Quando as pavoas chocam em lugares bem brancos, os filhotes também saem branquinhos; e, quando as nossas intenções estão no amor de Deus ao projetar-mos alguma obra boa, ou ao nos lançar-mos em alguma vocação, todas as ações que se seguem tomam o seu valor e tiram a sua nobreza do amor onde têm a sua origem; porquanto, quem não vê que as ações que são próprias para a minha vocação, ou requeridas para o meu desígnio, dependem dessa primeira eleição e resolução que fiz?
Mas não se deve para aí; porém, para fazer excelente progresso na devoção, é mister não só, no começo da nossa conversão e depois todos os anos, destinar a nossa vida e todas as nossas ações a Deus, mas também oferecê-las a Deus todos os dias, pois nesta renovação diária da nossa oblação difundimos nas nossas ações o vigor e a virtude da dileção, por uma nova aplicação do nosso coração à glória divina, sendo Ele, por esse meio, cada vez mais santificado.
Além disso, apliquemos cem e cem vezes ao dia a nossa vida ao divino amor pela prática das orações jaculatórias, elevações de coração e retiros espirituais; pois estes santos exercícios, lançando e atirando continuamente nossas mentes em Deus, a Ele levam em seguida todas as nossas ações. E, dizei-me, como poderia ser que uma alma que a todo momento se lança na divina Bondade e suspira incessantemente palavras de amor, para manter sempre o coração no seio do Pai Celeste, não fosse julgada como fazendo todas as suas boas ações em Deus e por Deus? Aquela que diz: Oh, Senhor, sou vossa, meu Bem-amado é todo meu e eu sou toda sua; meu Deus, sois o meu tudo; ó Jesus, sois a minha vida; ah! quem me fará a graça de morrer a mim mesma a fim de só viver para vós!” Ó amar! Ó encaminhar-se! Ó morrer a si mesmo! Ó viver para Deus!” Ó estar em Deus! Ó Deus! aquilo que não é vós mesmo não é nada para mim! – essa alma, digo, não dedica continuamente suas ações ao celeste Esposo? Oh! que bem-aventurada é a alma que fez uma vez bem a destituição e a perfeita resignação de si mesma nas mãos de Deus, como falamos acima! Porque, ao depois, ela só tem que fazer um pequeno suspiro e olhar para Deus para renovar e confirmar a sua destituição, resignação e oblação, com o protesto de nada querer senão a Deus e por Deus, e de não amar a si nem coisa alguma no mundo, senão em Deus e pelo amor de Deus.
Este exercício das continuas aspirações é, pois, mui próprio para aplicar todas as nossas obras ao amor, mas principalmente basta muito abundantemente para as ações diminutas e comuns da nossa vida.
Ora, neste exercício do retiro espiritual e das orações jaculatórias está a grande obra da devoção: ele pode suprir a falta de todas as demais orações, mas a ausência dele quase não pode ser reparada por nenhum outro meio. Sem ele não se pode fazer bem a vida contemplativa, e só mal se poderia fazer a vida ativa; sem ele, o repouso não passa do ócio, e o trabalho de embaraço; eis por que vos suplico abraçá-lo de todo o vosso coração, sem jamais vos apartardes dele.
O Segredo da Salvação, A Lembrança da presença de Deus e as Orações jaculatórias, extraído das Obras de S. Francisco de Sales, por Fernando Millon, Missionário de S. Francisco de Sales, 1952.
Última atualização do artigo em 6 de abril de 2025 por Arsenal Católico