Nascimento de São João Batista

Francesco Trevisani, João Batista batizando Cristo, 1723, Galeria de Arte de Leeds, Public Domain - Wikimedia Commons

São poucos os Santos de que a Igreja comemora o nascimento. As festas dos Santos são geralmente o aniversário da sua morte, isto é, da sua despedida do mundo e de seu nascimento para a vida eterna. 

São João Batista faz exceção desta regra pelo motivo de ter vindo ao mundo em estado de santidade, isento da lei do pecado original. Seu nascimento foi um acontecimento extraordinário, acompanhado de fatos igualmente extraordinários, como o relatam os Santos Evangelhos. A narração bíblica do nascimento do Precursor de Jesus Cristo, feita sob a inspiração do divino Espírito Santo, é tão clara e circunstanciada que não há mister acrescentar coisa alguma.

Em Hebron, nas montanhas da Judéia, oito milhas além de Jerusalém, vivia um casal – Zacarias e Isabel. Ambos eram justos diante do Senhor. Não tinham filhos, o que muito os afligia e eram já idosos. Zacarias, que era sacerdote, um dia em que estava ocupado nas suas funções, no templo de Jerusalém, entrou no santuário para acender o incenso, enquanto o povo orava no adro. Apareceu-lhe, então, à direita do altar dos perfumes, um anjo. Zacarias ficou atônito. O anjo, porém, disse-lhe: “Não temas, Zacarias, porque Deus ouviu tua oração. Tua mulher te dará um filho a quem darás o nome de João. Grande será tua alegria e muitos regozijar-se­ aqui pelo seu nascimento, porque ele será grande diante do Senhor. Não beberá vinho nem bebida alguma fermentada, e será cheio do Espírito Santo. Reconduzirá os filhos de Israel em grande número para seu Deus. Ele próprio o precederá em espírito e com o poder de Elias, afim de preparar ao Senhor um povo perfeito.”

Zacarias disse ao anjo: “Como saberei com certeza que isto vai se dar? Já estou velho e minha mulher já vai adiantada em anos.” Respondeu-lhe o anjo: “Eu sou Gabriel e, meu lugar é diante de Deus. Ele é que me manda trazer-te está feliz nova. Porém, como não deste crédito a estas minhas palavras, ficarás mudo até o dia em que tudo isso se cumprir.” Fóra, o povo se admirava da longa demora que Zacarias levava no santuário. Afinal saiu, porém, sem poder falar. Por sinais deu a compreender que tivera uma visão. Acabando os dias do seu serviço, foi-se para sua casa.

Tudo que o anjo predissera se cumpriu ao pé da letra. Seis meses depois o mesmo anjo Gabriel foi mandado por Deus à cidade da Galileia, chamada Nazaré, à Maria Santíssima para comunicar-lhe que tinha sido escolhida para ser Mãe do Salvador. Disse-lhe também que sua prima Isabel, apesar de idosa e estéril, tinha concebido um filho, por sinal que a Deus nada era impossível. Maravilhada pelos acontecimentos tão extraordinários, cheia ele gratidão a Deus, que coisas tão maravilhosas operara, Maria pôs-se a caminho e pressurosa foi à casa de sua prima. Esta, ouvindo à voz de Maria, ficou cheia do Espí­rito Santo e exclamando, disse: “Bendita sois entre as mulheres e bendito é o fruto de vosso ventre! Donde me vem a felicidade de ser visitada pela mãe do meu Senhor! Logo que chegou aos meus ouvidos a voz da vossa saudação, o menino saltou de prazer no meu ventre! Bem-aventurada sois por terdes crido! Pois tudo que vos foi dito da parte do Senhor se realizará.”

É opinião unânime dos santos Padres que os sinais de prazer que João deu antes do seu nascimento, foram causados pelo fato de o Precursor, por uma graça especial de Deus, ter conhecido a presença do seu Senhor e lhe prestado homenagem de adoração. Dizem eles mais, que no mesmo momento teria João sido santificado como o anjo prometera.

Chegado o tempo, Izabel deu à luz um filho. Sabendo seus vizinhos e parentes desse grande favor que lhe fizera Deus, correram todos jubilosos para felicita-la.

No oitavo dia reuniram-se para a circuncisão da crença e propuseram que se chamasse Zacarias, nome de seu pai. A mãe, porem se opôs e disse: “Não, ele deve chamar-se João.” Disseram-lhe: “Mas, na tua família não há pessoa desse nome.” lzabel, porém, insistiu que ao menino fosse dado o nome de João. Então fizeram sinal ao pai, para que manifestasse a sua opinião. Zacarias pediu uma tabuinha para escrever e escreveu: “João é seu nome.” Ficaram todos admirados. No mesmo instante abriu a boca, desatou-se lhe a língua e Zacarias falou, bem-dizendo a Deus. Cheio do Espírito Santo, entoou um dos cantos mais belos que a liturgia conhece, e que faz parte do ofício que os sacerdotes da Igreja dia por dia oferecem a Deus “Bendito seja o Senhor de Israel, porque visitou seu povo e o resgatou. Suscitou um salvador poderoso na casa de seu servo David, como tinha prometido por boca dos seus profetas…” E dirigindo-se ao seu filhinho, disse: “E tu, ó menino, tu serás chamado profeta do Altíssimo, porque irás ante a face do Senhor preparar os seus caminhos…”

Tendo ciência desses acontecimentos, toda a região vizinha teve medo e por toda a parte, nas montanhas e nos vales da Judéia, contavam-se estas maravilhas, e cada qual dizia: “Que será um dia deste menino?” De fato, a mão do Senhor estava com ele.

