Maternidade de Maria

Fra Angelico, Anunciação, San Giovanni Valdarno, década de 1430, Museu da Basílica de Santa Maria delle Grazie, Public Domain - Wikimedia Commons

O cetro de David passara para mãos de estranhos: governava, em Israel, o idumeu Herodes o Grande.

As 70 Semanas de Daniel eram passadas: era chegada à plenitude dos tempos.

“E foi enviado, da parte de Deus, o Anjo Gabriel a uma Virgem desposada com um varão por nome José, da Casa de David, e o seu nome era Maria.

E aproximando-se d’Ela o Anjo, diz: Ave, ó cheia de graça, o Senhor é contigo, bendita és tu entre as mulheres. Tu conceberás e darás à luz um filho que chamarás Jesus. Este será grande e será chamado o Filho do Altíssimo.

O Espírito Santo descerá sobre ti e por isso o que nascer de ti, Santo, será chamado Filho de Deus. E Maria disse: eis a escrava do Senhor: faça-se em mim segundo a tua palavra.”

Estava consumado o mistério: o Filho de Deus, a quem o Pai gera desde toda a Eternidade, será também, doravante, o filho dos homens. A natureza divina e a humana, embora permanecendo sempre as mesmas e inconfundíveis, começarão a subsistir numa só e mesma pessoa, a pessoa preexistente no Verbo, a Sagrada Pessoa da Santíssima Trindade. Jesus Cristo, “Aquele Homem” que os judeus apontavam como o carpinteiro e filho do carpinteiro, é verdadeiramente o Filho de Deus, é Deus. Maria, a esposa de S. José, Nossa Senhora, é a Mãe de Jesus, é a Mãe de Deus.

***

Corria o ano 429 da era cristã. Ouvia-se ainda o eco das diabólicas afirmações de Ario e dos manicheus.

Num dia de festa, em Constantinopla, os fiéis, ávidos de ouvir a sã doutrina, enchiam, por completo, as vastas naves da maior Basílica da Nova Roma.

O Metropolita Nestório, a quem costumavam recorrer as suas ovelhas, que tremiam diante das blasfêmias “dos novos judeus e partidários de Caifaz – os Arianos, acabara a função Litúrgica e subia vagarosa e solenemente a Cátedra da Verdade. A sua eloquência arrebatadora fascinava os ouvintes – o seu todo de majestade dominava a religiosa assembléia. Todos os ouvidos se preparavam para o escutar. Mas eis que, neste dia, uma desilusão amarga ia ferir todos os corações. Nestório desonra a Cátedra com uma heresia. Os fiéis entreolham-se: aquele sentimento íntimo que o Espírito Santo derrama nas almas e as faz pressentir o erro, a mentira, não chegara ainda a compreender o alcance das obscuras afirmações do seu Bispo. Só se sentia que aquilo não estava bem. Momentos depois, toda a dúvida se dissipa: Nestório blasfemava de Maria. Eusébio Dorileu, um simples fiel, levanta-se, no meio de ovações de toda a assembléia e proclama as grandezas de Maria. Nestório, não responde: vocifera injúrias e ameaça.

Terminada a pregação, o povo saiu.

O assumpto das conversas eram os acontecimentos daquele dia.

Nestório, apesar de tudo, não tinha sido bastante claro e preciso nas suas afirmações. Mas avolumava-se a fama de que não eram retas as suas ideias acerca da União Hipostática e da Maternidade Divina, de Nossa Senhora. Era necessário ouvi-lo, de novo, e ver até onde chegaria a sua audácia e impiedade. O momento não se fez esperar. Nestório, por boca de um seu representante, afirma categoricamente a heresia: Nossa Senhora não é Mãe de Deus!

Um grito de horror e reprovação se levantou unânime em plena Basílica: Nestório, blasfemo! E os fiéis armando-se da única arma legítima em tais circunstâncias, protestam saindo da Basílica para não mais lá entrar enquanto ali funcionasse o heresiarca.

Passaram-se dois anos. Éfeso via entrar, pelas suas portas, cerca de 200 Bispos de todo o mundo. Lá chegaram também os enviados do Papa S. Celestino: os Bispos, Arcádio e Projeto, e o presbítero Philippe.

As sessões multiplicam-se; esclarecesse a doutrina, fazem-se repetidas tentativas junto de Nestório para que se submeta e se apresente ao Concílio. Tudo inútil. O heresiarca persiste no erro: o seu orgulho não lhe permite baixar a cabeça.

Finalmente o dogma é definido e Nestório deposto.

“É com o coração a sangrar, dizem os Padres do Concílio, que nós, instrumentos de Nosso Senhor Jesus Cristo, a quem Nestório ultrajou, o declaramos deposto da dignidade episcopal e expulso do Colégio dos Bispos.

“Se alguém negar… que a Santíssima Virgem é Mãe de Deus, seja anátema”.

A carta do Papa S. Celestino ao Concílio, lida por São Cirilo, seu representante, confirma as decisões tomadas. Os Padres, ao findar a leitura do precioso documento, exclamam: Esta sentença é justa. Glória ao novo Paulo, Celestino, Glória a Celestino, guarda da Fé!…

Lá fora, comprime-se a massa enorme dos fiéis que, ao ouvirem a boa nova da condenação do heresiarca. Nestório, irrompem em aclamações de alegria. Os Bispos, saudados delirantemente, são levados, em triunfo, aos ombros dos fiéis, à luz de archotes. Cristo vencera a heresia, Maria, a doce Mãe de Jesus, triunfara de Nestório. De todos os corações, saía este grito unânime, em tom de saudação e de súplica: Santa Maria Mãe de Deus…

***

Eis, a leves traços, o acontecimento que, há mil e quinhentos anos, encheu de alegria a cristandade inteira e se repercutiu pelos séculos em fóra, cujo Centenário é, para todos os cristãos, um motivo de renascimento espiritual pela devoção a Nossa Senhora, sobretudo para nós, que somos o seu povo predileto.

Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume II, 1935.

Última atualização do artigo em 21 de março de 2025 por Arsenal Católico

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