1 – São Tomás ensina-nos que a penitência se divide em três partes: jejum, oração e esmola, tanto corporal como espiritual.
Não devemos portanto imaginar que não fazemos penitência, porque não maceramos a carne ou não podemos jejuar com frequência. As duas outras partes, a saber, a oração e a esmola ajudam a cumprir este dever de cristão. Por outro lado os mandamentos de Deus e da Igreja, prescrevendo o jejum, não têm em vista tornar-vos doente ou impedir-vos de cumprir os deveres do vosso estado.
2 – Receber com resignação os trabalhos, as enfermidades, a aridez da alma, as desgraças, é uma penitência tanto mais agradável a Deus, por isso que é menos da nossa escolha. Há dois gêneros de virtudes: umas residem na ação, outras no sofrimento; as segundas são estimáveis e menos perigosas; na ação, a natureza e uma certa complacência podem ter grande parte; é o que não sucede no sofrimento, sobretudo quando não é da nossa escolha e vem diretamente de Deus.
3 – São Jerônimo ensina-nos que o demônio quando não pode retirar uma alma do bom caminho, procura impeli-la a excessos de rigor e de penitência, afim de que elas parem com o espírito fatigado e a saúde enfraquecida. Muitas almas virtuosas e santas têm caído neste laço.
4 – É por isso que São Francisco de Sales nos diz: “Exorto-vos a que conserveis a vossa saúde, porque é essa a vontade de Deus; exorto-vos a que conserveis as vossas forças, para as empregardes na glória de Deus; é melhor ter forças de mais do que de menos, porque uma vez perdidas, é difícil recuperá-las. Dai, pois, ao vosso corpo a medida de alimentos e bebida que convém à conservação das vossas forças e da vossa saúde.”
5 – Cassiano e São Tomás escrevem que Santo Antão, numa conferência célebre que teve com os monges do Egito, concluiu que a virtude mais necessária era a descrição; porque, assim como o sal conserva todas as viandas, a discrição regula todas as virtudes. Há muitas pessoas que, esquecendo esta discrição necessária nas práticas de penitência e devoção, em vez de se tornarem santas, tornaram-se doentes, e abandonaram depois o caminho da perfeição, julgando-o impraticável.
6 – Eis aqui uma bela e judiciosa observação de Santo Agostinho, que pode servir invariavelmente de guia: “O nosso corpo é um pobre doente recomendado à caridade da alma da qual deve receber os remédios oportunos. Todas as suas precisões são enfermidades. A fome, a sede, a fadiga são enfermidades do corpo, às quais a alma deve prestar caridosamente auxílio nos limites da razão e da sobriedade.” Aquele que assim obra, cumpre um ato de obediência para com o Criador.
7 – É pois um erro (e certamente muito grande) acreditar o que se encontra em muitos livros ascéticos, a saber: “Que pouco importa que abreviemos a vida de dez ou quinze anos, com tanto que salvemos a alma”. Sem dúvida, devemos, quando vai nisso a salvação eterna, afrontar a própria morte sem hesitação; mas não devemos, debaixo deste pretexto geral, escolher um modo arbitrário de penitência que tenda diretamente a abreviar a vida; porque, diz São Jerônimo, não há grande diferença entre suicidar-se de uma vez, ou suicidar-se pouco a pouco. Não somos senhores, mas só depositários da nossa vida, da nossa saúde e das nossas forças.
8 – Os exemplos dos Santos que fizeram obras extraordinárias de penitência, merecem a nossa admiração, e não a nossa imitação. É preciso, diz Santa Francisca de Chantal, respeitar, mas não imitar, tudo o que fizeram os Santos, doutra sorte seria preciso viver com eles na horrível gruta de São Climaco; habitar em altas colunas com os Stylitas; viver muitas semanas unicamente da comunhão sacramental com Santa Catarina de Sena; não tomar mais do que uma onça de alimento por dia como São Luiz Gonzaga. Querer imitar os Santos nas coisas extraordinárias, é o efeito de um secreto orgulho, e não de uma virtude bem entendida.
Direção para Sossegar Nas Suas Dúvidas As Almas Timoratas pelo Rev. Pe. Quadrupani Barnabita, 1905.
Última atualização do artigo em 12 de março de 2025 por Arsenal Católico