Alguns dos Santos Padres são de opinião, que lzabel procurou com seu filhinho o deserto, para salvá-lo da perseguição e crueldade de Herodes. Outros dizem, que João, tendo apenas cinco anos, levado pelo Espírito Santo, foi para o deserto, com o intuito de se santificar ainda mais e se preparar para sua alta missão, que Deus lhe dera. Os santos Evangelhos dizem-nos alguma coisa sobre a vida de S. João no deserto. Trajava veste de pele de camelo, cingidos os rins com cintura de couro, e alimentava-se de gafanhotos e mel silvestre. Sua vida era uma vida de ora­ção e de penitência. Diz Santo Agostinho, que em S. João o mundo pela vez primeira viu o exemplo mais tarde imitado pelos tantos eremitas. “Que saíste a ver ao deserto? perguntou Jesus Cristo às turbas. Uma cana agitada pelo vento? Mas, que saístes a ver? Um homem regaladamente vestido? Eis os que se vestem com regalo, estão nos palácios dos reis. Mas, que saístes a ver? Um profeta? Sim, vos digo, mais que profeta. Porque este é aquele do qual está escrito: Eis que eu envio meu anjo adiante de ti, que preparará teu caminho. E eu vós declaro: Que entre os nascidos de mulher, não há maior profeta que João Baptista.” Estas palavras do divino mestre contém o maior elogio, que homem jamais recebeu, e são equivalentes a uma formal canonização, a única que o Filho de Deus em vida pronunciou.

Tendo trinta anos de idade, recebeu S. João ordem divina para sair do deserto e incetar sua missão que era a de preparar os caminhos ao Messias. João Batista percorreu toda a região do Jordão pregando o batismo da penitência para a remissão dos pecados. Vieram então de Jerusalém e de toda parte da Judéia grandes turbas. Todos se faziam batizar por ele no Jordão, confessando seus pecados.

Os santos Evangelhos contam detalhadamente que ele pregou, que conselhos deu às pessoas que o procuravam, entre estas aos soldados; falam da grande graça, que teve de receber a visita de Nosso Senhor, que quis por ele ser batizado e que naquela ocasião teve a visão do Espírito Santo que desceu visivelmente, pairou sobre Jesus Cristo e ao mesmo tempo do céu uma voz dizia: “Este é meu Filho muito amado, em quem pus minha complacência.” Lemos ainda, com que amor e dedicação trabalhou pelo advento do reino de Deus, dando testemunho de Jesus Cristo. “Eu batizo na água para a penitência; mas, vem outro, que é mais poderoso que eu, e de quem não sou digno de desatar as correias de suas sandalhas; ele, batizar-vos-á no Espírito Santo e no fogo. Ele tem a joeira na mão e vai limpar sua eira. Ajuntará o trigo no seu celeiro, e queimará a palha no fogo, que não se apaga nunca! Em certa ocasião, os Judeus de Jerusa­lém mandaram a tratar com João uma comissão composta de sacerdotes e de levitas, e lhe perguntaram: Quem sois vós? Porque batizais, se não sois nem o Cristo, nem Elias, nem o Profeta? João respondeu-lhes: “Eu batizo em água; mas, há em meio de vós alguém que não conheceis. É ele que deve vir depois de mim, e eu não sou digno de desligar os cadarços de suas sandálias.

No dia seguinte, diz o evangelista, João via aproximar-se Jesus e disse: “Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.” Com estas palavras foi apresentado ao mundo o Messias como o tinha profetizado Isaías.

O que mais aconteceu ao glorioso Precursor até sua morte do martírio, o leitor encontrará no capitulo da degolação de S. João Batista . (29 de Agosto.)

REFLEXÕES

Que nestas reflexões encontrem consolo e edificação as senhoras casadas, a que como a Santa Izabel, Deus faz sofrer as tristezas da esterilidade. Elas não devem esquecer-se das angústias do parto, que não raras vezes equi­valem uma verdadeira agonia e da série infinita de trabalhos, de cuidados e preocupações que acompanham infalivelmente a educação das filhos. Ninguém prevê o futuro; mas se pudéssemos ter ciência do rumo que a vida dos homens vai tomar, quantas senhoras não desejariam hoje nunca ter tido filhos! Filhos pequenos, pequenos cuidados; filhos crescidos, cuidados dobrados! Quantos filhos, cujo advento era a prece constante, o desejo mais ardoroso dos pais, não corresponderam com as esperanças que neles se colocara, e longe de serem a honra dos seus progenitores, vieram a ser sua vergonha, sua humilhação, sua desgraça.

É mais que justificado o desejo da bênção da maternidade. A criança é muitas vezes o anjo pacificador do lar; mas exemplos não faltam, e estes não são poucos, que constatam o contrário.

Não é sem propósito de enxergar na ausência da prole um castigo de Deus, não talvez de pecados cometidos pela inconsolável esposa, mas antes de irregularidades e extravagâncias de que o esposo fez preceder seu estado de matrimônio e delas não se querendo lembrar, pretende inculpar sua pobre companheira, fazendo-a sofrer injustamente, quando ele mesmo se devia humilhar na presença de Deus e pedir sua misericórdia.

Qualquer que seja o motivo que determine a ausência de filhos, o casal se conforme com este estado de coisas, quando não se lhes depara outro remédio. Em nenhum, porém, se prevaleçam desta circunstância para transgredir as santas leis do matrimônio e se onerar do crime do adultério.

Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume I, 1928.

Última atualização do artigo em 16 de fevereiro de 2025 por Arsenal Católico

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