“Ego te absolvo a peccatis tuis in nomine Patris et Filii et Spiritus Sacnti – Eu te absolvo dos teus pecados em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo”, diz o Padre no tribunal da penitência, absolvendo ao pecador das suas culpas.
“Eu te abolso de teus pecados”. Com efeito: uma palavra poderosa nos lábios do sacerdote, uma palavra de consolo par o pecador arrependido. Para compreender bem a significação destas palavras, é necessário saber o que é o pecado e quais os estragos que causa na alma do homem.
Pelo pecado renuncia o homem a Deus e adere ilicitamente às criaturas, preferindo sua vontade própria à divina. Transgredindo ciente e voluntariamente a lei de Deus num ponto grave, cometeis um pecado mortal. Esta separação de Deus causa-vos uma ferida mortal: perdeis o amor, a amizade de Deus, a graça santificante, e de amigo vindes a ser inimigo de Deus, de filho de Deus vos tornais escravo de satanás, um vaso da ira divina, incapaz de fazer alguma coisa boa que tenha valor para o céu, incapaz de entrar no reino do céu. Se, achando-vos no estado de pecado mortal vos afadigardes por anos e anos, e empregardes todas as vossas forças no serviço da caridade cristã, essas obras todas não terão nenhum valor para a eternidade. Somente uma coisa podeis ainda fazer: podeis rezar, praticar boas obras, dar esmolas, para que Deus, na sua infinita misericórdia, vos dê, por causa destas boas ações e mortificações, a graça da conversão e vos perdoe, em vista destas obras de penitência, as penas temporais. Também podeis orar e fazer bem aos outros, socorrer aos defuntos com vossos trabalhos e penitências, mas para vossa própria eternidade todas essas obras estão perdidas, irreparavelmente perdidas.
Ainda mais: “Desviando-se o justo da sua justiça e cometendo iniquidade, de todas as suas justiças que tiver feito, não se fará memória” (Ezech. 18, 24), diz o Espírito Santo. Em outras palavras: Separando-vos de Deus, embora por um só pecado mortal, perdeis todas as boas obras e todos os merecimentos adquiridos até então. Talvez tenhais servido a Deus fielmente por muitos anos, ajuntando assim um riquíssimo tesouro de méritos para o céu; se, porém, cairdes num pecado mortal e, permanecendo neste estado de desgraça, sairdes desta vida, Deus não se lembrará de todas as vossas boas obras: uma vida sem alegria e consolo, uma vida cheia de tormentos inauditos, a morte eterna serão vosso quinhão.
Eis aqui a maldição do pecado! Tudo isso e consequência do pecado. O prazer que procurastes no pecado, contra a vontade de Deus, vos fez infeliz, para a vida futura, infeliz até para a vida presente.
Pois a alegria e felicidade não podem coabitar com o pecado. “Nenhum bem terreno”, diz S. João Crisóstomo, “é capaz de mitigar a sede de paz e felicidade do coração humano: nem a abundância de outro, nem o poder soberano, nem a suntuosidade dos banquetes nem o luxo dos vestidos. Só a boa consciência é capaz de nos dar esta paz tão desejada. Quem conserva sua consciência limpa de pecado, ande embora vestido de andrajos e atormentado pela fome, é mais feliz do que aquele que leva a todos os divertimentos possíveis e imagináveis uma consciência torturada de remorsos!” Não digo que a satisfação dos sentidos e os divertimentos mundanos não possa, pelo menos por algum tempo, entreter vossa alma numa certa letargia, fazer calar vossos temores; mas este estado de coisas não há de durar. As consolações e alegrias deste mundo não são capazes de sarar completamente a ferida de vosso coração. Deus é justo e não deixa zombar impunemente de si. Se a justiça divina não age senão lentamente, seus efeitos, sem dúvida, se farão sentir um dia terríveis e medonhos. O braço vingador de Deus pode bem tardar em castigar-vos, mas um dia pesará tanto mais sobre vós. Então vossa consciência má levantar-se-á contra vós, implacável, e experimentareis enfim, que acima de vós há um Deus castigador do pecado.
