórico desmentido. A crise de recear não provinha, antes da guerra, do excesso da população, mas do excesso da produção. Os mercados regorgitavam de produtos, e havia falta de consumidores para as subsistências. Ainda hoje, as terras necessitam de quem as cultive, havendo que chamar colonos para esse trabalho. Há regiões imensas em que a população é rara. Os progressos da química agrícola e dos fabricos industriais parecem dever assegurar o sustento d’uma população aumentada quase indefinidamente. A pequena Bélgica, não obstante a sua superpopulação, gozava d’um grande bem estar antes da guerra.

P. – Malthus tem sequazes da sua doutrina no nosso tempo?

R. – Sim, os neomalthusianistas. Deturpando com perfídia a obra de Malthus, que era um honrado economista, inimigo de qualquer prática antinatural, espalham atualmente em toda a França a doutrina vergonhosa da limitação dos nascimentos. Vão repetindo ao povo que a limitação voluntária de filhos é um penhor de felicidade e bem-estar para o lar doméstico. – E recorrem às folhas soltas e ás conferências acompanhadas de projeções para infundir nos costumes as suas criminosas teorias. Ensinam assim cinicamente os meios de limitar a fecundidade das mães – meios científicos, dizem eles, mas, na verdade, meios bárbaros e homicidas. (2)

P. – Que é que resulta desta propaganda anti-humana?

R. – A crescente diminuição da população, na França. Os ricos amantes do prazer acolheram com entusiasmo esta teoria, que tão bem favorece o seu egoísmo e a sua estúpida vaidade. Um só herdeiro (o máximo, dois) para transmitir o seu nome, e a sua fortuna indivisa, – eis o que admiravelmente corresponde às suas baixas aspirações, o que basta ao seu coração empedernido e atrofiado, e que lhe permite, sem fadiga, nem trabalho, ter mesa excelente, ostentar luxo, gozar neste mundo sem preocupações nem cuidados uma vida fácil e agradável!

P. – Têm ao menos as mães, protestado contra estas práticas que lhes roubam a melhor glória, a glória d’uma família numerosa?

R. – Ah, as mulheres mundanas também cederam facilmente á tentação. Vítimas da garridice e do amor ao prazer, tornaram-se cúmplices dóceis dos maridos, ou tomaram mesmo, muitas vezes, iniciativas, condenáveis, felizes por se verem libertas dos aborrecimentos de repetidas gestações e dos cuidados incômodos dessas maternidades periódicas que deformam o corpo, destroem momentaneamente a frescura da mocidade, obrigam a evitar bailes e festas, e põem, por vezes, a vida em risco…

P. – Este mal atingiu também a classe trabalhadora?

R. – Sim. Por meio das conferências de que falamos, e das brochuras que espalham profusamente, os neomalthusianos fazem acreditar às populações operárias que as famílias numerosas são um flagelo.

P. – O medo dos filhos não arrasta certos pais ao crime?

R. – Sim, e muitas mais vezes do que se supõe. – Quando, servindo-se de vergonhosos meios preventivos, se não consegue impedir a concepção, não se hesita em recorrer ao aborto, crime tão abominável que a Igreja o fulmina com a excomunhão (3).

O filho ainda não nasceu, mas existe, está vivo, e… matam-no. Não há diferença essencial entre o aborto que mata o filho antes de nascer e o infanticídio, que o mata depois. Se é relativamente raro o infanticídio, o aborto, que facilmente se rodeia de mistério, tornou-se vulgar. Os cálculos de certos médicos elevam a muitas centenas de milhar o número anual dos abortos!

Assim, pela criminosa cobardia de mães desnaturadas e, muitas vezes, pela cumplicidade de pais sem consciência, desaparecem cada ano talvez mais franceses do que aqueles, que, no mesmo período, morreram nos campos de batalha da grande guerra.

P. – Que deve pensar-se da doutrina neomalthusiana?

R. – Que é uma mentira histórica. Todos sabemos, com efeito, que os filhos numerosos são uma riqueza para as famílias pobres e bem organizadas. Constituirão um encargo para as mães, durante alguns anos; mas, uma vez chegados à idade dos doze, já eles começarão a ganhar; quantos os filhos, quantos os salários, e a família, de pobre que era, torna-se remediada e feliz. Eis o fato que o economista imparcial deve verificar; o fato que nos revelam as belas e grandes famílias católicas da França.

P. – Mas, se filhos numerosos podem ser uma fonte de receita pra a família pobre, não serão, pelo contrário, um encargo pesadíssimo para a família burguesa, obrigada a viver uma vida mais dispendiosa e na qual só bastante tarde eles poderão prover às suas necessidades, após longos anos de preparação intelectual, muitas vezes caríssima?

R. – Esta dificuldade, confessamo-lo, é mais séria, mas não insolúvel. Mesmo na burguesia, o chefe da família pode encarar sem temor a perspectiva d’uma prole numerosa, desde que esteja resolvido a levar uma vida simples e modesta.

O burguês amante do gozo que pretende não poder sustentar mais do que um ou dois filhos, encontra facilmente meio de ter uma vida faustosa, automóveis, teatros, vilegiatura em praias afamadas. O pai d’uma prole numerosa privar-se-á desse luxo e desses prazeres ruinosos, encontrando antes, e sem grande despesa, uma distração bem mais salutar nos folguedos da sua juvenil família.

Não hesitará mesmo em impor-se maiores sacrifícios, se tanto for mister, aproximando-se da vida austera dos nossos antepassados, dessa vida que tão bem favorece a prática da penitência preconizada no Evangelho.

Os pais sustentarão os filhos com o produto destas economias e sacrifícios; a mãe dará a suas filhas a educação simples e cuidada que vale verdadeiros tesouros; o pai fará ministrar aos filhos a educação sólida que lhes abre as portas das grandes escolas e lhes confere diplomas e atestados, precisos para o acesso às posições honestas e lucrativas. (V., no fim do cap., a pág. De Henry Joly sobre esta grave questão).

P. – Podem os chefes de famílias numerosas esperar o auxílio da Providência dum modo particular?

R. – Sim. Parece que a Providência dispensa especiais cuidados às famílias numerosas. Quantas vezes o temos verificado!

a) A Providência abençoa a educação dos filhos: acontece muitas vezes que o filho único, sabendo que tem com que vier, pouco ou nada estuda, e desperdiça mais tarde uma fortuna que não sabe administrar. Ao passo que o filho duma família numerosa, sabendo que não terá mais tarde outro patrimônio além dos conhecimentos adquiridos, e obrigado a criar uma posição, é, naturalmente, trabalhador por hábito. Deus recompensa-lhe os esforços, e concede-lhe as palmas e os louros, quase sempre (4).

b) A Providência parece favorecer a sua criação, e, quando soa a hora de eles tomarem estado, depara-lhes muitas vezes um excelente partido, numa família que se considera feliz por unir o destino de seu filho ou filha ao dum jovem ou duma donzela tão excelentemente educados.

c) A própria Providência se encarrega frequentemente da criação dum ou mais filhos: é, com efeito, nos lares de vida abundante que Deus vai procurar, de preferência, os seus ministros e as suas virgens. É sobretudo, às famílias numerosas que Deus concede a grande honra da vocação sacerdotal ou religiosa.

P. – Como receberam as classes operárias as doutrinas neomalthusianas?

R. – Com uma docilidade que nos faz tremer pelo futuro da nação em que elas se propagam. A mulher do povo não tem sido a menos solicita em utilizar-se da sua desastrosa aplicação. Porque é ela que sofre todo o peso dos filhos. Não dispondo já (triste resultado da educação sem Deus) das forças da religião para aceitar resignadamente a sua sorte, não pensando já no céu, onde todo o trabalho, sem excetuar o da amamentação, será recompensado, ela saudou, infelizmente, como salvadores esses apóstolos das doutrinas novas que favoreciam a sua cobardia, sob um pretexto humanitário. E disse ao marido: façamos como eles ensinam; é muito mais cômodo; sustentar tanta gente, não pode ser.

III. – RESULTADOS DA ESTERILIDADE VOLUNTÁRIA

P. – Que resulta de tudo sito?

R. – Quer nas classes pobres, quer nas classes ricas, a natalidade diminuiu, e, muitas vezes, também a sua fortuna.

P. Que relação pode haver entre um e outro fato?

R. – É simples. O herdeiro destas pequenas famílias é o ídolo do lar. Egoísta e gozador, bem depressa gasta o patrimônio. As cortesãs exploram-lhe a bolsa e arruinam-lhe a saúde.

Não quiseram os pais que os seus bens fossem partilhados por vários filhos; pois o seu único herdeiro encarrega-se muitas vezes de a dividir pelos cúmplices dos seus desregramentos. É a história de todos os dias.

P. – Mas estes cálculos criminosos não ameaçam a própria existência da família?

R. – Sim, muitas vezes. Como um ministro do Criador, assim ofendido, a morte espreita essa existência tão querida e, d’uma vez, a ceifa impiedosamente. Quantos fatos poderíamos citar! São de todos os dias estas represálias do céu. “Fazendo-se cálculos egoístas, diz-se: um, dois… E Deus responde, na sua justiça: Zero.” (5) É debalde que se procura então reabrir as fontes da vida. O Senhor da vida permite muitas vezes que elas permaneçam fechadas, em castigo de crime que se praticou. E os pais morrem desolados, no isolamento que prepararam por suas próprias mãos.

P. – E esta despopulação não é um perigo para os povos em que se manifesta?

R. – Evidentemente, pois é um axioma verificado pela história que o império do mundo pertence aos povos prolíficos, aos povos que contam grandes famílias. Veja-se no mapa-mundo o lugar nele ocupado pelas raças de numerosa prole.

P. – Ameaçará a França um perigo muito especial?

R. – Sem a menor dúvida. Em França, a natalidade preenche à justa as clareiras abertas pela devastação da morte. (6) O ligeiro aumento da população provém da perigosa infiltração dos estrangeiros na nossa terra. Do outro lado da fronteira, a Alemanha ganha em cada dia mais 1700 habitantes do que a França. A continuar assim, dentro de quinze anos terá o duplo dos nossos recrutas; daqui a cinquenta anos possuirá 100 milhões de habitantes, ao passo que a França não passará de 40. Quem não vê o formidável perigo que revelam estes algarismos? (7)

P. – Podem considerar-se bons franceses os esposos que não querem filhos?

R. – Não, pois recusam à sua pátria os cidadãos de que ela necessita para as obras de paz, e os soldados que ela lhe pede para a defesa das fronteiras. Se todas as famílias assim procedessem, a França seria dentro em pouco tempo uma província alemã.

Nesta guerra, os homens saldaram largamente a sua dívida para com a nação. – Que as mulheres casadas cumpram, por sua vez, o austero dever, e deem franceses à França. Alguém já disse: A maternidade é o patriotismo da mulher.

IV. – GRAVIDADE DO PECADO QUE LIMITA A VIDA

P. – Mas não se conclui de tudo isto que deve ser muito grave a falta dos esposos que, usando dos direitos matrimoniais, tratam de evitar a procriação?

R. – Sim, e tão grave que a sagrada Escritura, falando do pecado de Onan, réu do crime de esterilidade voluntária, não receia chamar-lhe uma coisa detestável, que atrai os castigos de Deus: Percussit eum Dominus queo rem detestabilem faceret (Gên. XXXVIII, 9-10). Tão grave, que Tertuliano, no 3º século, não hesita em chamar-lhe homicida. “Impedir que alguém nasça, é matar antecipadamente. Porque esse alguém se tornará um homem. Todo o fruto está no seu gérmen.” (Apologética).

Tão grave, que o Catecismo do Concílio de Trento, composto por ordem de Santo Concílio, pelos mais doutos padres da alta assembleia, não hesita em exprimir-se nestes termos formidáveis: “Esses tais praticam um grande crime, impedindo, seja porque meio for, a concepção ou o nascimento dos filhos.” E os sábios escritores acrescentam, com uma energia de que a nossa língua mal pode dar uma ideia: “Isso é uma conspiração ímpia de homicídios. Hae enim homicidarum ímpia conspirativo existimanda est.” (Catecismo do Concílio de Trento, c. XXVII, 3).

P. – Vem noutros Catecismos esta doutrina?

R. – Sim. No seu Catecismo de Meaux, Bossuet, repetindo a expressão da Sagrada Escritura, não receia chamar a semelhante crime – um crime abominável. No fim da lição sobre o casamento, escreve: “Diga-me o mal que é preciso evitar no matrimônio.” E, depois de indicar dois outros males, acrescenta: “O de evitar ter filhos, o que é um crime abominável.”

P. – Donde procede a maldade intrínseca deste crime?

R. – Da violação refletida e voluntária da ordem estabelecida por Deus nas relações conjugais Deus, autor da natureza, permite o prazer dos sentidos que acompanha as relações conjugais com o fim principal de favorecer a propagação da espécie humana. Procurar o prazer suprimindo a função, é privar assim voluntariamente do seu efeito natural o ato do casamento, é uma desordem que acarreta prejuízo à própria raça, e, portanto, uma falta grave. Não há falta no que facilita, prepara ou completa as relações normais.

P. – Pode resumir-se esta doutrina?

R. – Sim, em duas palavras. No casamento, pode pecar-se venialmente por simples excesso, e mortalmente, indo diretamente contra o fim principal do matrimônio, que é a produção de filhos.

P. – Não há casos em que a mulher arrisca a vida aceitando a maternidade?

R. – Muito menos do que se pensa ou diz: algumas vezes, sim. A causa deve atribuir-se antes à nossa civilização mentirosa e requintada. Está na educação de muitas raparigas que, vivendo no meio de todos os confortos e com todas as delicadezas, não são capazes uma vez esposas de suportar no momento dado os trabalhos e as dores.

P. – Que deve pensar-se das mulheres casadas que morrem por se tornarem mães?

R. – Lamentá-las sempre: nelas se verifica a palavra de S. Paulo a respeito das tribulações da carne inerentes ao casamento (I aos Cor., VII, 28). Temos de admirá-las, também, muitas vezes. Bem merecem, com efeito, que as admiremos, essas esposas verdadeiramente cristãs, de alma forte em corpo fraco, que, empenhadas em salvar a alma de seus maridos, secundado os seus legítimos desejos, ouvindo os votos secretos da natureza, caem no campo da batalha da sua maternidade.

P. – Qual seria o meio de diminuir o número destas vítimas?

R. – Refazer uma geração vigorosa. Taine no-lo disse com o seu bom senso, falando da jovem que se quer casar: “O seu primeiro dever é ter saúde.”

P. – Não exageram certos médicos os perigos da maternidade?

R. – Sim. Encontram-se em nossos dias certos médicos indignos da sua profissão, que, para se fazerem valer junto dos seus clientes, satisfazer o seu egoísmo e serenar a sua consciência, lhes recomendam, em nome da Faculdade, a limitação da família, indicando-lhes por vezes os meios inconfessáveis de consegui-lo. Merecem ser condenados, pois têm grande responsabilidade neste flagelo da despopulação. (8)

P. – Que é que pensam os grandes especialistas da medicina e da cirurgia a respeito dos deveres da maternidade?

R. – O professor Dr. Pinard disse no Congresso nacional da Mutualidade maternal (9): “Se todas as mulheres quisessem unir-se para alcançar o fim que temos em vista e se todas elas consentissem em ser mães, não vedes que morreriam de fome os cirurgiões? Isto é matemático, e demonstrá-lo-emos. O que mais ocupa hoje os cirurgiões é a esterilidade voluntária…” E aludiu à formação dos fibromas.

O professor Dr. Desplats, por sua vez, diz: “Os ginecólogos descobriram um dia que a gravidez é o melhor meio de evitar um grande número de afecções femininas e de curá-las…” E acrescenta que muitas mulheres nevropatas “vêm subitamente dissipar-se as suas misérias, sob a influência da gravidez, e as suas ideias tomarem outro curso.” (10)

“Estas conclusões do meu eminente confrade, acrescenta o Dr. Burlureaux, são devidamente apreciadas por todos os médicos. O que é certo, em todo o caso, é que a maternidade, longe de ter os perigos que lhe atribuem a ignorância crédula do público e a falsa ciência interessada dos apóstolos do neomalthusianismo, é para a mulher sã, quase sempre, uma garantia de saúde prolongada, e, muitas vezes para a mulher doente um remédio, de inigualável eficácia.” (11)

V. – REMÉDIOS CONTRA A DESPOPULAÇÃO VOLUNTÁRIA

P. – Quais são os meios de obviar ao mal da despopulação voluntária?

R. – Em primeiro lugar, os meios legais que podem deter o mal; depois, os meios econômicos, apreciáveis, embora insuficientes; e, por fim, os meios morais e religiosos, muito mais eficazes.

P. – Quase são os meios legais?

R. – A repressão, por uma lei severa, da propaganda neomalthusiana e da criminosa indústria dos abortadores de ambos os sexos. Importa que a polícia e a justiça exerçam uma rigorosa vigilância sobre toda essa gente que se entrega a essa e outras práticas homicidas, e que os tribunais, dispondo duma boa lei, se mostrem implacáveis na repressão.

P. – E os meios econômicos?

R. – São as reformas sociais, as medidas fiscais que aliviam das contribuições, progressivamente, as famílias numerosas, concedem prêmios à natalidade e animam os esposos resolvidos a comportar-se dignamente. Ainda que insuficientes, estes meios são bons, e devemos encorajar os homens que trabalham para os pôr em prática.

P. – Quem nos autoriza a considerar insuficientes estes meios materiais ou econômicos? (12)

R. – A história; A despopulação de que sofre hoje a França, já o império romano a conheceu: ameaçado de morte por falta de gente, recorreu aos bons ofícios dos legisladores: “A lei Poppea, promulgada por Augusto, considerava o casamento um encargo público, ou um imposto que era devido ao estado. Ao jovem de vinte e cinco anos que se não houvesse ainda casado, reputavam-no celibatário, e como tal o tratavam: não podia aproveitar de herança testamentaria, nem receber legados ou sucessão, a não ser dos seus parentes mais próximos. Quando, após um número de anos fixado pela lei, o casamento não dava descendência, os esposos só podiam deixar um ao outro a décima parte de seus bens… Pelo contrário, o pai de família recolhia a parte dos seus co-herdeiros solteiros, tinha a precedência nas cerimônias e o melhor lugar nos teatros; cada filho reduzia-lhe d’um ano a idade para magistratura; e, quando tinha um certo número de filhos (três em Roma, quatro na Itália, cinco nas províncias), a lei isentava-o dos cargos públicos, libertava-o das tutelas, etc. O senador de família mais numerosa era o primeiro a emitir parecer no senado. A multidão devia afastar-se e abrir alas à passagem d’uma mulher grávida.” (13)

P. – Obteve o resultado desejado uma lei assim tão favorável ao casamento e aos frutos do casamento?

R. – Não; a despopulação continuou, e levou á ruína o império romano. Essas raças, esterilizadas pelos requintes d’uma civilização egoísta e corrompida, foram expulsas do mundo por outras raças, mais jovens e fecundas.

Assim acontecerá à França estéril, que será batida pelas raças prolíficas de além-Reno se se não opuser ao mal da despopulação com os remédios materiais fornecidos pela economia social e pela legislação, e com os remédios bem mais eficazes da religião e da moral. (14)

P. – Qual a razão da eficácia curativa da religião nesta matéria?

R. – É que só a voz da religião desce até esse santuário da alma, íntimo e profundo, que se chama consciência, para, sucessivamente, esclarecer, ameaçar e animar.

Esclarece aqueles que quereriam permanecer numa ignorância culpável das leis do casamento, e repete a todos o preceito primordial. “Crescei e multiplicai-vos!”

Ameaça os esposos egoístas e amantes do gozo. “Quem evita os filhos é homicida!” e como homicida será castigado por Deus.

Anima os esposos fiéis e valorosos: – “A mulher será salva pelos filhos que der ao mundo, se permanecer na fé, no amor, na santificação, com sobriedade.” (I Tim., II, 15).

VI. – CONCLUSÃO

P. – Que resulta de tudo isto?

R. – Lançando um olhar quer sobre a carta de França, quer sobre a da Europa, verifica-se que quanto mais religioso é um povo, e mais obedece por isso à voz primordial – Crescite et multiplicamini! – mais crescem o seu pode e grandeza com os seus filhos.

P. – Visto esta questão interessar à salvação eterna dos indivíduos, à felicidade das famílias e à prosperidade das nações, que deve fazer-se praticamente para serem prestigiadas as famílias numerosas?

R. – Nos países religiosos, em que o padre ainda pode falar livremente, que ele não perca nenhuma ocasião de instruir os fiéis, e sobretudo as donzelas, acerca dos rigorosos deveres do casamento. Naqueles em que o padre não possa afirmar verdades que seriam ridicularizadas, defendam os leigos, apóstolos decididos da repopulação, a causa da vida contra os que se fazem tristes campeões do nada ou da morte.

De resto, outros meios há, mais eficazes, do que a conferência:

1º Pessoalmente dar o bom exemplo e auxiliar, na medida das suas posses, as famílias numerosas que lutam sob o peso dos seus encargos.

Lutar sem respeitos humanos contra o preconceito que ridiculariza a maternidade. Que as mulheres e donzelas cristãs saibam afirmar nos salões a sua ambição de serem mães de muitos filhos e se abstenham dos gracejos frívolos que as tornariam cúmplices da obra homicida;

2º Favorecer com a nossa influência, o nosso dinheiro e a nossa colaboração pessoal, a fundação e desenvolvimento das ligas destinadas a melhorar a sorte das famílias numerosas;

3º Trabalhar na difusão de brochuras bem escritas sobre este assunto. (14)

EXTRATO

Exposição clara da doutrina – por um sábio, cardeal – … indubitavelmente é legítima a atração do comércio conjugal, e não é defeso aos esposos obedecer-lhe. É como que um salário providencial por se terem aceitado os encargos da paternidade e os deveres muitas vezes angustiosos e penosos da maternidade. Assim como a natureza ligou às funções qu mantêm a vida do indivíduo o prazer sensível de beber e comer, assim também ela pôs na atração do amor a garantia da perpetuidade da espécie.

Mas quer se trate do indivíduo ou da espécie, a satisfação dos sentidos só se justifica pela função que pressupõe e está incumbida de assegurar.

Do mesmo modo que à natureza racional repugnam os regalos grosseiros da gula e da embriaguez, assim também, e mais ainda, ela reprova o deleite voluptuoso procurado fora da ordem que a natureza impõe à transmissão da vida. O animal só tem sensações; obedece-lhes irresistivelmente, e é incapaz de moderá-las ou conter-se…

O homem não é escravo dos seus impulsos: tem o poder, em certa medida, de governa-los, de verificar pelo pensamento o seu destino e submetê-los a um fim honesto: a sua dignidade moral vem-lhe do império que sobre eles exerce…

…Vós que guardais adentro do coração o respeito pela lei de Cristo e pela moralidade, confessai que é do vosso dever e incumbe à vossa honra resistir ao predomínio do instinto; reconhecereis, e proclamareis, sem ostentação, mas também sem fraqueza, que se insurgem contra o Evangelho e contra Deus, e abdicam da sua dignidade de homens, aqueles que, deixando-se subjugar pela paixão ou arrastar pelo interesse, praticam o comércio conjugal falsificando as leis que regem a reprodução da vida.

Recordai-vos, esposos de ambos os sexos, das vossas origens celestes, e dos vossos imortais destinos. Deixai a outros, para quem o casamento não ultrapassa o nível d’uma união cujo único fim reside no amor sensual, a ideia deprimente de que a paixão é soberana, incoercível e sempre legítima. Subi vós mais alto! Que o vosso casamento realize a união dos vossos corpos e das vossas almas; que as vossas alegrias sejam sóbrias e continentes; Guardai-vos de procurá-las pelo que são em si mesmas, e fora do cumprimento das condições naturais da constituição da família – (Carta pastoral de S. E. o cardeal Mercier sobre Os deveres da vida conjugal, 1909).

O crime dos calculadores – É um crime horrível o daqueles que medem a sua paternidade obedecendo a vãos temores ou a cálculos miseráveis. Deus encheu-os de vida; poderiam rodear-se d’uma família numerosa; mas desconfiam da Providência, receiam as dificuldades, resolveram descansar e gozar, não querem ser perturbados no seu sossego e no seu gozo pelas solicitudes, trabalhos e privações que um aumento de família traz necessariamente.

Sonharam transmitir a um filho único, o máximo a dois, a fortuna de que se orgulham. E dizem à vida: “hás de ir até aqui, e não mais além”. Ainda se eles se dirigissem a Deus e lhe rogassem permissão para se mostrarem prudentes e discretos na observância da sua lei; se retribuíssem essa permissão com o generoso sacrifício d’um prazer; se apenas recusassem a paternidade para ser castos, poderia Deus ser indulgente com a sua fraqueza e aceitar o seu pensamento. Mas não: a esses calculadores desconfiados e egoístas não é uma virtude que detém a vida; suprime-a o vício vergonhoso e cobarde.

Para se poupar aos cuidados e dificuldades da paternidade, sem se privar do gozo, o homem recorreu a artifícios que o animal não conhece; ultrajando a lei de Deus, maltrata a consciência da sua companheira receosa, senão consegue adormecê-la por meio não sei de que mentiras e torna-la cumplice da sua impiedade. – (Pe. Monsabré, Conférences de Notre Dame, 89ª Conferencia).

Uma palavra de Napoleão I – A mulher que eu mais estimo é aquela que tem mais filhos (Vida de madame de Stael).

Uma palavra de Henri Joly: – Quando li pela primeira vez esta pergunta: “Que havemos de fazer dos nossos filhos?” Logo esta resposta me acudiu ao espírito: “Mas comecem pelo princípio: sejam pais!…”

Ouço aqui, sem dúvida, alguns leitores, que me interrompem, a dizerem: “Mas se estamos já tão cheios de dificuldades para assegurar o futuro de duas ou três crianças, quanto mais não lutaremos, se tivermos cinco ou seis?” Não haverá paradoxo na réplica: Menos dificuldades tereis talvez, porque, numa vida de família, mais interior e simples, renunciareis a muitas pretensões fúteis e dispendiosas, a muitas ambições inúteis; tereis dado o exemplo influente do valor, tereis feito desenvolver um espírito perseverante de reflexão, de abnegação, provocando assim essas resoluções viris que criam a confiança, pelo menos tanto quanto elas o exigem.

Sei que há famílias em situações difíceis: são as famílias de muitos filhos que vivem num meio social e profissional em que eles vão gradualmente diminuindo. Muitas prefeririam do melhor grado ter cinco ou seis filhos num meio em que todas as outras tivessem o mesmo número deles, do que ter apenas três ou quatro numa “sociedade” em que a grande maioria não tem mais de dois. Reconheço que há nisto mais respeito humano, mais temor cobarde do que raciocínio exato e verdadeira altivez.

Reconheço também que é temível a pressão do meio, e que as famílias com força bastante para resistir-lhe são famílias excepcionais. Como proceder, todavia? Impõe-se, neste caso, dar o bom ou o mau exemplo, assim como, em sexta-feira, e a uma mesa em que há carne e peixe, inevitavelmente é preciso escolher uma comida ou outra. Não há meio termo. Tenhamos uma geração que aspire a ser rica mais de homem do que de dinheiro: saberá exercer vitoriosamente as várias profissões e abrir novos caminhos. (L’avenir de nos enfants. Resposta de mr. Henri Joly Croix, de22 de set. de 1908.)

O encanto das famílias numerosas – Como é belo o sorriso da infância! Assemelha-se ao raio do sol do nosso lar: quanto mais sorrisos, quanto mais a nossa casa resplandece.

Multiplicai-vos, seres encantadores, enchei de alegre animação e de gritos a casa onde nascestes! Deus gosta de ver-vos e ouvir-vos. Providência das avezinhas e dos lírios dos prados, Ele quer ser, particularmente, o Deus das famílias numerosas. Reserva-lhes as suas melhores bênçãos, e dá-lhes não sei que especiais encantos que atraem a simpatia, a misericórdia e as liberalidades dos corações bem formados. Não há aí os silêncios pesados que entristecem os lares desertos; nem o coração dos pais está exposto às idolatrias néscias que não cessam de rodear o filho único: o número que não enfraquece o amor, multiplica-o; e não há nesses lares abençoados, nem ausências irreparáveis, nem lutos que não possam ser consolados; a flor ceifada por Deus deixa após ela flores amáveis que passam a amar-se mais, como que para se vingarem das traições da morte; nesses lares, o trabalho, a dedicação e o sacrifício impõem-se e perpetuam-se em tradições santas e gloriosas. Há neles eleitos para povoarem o céu, soldados para povoarem o país, pioneiros para se apossarem do mundo: o império da terra pertence às famílias numerosas: Crescite multiplicamini et replete terram. (P. MONSABHÉ, Les profanations du mariage, § I, pag. 178-179).

Voeu de poéte

Seigneur! préservez-moi, préservez ceux que j’aime
Frères, parents, amis et mes ennemis même
Dans le mal triomphants,
De jamais voir, Seigneur! l’été sans fleurs vermeilles,
La cage sans oiseaux, la ruche sans abeilles,
La maison sans enfants!

Victor Higo.

Catecismo do Matrimônio por P. Joseph Hoppenot, S. J., Obra aprovada por 48 cardeais, arcebispos e bispos de França e Bélgica, 1928.

Última atualização do artigo em 28 de fevereiro de 2025 por Arsenal Católico

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