Julgar com prudência

William Holman Hunt, Em oração [Detalhe], 1866, Domínio Publico - Wikimedia Commons

Ensinai-me, Senhor, a julgar retamente das coisas para poder agir com retidão.

1 – A primeira atribuição da prudência é ajudar-nos a escolher os meios mais aptos para alcançar o nosso fim último. Umas vezes esta escolha é fácil e apresenta-se espontaneamente ao espírito já habituado a julgar e a agir á luz da eternidade; mas outras, ao contrário, a escolha é difícil e trabalhosa como, por exemplo, quando se trata da escolha de estado ou de profissão, de dar novo rumo à própria vida ou então de solucionar casos complicados em que é necessário ter em conta elementos independentes da própria vontade. Nestes casos é preciso dar tempo ao tempo a fim de se examinar tudo com ponderação, e aconselhar-se com pessoas prudentes e experimentadas: agir precipitadamente seria já uma falta de prudência. Jesus, no Evangelho, fala-nos do homem prudente que, “querendo edificar uma torre, faz primeiro, sentado, a conta dos gastos que são necessários, para ver se tem com que acabar” (Lc. 14, 28). O tempo empregado nestes exames, nestes cálculos ditados pela prudência sobrenatural, não é tempo mal gasto, antes pelo contrário; assim, não é raro que, perante decisões graves, o próprio Deus queira que esperemos com paciência a fim de que as circunstâncias nos manifestem claramente a Sua vontade. Enquanto esperamos, devemos dar um grande lugar à oração, a fim de implorar do Senhor a luz que a nossa prudência é incapaz de nos dar. Com efeito a prudência, conquanto seja uma virtude infusa e sobrenatural, exerce-se sempre por meio das nossas faculdades humanas e, por isso, ressente-se da nossa limitação; para a ajudar, porém, Deus concedeu-nos um dom especial do Espírito Santo: o dom de conselho, cuja atuação não depende de nós, mas que podemos obter por intermédio da oração.

Uma vez que se tomou a decisão, depois de se terem empregado todos os meios sugeridos pela prudência sobrenatural, então a própria prudência nos ordena passar á execução com coragem e diligência, sem interpor demoras da nossa parte e sem nos deixarmos desencorajar pelas dificuldades que possamos encontrar.

2 – Para que o nosso juízo e a nossa escolha sejam prudentes, devemos libertá-los de elementos demasiado subjetivos, tais como os gostos, os interesses, as antipatias ou simpatias naturais. Por vezes podemos iludir-nos ao julgarmos de uma situação ou ao determinarmo-nos a uma obra, pensando que será unicamente para glória de Deus e para o bem do próximo; todavia, se nos examinássemos a fundo, repararíamos talvez que os motivos que prevaleceram no nosso juízo ou na nossa deliberação, foram motivos egoístas ou interesses pessoais. Assim a prudência também nos pede que purifiquemos o coração de todos estes motivos humanos, também nos exige desapego e renúncia. precisamente quando acabava de falar da prudência necessária ao homem que quer edificar uma torre e ao rei que quer entrar em guerra, Jesus disse: “Assim, pois, qualquer de vós que não renuncia a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo” (Lc. 14, 33). Por outras palavras, a prudência necessária ao que quer ser um verdadeiro seguidor de Cristo, consiste em renunciar a tudo o que pode servir de obstáculo à consecução da vida eterna, consiste em negar-se a si mesmo para ter o coração livre de movimentos egoístas e pessoais. Só esta renúncia nos permitirá triunfar das reações espontâneas do nosso amor próprio e dos impulsos do nosso egoísmo e, portanto, nos porá em condições de formular juízos retos, fazer escolhas e tomar decisões imparciais.

Mas sobretudo em face de juízos ou deliberações de certa importância, que podem ter consequências par ao próximo e que são porventura do nosso agrado, a prudência exige um exame consciencioso para ver se somos de fato movidos por motivos sobrenaturais independentes de qualquer consideração humana. Se uma circunstância nos perturbou um pouco, nos impressionou, a prudência ensina-nos a suspender todo o juízo e deliberação até que nos tenha voltado a calma; de outro modo, expor-nos-íamos a proceder mais por paixão do que por um amor sincero do bem.

“O amor é prudente, reto, circunspecto”, diz, a Imitação de Cristo (III, 5, 7); o que prova que a prudência é uma característica indispensável da verdadeira virtude.

Colóquio – “Ó Deus, é-Vos mais agradável uma só obra feita com prudência, do que muitas realizadas com imprudência e leviandade, porque esta virtude examina e pondera muito bem cada ação, a fim de que redunde para Vossa honra e glória.

“A prudência verdadeira e sobrenatural é Vossa e está em Vós, ó Senhor, poucos são os que a encontram, porque muitos a procuram mais com astúcia do que com prudência, querendo investigar os Vossos desígnios com a própria sabedoria, perdem o tempo e nunca mais a encontrarão. Quem verdadeiramente quer possuir a prudência, deve ir a Vós, Verbo Incarnado, e em Vós a encontrará juntamente com todas as outras virtudes, mas encontrá-la-á bem diversa da prudência humana que tende para o que exalta e não para o que humilha. Em Vós encontrará a prudência que o leva a humilhar-se e a abaixar-se, tal com Vós Vos quisestes humilhar e abaixar para nos mostrardes o caminho que conduz à salvação. Vós, Senhor, dissestes: ‘Quem quiser vir após mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me’. Oh! sim, esta é a suma prudência! E contudo, à prudência humana parece a maior loucura. Aos sábios deste mundo parece a maior loucura tomar a cruz e seguir-Vos, ó Cristo Crucificado! Mas Vós ensinais-me que a loucura da cruz é suma sabedoria, e que negar-se a si mesmo é suma prudência. Que loucura mais prudente pode haver do que pegar na cruz conVosco e seguir-Vos, caminhando sobre as Vossas pegadas? E que prudência maior pode haver do que morrer a si mesmo para encontrar a vida em Vós, de quem recebem a vida todas as coisas?” (Sta M. Madalena de Pazzi).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

Última atualização do artigo em 24 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico

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