Senhor, preservai-me de julgar e de criticar o próximo e dai-me pensamentos de bondade e de amor para com todos.
1 – “Não julgueis para que não sejais julgados” (Mt. 7, 1). A caridade para com o próximo começa pelo pensamento; muitas faltas de caridade têm as suas raízes nos nossos juízos. Não estimamos bastante os outros, não temos na devida conta as suas boas qualidades, não somos benévolos ao interpretar o seu procedimento. Porquê? Porque julgamos quase sempre o próximo baseando-nos nos seus defeitos e sobretudo nos que irritam a nossa sensibilidade, que chocam a nossa maneira de ver e agir, ao passo que pouco ou nenhum valor damos às suas boas qualidades.
É um erro julgar as pessoas e as coisas sob um ponto de vista negativo, e também é lógico, porque o que é negativo existe somente como carência de algo de positivo, de algo de bom, como o rasgão dum vestido só existe enquanto existe esse vestido. Quando nos detemos a criticar o lado negativo duma pessoa ou dum ambiente, fazemos uma obra destruidora: destruidora para a nossa virtude pessoal e para o bem do próximo. Pelo contrário, para fazer uma obra construtiva, é preciso ultrapassar os defeitos e saber valorizar as qualidades e o lado bom que nunca faltam em pessoa alguma.
E não teremos também nós muitos defeitos, porventura mais graves que os do próximo? “Porque vês tua a aresta do olho do teu irmão e não vês a trave no teu olho?” (Mt. 7, 3). Meditemos seriamente nestas palavras de Jesus porque, infelizmente, apesar de querermos ser santos, não é raro que no nosso coração se esconda ainda alguma coisa deste detestável espírito crítico, desta dupla medida para considerar os defeitos próprios e os alheios. Que progresso faríamos na caridade fraterna e na aquisição da perfeição pessoal se, perante os defeitos alheios, em vez de os criticarmos, examinássemos a nossa consciência para ver se não haverá em nós algo de semelhante ou até pior, e nos aplicássemos a corrigir-nos! Sta Teresa de Jesus dizia às suas monjas: “Quando virdes nalguma Irmã algum falta… procurai vós praticar com grande perfeição a virtude oposta à falta que descobristes na outra” (Cam. 7, 7); este é um dos melhores meios para ajudar os outros a corrigirem-se.
2 – O juízo é um ato reservado só a Deus, porque só Deus vê o íntimo do coração, porque só Deus conhece as intenções e os motivos que nos impelem a agir: “o homem vê o que está patente, mas o Senhor olha para o coração” (I Re. 16, 7). Por isso aquele que julga – a menos que esteja obrigado por ofício, como são os superiores – usurpa em certo sentido um direito de Deus, põe-se no lugar de Deus. Arvorar-se em juiz dos próprios irmãos supõe sempre uma atitude orgulhosa para com Deus e para com o próximo. Além disso, julgando com facilidade os outros, expomo-nos a cometer grandes erros porque, desconhecendo as intenções alheias, faltam-nos os elementos suficientes para formarmos um juízo reto.
Evidentemente, diante de uma ação condenável em si mesma, não somos obrigados a julgá-las boa; todavia devemos desculpar a intenção de quem a pratica, não a atribuindo precipitadamente a má vontade. “Se as ações do próximo tivessem cem caras, deveríamos olhar sempre para a melhor; e se, enfim, a ação é censurável, desculpemos ao menos a intenção” (T.M. Sp. pg. 413).
De fato, também eu cometo todos os dias muitas faltas e caio muitas vezes, mas isto não significa que tudo provenha de má vontade. Frequentemente são faltas que me escapam por inadvertência, por fragilidade, e o Senhor, contanto que eu deteste estas fraquezas, continua a amar-me e quer que eu tenha plena confiança no Seu amor. Como é para mim, assim é para os outros; por isso não tenho direito algum de duvidar da boa vontade do próximo só porque o vejo cometer faltas, nem tão pouco tenho o direito de, por este motivo, diminuir a minha benevolência e a minha estima para com ele. Talvez essa pessoa que eu tanto censuro já tenha detestado e chorado no seu coração os seus defeitos mais do que eu os meus e o Senhor lhe tenha já perdoado e continue a amá-la. Quererei eu ser mais severo que o Senhor? este caso ser-me-á útil recordar que a severidade que eu usar para com o próximo também Deus a usará comigo, pois Jesus disse: “Segundo o juízo com que julgardes, sereis julgados, e com a medida com que tiverdes medido, vos medirão também a vós” (Mt. 7, 2).
Colóquio – “Quem me julga sois vós, ó Jesus! E para me tornar favorável este julgamento, ou antes, a fim de nem sequer ser julgada, quero ter sempre pensamentos caridosos, pois Vós dissestes: ‘Não julgueis e não sereis julgados’. Por isso quando me suceder ver uma irmã praticar uma ação que me parece imperfeita, procurarei imediatamente desculpá-la e atribuir-lhe as boas intenções que com certeza tem.
“Ó Jesus, fazeis-me compreender que a principal indulgência plenária é aquela que todos podem ganhar sem as condições habituais: é a indulgência da caridade que cobre a multidão dos pecados” (cfr. T.M.J. M.C. pg. 271, 298; CL.).
“Ensinai-me, ó Senhor, a não julgar o próximo por qualquer falta que o veja cometer; e se o vir pecar, dai-me graça para desculpar a sua intenção que está oculta e não se pode ver. Mas ainda que eu veja que a intenção foi abertamente má, dai-me a graça de desculpar o próximo, atribuindo tudo a tentação, da qual nenhum mortal está livre” (Sta M. Madalena de Pazzi).
“Ó Senhor, ajudai-me a não considerar no próximo senão as suas virtudes e boas obras e a encobrir os seus defeitos com os meus grandes pecados. Deste modo levar-me-eis pouco a pouco a ganhar uma virtude sólida a ponto de considerar todos melhores do que eu. mas para isto é necessário o Vosso favor, sem ele são inúteis as minhas diligências. Suplico-Vos, portanto, que me concedais esta virtude” (cfr. T.J. Vi. 13, 10).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.
Última atualização do artigo em 24 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico