O amor é a plenitude da lei (Rom. XIII, 10).
A bem-aventurança celeste a que todos fomos destinados consiste na posse e no gozo de Deus, pelo conhecimento e pelo amor. Quanto mais crescermos nesta vida no amor de Deus, tanto maior será a nossa felicidade na outra.
Todo o nosso esforço para conseguirmos a santidade, deve pois consistir em amar sempre a Deus. As outras virtudes, a humildade, a abnegação, a paciência, a misericórdia e a pureza são apenas servas do amor.
A plenitude da lei é o amor (1): quer dizer, quem ama verdadeiramente a Deus, cumpre em tudo a Sua santíssima vontade: e quanto maior for o amor, tanto mais perfeito será o cumprimento da lei.
Admirável correlação! O amor de Deus é o incentivo da santidade, e esta por sua vez aumenta em nós o amor.
Foi o próprio Deus que nos deu a medida do amor que lhe devemos ter, quando disse: Amarás ao Senhor, teu Deus, com toda a tua alma, com todo o teu coração, com todas as tuas forças (2).
Oh meu Deus! dignai-Vos explicar-me o sentido destas palavras.
Minha filha, estas palavras não são mais do que a expressão daquelas outras: Ama a Deus sobre todas as coisas, e ama-O quanto puderes “sobre todas as coisas”, isto é, com toda a tua alma e com todas as tuas forças. Tudo o que és, e tudo o que tens deve servir para o amor de Deus, porque todas as energias do corpo, e todas as potências da alma se hão de dirigir para este fim, consagra-se a Ele.
Deves amar-me com toda a tua alma. O teu pensamento há de se levantar até mim e penetrar cada vez mais intimamente nas minhas perfeições.
A tua memória deve-se lembrar dos grandes benefícios que de mim recebeste e estás continuamente recebendo.
Assenta e estabelece princípios, fundados no meu amor, duma solidez que resista ao embate dos princípios pestilentos do mundo.
Grava cada vez mais profundamente na tua alma a minha imagem, a imagem do Homem-Deus, do teu Salvador, e tem-na sempre, mas particularmente nos anos da juventude, diante dos olhos do teu espírito, afim de que as portas do teu coração se conservem fechadas às impressões frequentemente tão vivas enérgicas do mundo corrompido.
Amar-me-ás com todo o teu coração. A tua vontade há de acompanhar o teu entendimento. Repete com frequência: Que tenho eu no céu, e fora de Vós que posso desejar sobre a terra, ó meu Sumo bem! (3) Como hei de eu querer alguma coisa fora de Vós, se de Vós procede tudo o que há de bom nas criaturas, as quais só por Vosso amor devem ser amadas?
Hás de amar-me com toda a tua alma. Deves referir a mim todos os teus afetos e deves unir-te a mim com todas as tuas potências.
Hás de amar-me com todas as tuas forças. És composta de corpo e alma: ambos são obra minha; ambos têm em mim o seu fim. Por isso o corpo há de ajudar a alma a servir-me e glorificar-me. Hão de me ser consagrados os seus sentidos, membros e forças, assim como a saúde e a vida: numa palavra o teu corpo ou pelo trabalho ou pelo sofrimento deve ser continuamente uma vítima consagrada ao meu amor.
Deste modo, amar-me-ás com toda a tua alma, com todo o teu coração, com todas as tuas forças.
Oh meu Deus! quão pouco generosa fui até agora conVosco? Estou envergonhada e confundida na Vossa presença, à vista da minha cegueira e loucura! Volto para as criaturas este coração que inteiramente Vos pertence a Vós, e que so a Vós devia ser consagrado! E terá aumentado por isso a minha riqueza e felicidade? Longe disso. Sinto no meu coração um vácuo cada vez maior, e uma solidão cada vez mais profunda.
Meu Deus, não será assim para o futuro! Ensinai-me a amar-Vos como mereceis, com um amor cada vez mais puro, afim de que não venha longe o dia venturoso em que estejais na posse completa do meu amor, e em que o Vosso divino Espírito imprima em mim o testemunho feliz de que estais satisfeito comigo e de que eu sou Vossa filha (4).
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) Rom. XIII, 10.
(2) luc. X, 27.
(3) Salm. LXXII, 25.
(4) Rom. VIII, 16.
Última atualização do artigo em 6 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico