1 – É um erro julgar-se que as paixões humanas, são um mal; quando, pelo contrário, dirigidas com prudência, são os instrumentos de grandes virtudes. O meio de bem as dirigir é a mortificação; o leme governa o navio, o freio dirige o cavalo, e a mortificação rege e guia as paixões do homem.
2 – Há duas espécies de mortificação: uma exterior para o corpo, outra interior para o espírito. O cristão deve praticar ambas para se tornar semelhante a Jesus Cristo, Mestre dos predestinados.
3 – No entanto, lembremo-nos de que as nossas penitências e mortificações habituais não devem ser de natureza tal, que sejam nocivas à saúde e as forças, das quais somos meramente depositários, e não senhores. O nosso corpo, diz graciosamente Santo Agostinho, é um pobre doente recomendado à caridade de nossa alma; todas as suas necessidades são como outras tantas enfermidades, às quais a caridade da alma deve vir em auxílio. Tenhamos pois cuidado do nosso corpo, sem fomentar as paixões, mas também sem faltar às suas necessidades.
4 – Os exemplos dos Santos, que praticaram extraordinárias penitências, merecem nossa admiração e não a nossa imitação.
5 – Tende cuidado em que os vossos jejuns e abstinências não sirvam a lisonjear a vaidade, ou que tenham por princípio o amor próprio e a vossa vontade. Se estas obras não forem subordinadas à obediência do vosso diretor, serão rejeitadas por Deus, como Ele mesmo disse pela boca de Isaías: “Em vossos jejuns só procurais satisfazer a vossa vontade: Ecce in die jejunii vestri, invenitur voluntas vestra“.
6 – Quereis exercer um gênero de mortificação? Praticai a mortificação interior, a qual, segundo diz S. Bernardo, consiste na abnegação da nossa própria vontade; e para esta não há recusas. Se vos mando o jejum, diz S. Jerônimo, podeis responder-me que as vossas forças não vo-lo permitem; se vos mando dar esmolas, podeis desculpar-vos com os vossos poucos meios; mas se vos mando que renuncieis à vossa vontade, não tendes agora pretexto algum para disso vos escusardes.
7 – S. Felipe Nery dizia muitas vezes aos seus discípulos: “Meus filhos, a vida espiritual consiste em três dedos“, e ao dizer isto punha os dedos sobre a testa, para mostrar que a vida espiritual está na mortificação da nossa imaginação, juízo e vontade.
8 – A bela e tão segura regra que Santo agostinho, seguia a respeito do sentido do olfato, pode aplicar-se a tudo quanto lisonjeia agradavelmente os sentidos. O meu espírito pouco casa faz dessas substâncias que exalam agradável aroma; senão se acham perto de mim, não as procuro; se estão perto de mim, delas não fujo, mas estou sempre pronto a passar sem elas.
9 – As mortificações que não dependem da nossa vontade e não foram escolhidas por nós, como as doenças, o mau êxito de um negócio, a inveja dos outros, o desprezo, sofridas com resignação e alegria de espírito, são mais meritórias que todas as outras mortificações, pois são inválidas por Deus, que Se serve da malícia dos homens como dum instrumento para nos provar. Davi fugitivo e insultado por Semei conteve a justa ira dos seus, dizendo-lhes que Deus tinha mandado a Semei amaldiçoar Davi.
Direção para Viver Cristãmente pelo Rev. Padre Quadrupani, Barnabita, 1905.
Última atualização do artigo em 9 de março de 2025 por Arsenal Católico