Suponhamos, caro amigo, que tenhais gravemente ofendido a Deus e que por causa dos vossos pecados, Deus vos deixe a escolha: ou fazerdes a mais rigorosa penitência durante toda a vossa vida ou serdes entregue aos tormentos eternos do inferno. Dizei-me: qual seria a vossa escolha? Se refletirdes bem, mais suportáveis sempre vos parecerão todos os rigores da penitência do que o inferno; pois antes sofrer por algum tempo, que penar por toda a eternidade!
Ora, a infinita misericórdia de Deus não exige tanto de nós. Por causa dos merecimentos de Cristo, Ele se contenta com pequenos sacrifícios. Não requer de vós senão a confissão contrita e sincera de vossos pecados, feita a um sacerdote obrigado ao mais absoluto sigilo para purificar vossa alma de todas as suas máculas.
Mal havia o filho pródigo começado a humilde confissão dos seus erros, e já seu pai não se lembra mais da sua ingratidão. Ele o abraça e lhe dá o ósculo de paz: “Trazei depressa a melhor veste e o vesti, e ponde-lhe no dedo um anel, e sapatos nos pés… e comamos e banqueteemo-nos” (Luc. 15, 22). Assim procede Deus também convosco, quando vos aproximais arrependido do tribunal da penitência. Adota-vos de novo, dá-vos o vestido nupcial da graça santificante, restituindo-vos o direito ao céu. Ele não se lembra mais das vossas culpas. Todos os vossos pecados mortais são perdoados, e outrossim os veniais, se deles vos arrependeis. Deus os apaga do livro das dívidas; estão para Ele como que sepultados para sempre no esquecimento: “Se o ímpio se converter de todos os seus pecados que cometeu… certamente viverá, não morrerá. De todas as suas transgressões que cometeu, não haverá lembrança contra ele” (Ezech. 18. 21,23).
Para salvar-vos será necessário perseverardes no bem e sairdes desta vida em estado de graça. Tornando, pois, a pecar após vossa conversão, persistindo no pecado e morrendo impenitente, sereis infalivelmente condenado. Que desgraça indizível! Todavia, as penas e os males do inferno não serão mais para vós nem tão numerosos nem tão grandes como se nunca vos houvésseis confessado. As penas do inferno serão proporcionadas à multidão e gravidade dos pecados cometidos nesta vida.
O Padre Brydaine estava pregando uma santa missão na cidade de Aix em França, quando um dia um velho oficial do exército vem bater à porta da casa dos missionários, justamente na ocasião em que estes estavam sentados à mesa. “Venha comigo”, disse-lhe o oficial em tom imperioso, “tenho de dizer-lhe duas palavras em segredo”. Tendo-se retirado com ele para um quarto contiguo, fechou o oficial a porta atrás de si e disse ao missionário: “Reverendo, quero confessar-me, mas logo, do contrário não sei o que será de mim”. “Mas porque tanta pressa?” perguntou o Padre. “Ouvi-lhe o sermão sobre o inferno, replicou o oficial, e desde aquele momento não tenho mais sossego. Já não posso aturar os remorsos da consciência que me tortura de dia e de noite. Não saiais daqui sem me terdes tirado este peso do coração”. (Carron, Vie de Brydaiine).
Oxalá, que também em vós, caro amigo, se faça ouvir sempre com tanta força a voz da consciência, que nunca deixeis pôr-se o sol sobre vosso pecado mortal. “Não tardes em converter-se ao Senhor e não o adies de dia a dia”. (Eccles. 2, 8). Do contrário podereis morrer de repente sem terdes a felicidade de receber os últimos sacramentos.
Outras graças ainda recebeis no tribunal da penitência. Todos os méritos, que havíeis adquirido em estado de graça, foram privados pelos pecados mortais subsequentes, de sua vitalidade e eficácia para o céu.
Pela confissão estes méritos revivem e recuperam sua eficácia para a glória eterna. Desde este momento podeis aumenta-los de hora em hora; tudo o que daquele instante em diante fizerdes por amor de Deus, será ricamente recompensado no céu. Cada boa ação, qualquer serviço prestado ao próximo, qualquer incomodo suportado com paciência, numa palavra, qualquer ato de virtude, praticado com os olhos em Deus, vos adquirirá um novo merecimento, uma nova glória no reino celeste.
Ainda mais: a felicidade que gozará vossa alma, exercerá uma influência salutar sobre vosso bem estar geral. Tendo recuperado a paz de Deus, tereis também a paz convosco mesmo. Podeis, na verdade, sentir-vos feliz, enquanto fordes escravo do pecado? Não, a consciência má nunca vos deixará sossegar; só a boa consciência vos poderá dar a paz do coração.
Quantas vezes não ouve o sacerdote da boca dos penitentes as palavras: Ah, meu Padre, como sou feliz agora! Como estou contente! Oxalá não tivesse adiado tanto tempo a minha confissão; quantos vexames poderia ter-me poupado! Caro amigo, já experimentastes talvez vós próprio os salutares efeitos de uma boa confissão? “Eu te absolvo dos teus pecados” disse o sacerdote como representante de Deus, e uma alegria inefável inundou-vos o coração; reanimado e cheio de coragem voltastes aos vossos trabalhos quotidianos. Eis os efeitos do Espírito Santo que encheu vosso coração com sua alegria e felicidade celestiais, depois de vos terdes tornado de novo, pela absolvição, filho de Deus e herdeiro do céu.
Se, pois, tendes a infelicidade de cair num pecado mortal “não tardeis em converter-vos ao Senhor e não o adieis de dia em dia”. Aproveitai a primeira ocasião, que tiverdes para lavar vossa alma das nodoas do pecado.
Não há dúvida: se alguém se arrepende dos seus pecados, que esteja disposto a se confessar logo que puder, alcança imediatamente o perdão, já antes de receber o sacramento da penitência. Quanto aos pecados veniais, rigorosamente falando, não há necessidade de acusa-los. Entretanto, deve-se notar, que nem sempre temos certeza de termos contrição perfeita das nossas culpas. Mesmo quando pudésseis dizer de todo o vosso coração e positivamente: Arrependo-me de meus pecados, detesto-os por amor de Deus infinitamente bom; mesmo assim a absolvição do padre vos daria muito maior segurança. Depois duma sincera confissão podeis dizer a vós mesmo: agora estou absolvido pelo tribunal estabelecido por Deus mesmo; readquiri a amizade de meu Deus; da boca do seu representante ouvi a palavra redentora: “Eu te absolvo dos teus pecados”.
De resto, embora desde muito talvez tenhamos alcançado o perdão dos nossos pecados mortais, pela contrição perfeita, contudo devemos acusa-los na confissão seguinte; pois é uma obrigação grave, com já vimos, da qual não podemos eximir-nos. Todos os pecados mortais, cometidos depois do batismo, devem ser confessados, sendo possível. Porque, pois, adiar a confissão?
A confissão é o caminho mais curto e mais seguro para reconciliar-se com Deus; é o meio mais fácil de apagar os pecados tanto mortais como veniais.
Não tendo cometido senão pecados veniais, e recebendo o sacramento em estado de graça, obtendes além da remissão das vossas faltas, um aumento da graça santificante e o direito a novas graças atuais. Quanto mais perfeita vossa preparação, quanto maior vossa contrição, tanto mais graças, derramar-se-ão sobre a vossa alma neste sacramento, como veremos mais adiante.
Continua…
O Cristão Prático ou Exposição prática da Moral Cristã, por R. P. Fructuoso Hockenmaier O.F.M., 1915.
Última atualização do artigo em 11 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico