Senhor, imprimi em mim um sentimento tão profundo da minha indigência, que tudo espere e Vós e que só a Vós atribua todo o bem.
1 – Assim como a humildade é o fundamento indispensável de toda a vida espiritual, é também a condição basilar de todo o apostolado e constitui a parte central do programa de abnegação e de esquecimento de si mesmo por ele requerido. Precisamente porque o apóstolo está – em certo sentido – posto sobre o candelabro, tem mais necessidade do que os outros de proteger o seu espírito dos fumos do orgulho e da vanglória com uma profunda humildade. Percorrendo o Evangelho, é significativo constatar como Jesus insistiu sobre este ponto na formação dos Apóstolos. Quando estes discutiam a propósito de quem seria o maior no reino messiânico, o Mestre replicou: “se vos não converterdes e vos não tornardes como meninos, não entrareis no reino dos céus” (Mt. 18, 3). Noutra ocasião quando a mãe de Tiago e João pediu para os seus filhos os primeiros lugares, retorquiu: “O que quiser ser entre vós o primeiro, seja vosso servo” (ib. 20, 27); e na tarde da última ceia, no lava-pés, demonstrou-lhes até que ponto os apóstolos devem fazer-se servos: “Se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, deveis lavar-vos os pés uns aos outros” (Jo. 13, 14); por último, antes de os enviar para a Sua vinha a fim de darem “muito fruto”, declarou-lhes repetidas vezes: “Sem mim nada podeis fazer” (ib. 15, 5).
Sim, os apóstolos são os amigos de Jesus, por Ele escolhidos e destinados para a evangelização do mundo, por Ele propostos para o governo da Igreja, revestidos da dignidade sacerdotal e do poder de “atar e desatar”, ou – se são leigos – elevados à dignidade de colaboradores da hierarquia, chamados também a cooperar na salvação das almas. Porém, na base de todos estes privilégios, de todas estas honras, estão as transcendentes palavras: “é preciso tornar-se como criancinhas; sem mim nada podeis fazer”. Oh! se estivéssemos verdadeiramente convencidos de que, embora Deus queira servir-Se de nós, só Ele tem o poder de tornar fecunda a nossa ação, só Ele pode produzir frutos de vida eterna, só Ele pode dar a graça às almas, e que nós apenas somos instrumentos tanto mais aptos a servir de meio para a salvação dos outros quanto mais pequenos nos fizermos reconhecendo a nossa indigência! Que mérito pode ter um pincel utilizado por um grande pintor na realização de uma obra de arte? De que se pode vangloriar o mármore empregado por Miguel Ângelo para esculpir o seu Moisés? “Não fostes vós que me escolhestes – dizia Jesus aos Apóstolos – mas fui eu que vos escolhi a vós e que vos destinei para que vades e deis fruto” (Jo. 15, 16).
2 – “Sem mim nada podeis fazer”. Quantas ambições, quantos pontos de honra, quantas vãs complacências de si mesmo, quantas pretensões de aplausos, quantos desejos de subir e de que se reconheça o nosso valor, se despedaçam contra estas palavras, como as ondas do mar contra as rochas! Jesus não nos diz que sem Ele pouco podemos fazer, mas diz-nos que não podemos fazer nada, absolutamente nada; e se aparentemente as obras prosperam, os admiradores aumentam e se enchem as Igrejas e os salões, na realidade nem um único grãozinho de graça cai nos nossos corações se Deus não intervir. Pobre apóstolo, tão satisfeito às vezes e tão inchado com os teus êxitos! Apesar do teu talento, do teu expediente, do teu estilo brilhante, da tua conversação atraente, dos teus títulos e dos teus êxitos, és mais pequenino e mais impotente no apostolado, do que uma formiga diante duma gigantesca montanha. Reconhece o teu nada, refugia-se em Deus, permanece fortemente unido a Ele porque só dEle provém a fecundidade para as tuas obras.
Encarregada da educação das noviças, S.ta Teresa do Menino Jesus exclamava: “Senhor, sou demasiado pequena para alimentar as Vossas filhas; se quereis dar-lhes, por mim, o que convém a cada uma, enchei a minha mão e sem deixar os Vossos braços, sem voltar a cabeça, darei os Vossos tesouros à alma que me vier pedir alimento” (M.C. pg. 288). Eis a atitude a ser adotada por todo o apóstolo; ou antes, quanto mais alta, importante e delicada for a sua missão, tanto mais necessário é este humilde reconhecimento da própria miséria, este confiante recurso a Deus, esta contínua união com Ele. Se Deus não Se serve de nós para realizar obras grandes, não será talvez porque, não estando suficientemente convencidos ainda do nosso nada, poderíamos vir a ser ladrões da Sua glória, atribuindo o resultado aos nosso méritos? Se a nossa atividade apostólica produz pouco fruto, não será porque, demasiado confiados em nós próprios, não nos preocupamos suficientemente com manter-nos unidos a Deus pela humildade e pela prece? “Permanecei em mim – repete-nos Jesus. – Como a vara não pode de si mesma dar fruto… assim também vós se não permanecerdes em mim” (Jo. 15, 4). Não basta que o apóstolo permaneça unido a Jesus pelo estado de graça, mas deve unir-se também a Ele movido por esta humildade profunda que lhe faz sentir que nada pode fazer, mesmo nada, sem o Seu contínuo auxílio.
Colóquio – “Peço-Vos, Senhor meu, que dirijas para Vós o coração e a vontade dos Vossos apóstolos, de forma que Vos sigam, Cordeiro imolado, pobre, humilde e manso, pelo caminho da santíssima cruz, à Vossa maneira e não à sua. Expulsai as trevas do seu coração e dai-lhes a Vossa luz, tirai-lhes a humildade do amor próprio e que o fogo da Vossa caridade permaneça neles. Fazei que encerrem as potências da alma, fechem a memória aos vãos defeitos e benefícios terrenos e só a abram aos Vosso benefícios, de tal modo que não amem coisa alguma fora de Vós, mas que Vos amem a Vós sobre todas as coisas e a todas as coisas segundo a Vossa vontade e Vos sigam somente a Vós.
“Fazei que, por meio duma caridade ordenada, procurem a salvação de todos e estejam dispostos a dar a vida pelo bem das almas. Que eles sejam criaturas angélicas, anjos terrestres nesta vida e fachos ardentes na santa Igreja” (cfr. S.ta Catarina de Sena).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.
Última atualização do artigo em 8 de março de 2025 por Arsenal Católico