Concedei-me, ó Jesus, a graça de penetrar na imensidade daquele amor que Vos levou a dar-nos a Eucaristia.
1 – “tendo Jesus amado os Seus… amou-os até ao fim” (Jo. 13, 1-15) e na últimas horas passadas entre os Seus quis dar-lhes a prova máxima do Seu amor. Foram horas de doce intimidade, mas também de penosíssima angústias: Judas já tinha combinado o preço da venda infame; Pedro vai negá-lO, todos O abandonarão dentro de breves instantes. A instituição da Eucaristia aparece assim como a resposta de Jesus à traição dos homens, como o dom máximo do Seu amor infinito em troca da máxima ingratidão: é o Deus misericordioso que persegue a criatura rebelde, não com ameaças, mas com as mais delicadas invenções da Sua imensa caridade. Jesus já tinha feito e sofrido tanto pelo homem pecador e eis que no momento em que a malícia humana vai atingir o fundo do abismo, Ele, esgotando os recursos do Seu amor, oferece-Se ao homem não só como Redentor, que morrerá por ele na cruz, mas também como alimento que o nutrirá com a Sua Carne e com o Seu Sangue. Ainda que a morte, dentro de poucas horas, O arrebate da terra, a Eucaristia perpetuará a Sua presença viva e real até à consumação dos tempos. “Ó louco de amor pelas criaturas! – exclama Sta Catarina de Sena – tudo quanto tendes de Deus e tudo quanto tendes de homem no-lo deixastes em alimento para que, enquanto somos peregrinos nesta vida, não desfaleçamos de fadiga, mas sejamos fortificados por vós, ó alimento celestial”.
A Missa de hoje é, um modo muito particular, a comemoração e a renovação da última Ceia, na qual todos somos chamados a participar. Entremos na Igreja e coloquemo-nos em torno do Altar, como se entrássemos no cenáculo e estivéssemos reunidos à volta de Jesus. Aqui, como os Apóstolos em Jerusalém, encontramos o Mestre vivo no meio de nós e Ele próprio, na pessoa do Seu ministro, renovará mais uma vez o grande milagre que muda o pão e o vinho no Seu Corpo e no Seu Sangue, dizendo-nos depois: “Tomai e comei… tomai e bebei”.
Pensemos que foi o próprio Jesus que cuidou dos preparativos para a última ceia e para isso quis escolher “uma grande sala” (Lc. 22, 12), encarregando os Apóstolos de a adornarem convenientemente. Também o nosso coração tem de ser “grande” cenáculo, tornado espaçoso e dilatado pelo amor, para que Jesus nele possa celebrar dignamente a Sua Páscoa.
2 – Na última Ceia Jesus deixa-nos, juntamente com o Sacramento do amor, o testamento do amor. Testamento vivo e concreto do Seu admirável exemplo de humildade e caridade, no lava-pés, testamento oral no anúncio do Seu “mandamento novo”. O Evangelho da Missa de hoje apresenta-nos Jesus lavando os pés aos Apóstolos e termina com estas palavras: “Dei-vos o exemplo para que, como vos fiz, assim façais vós também”.
É um convite urgente à caridade fraterna, que deve ser o fruto da nossa união com Jesus, o fruto da nossa Comunhão eucarística. Ele disse expressamente na última Ceia: “Dou-vos um mandamento novo: que assim como eu vos amei, vos ameis também uns aos outros” (Jo. 13, 34). Se não podemos imitar o amor de Jesus até dar o nosso corpo em alimento aos irmãos, podemos imitá-lo dando-lhes a nossa assistência amorosa, não só nas coisas fáceis, mas também nas difíceis e repugnantes. O Mestre, lavando os pés aos Seus Apóstolos, ensina-nos até onde devemos baixar-nos para prestar serviço ao nosso próximo, mesmo o mais humilde e desprezível.
O Mestre que, com contínuos testemunhos de amor, vai ao encontro dos homens ingratos e dos Seus traidores, ensina-nos que a nossa caridade não é semelhante à Sua, se nãos abemos pagar o mal com o bem, se não sabemos perdoar tudo, chegando a fazer bem a quem nos faz mal. Dando a vida pela salvação dos Seus, o Mestre diz-nos que o nosso amor é perfeito se não sabemos sacrificar-nos generosamente pelos outros. O Seu “mandamento novo” que propõe o amor de Jesus como medida do nosso amor fraterno, abre vastos horizontes ao exercício da caridade. Trata-se de uma caridade que não tem limites. Se há um limite, é o de dar, como o Mestre, a vida pelos outros, porque “ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos” (Jo. 15, 13).
Jesus inculca-nos a perfeição da caridade fraterna na própria noite em que institui a Eucaristia porque quer ensinar-nos que a perfeição da caridade deve ser, ao mesmo tempo, o fruto do sacramento eucarístico e a nossa resposta a este imenso dom.
Colóquio – “Ó Senhor, Senhor! A casa da minha alma é pequena e estreita para que venhais a ela: alargai-a Vós. Está em ruínas: restaurai-a Vós. Há nela coisas que ofendem os Vossos olhos: sei-o e confesso-o. Mas quem poderá limpá-la? A quem senão a Vós poderei dizer: limpai-me, Senhor, dos pecados ocultos?” (Sto Agostinho).
“Ó bom Jesus, para nos dardes ânimo e nos exercitardes no amor, Vos determinastes a ficar conosco, embora prevísseis a sorte que teríeis entre os homens, as desonras e ultrajes que deveríeis sofrer. Ó eterno Pai, como quisestes consentir que o Vosso Filho ficasse entre nós a padecer de novo cada dia? Valha-me Deus, que grande amor o do Filho e que grande amor o do Pai!
“Ó Eterno Pai, como quereis ver cada dia o Vosso Filho em tão ruins mãos? Como pode a Vossa piedade cada dia – sim, digo cada dia – ver as injúrias que Lhe fazem? E quantas não se fazem hoje a este Santíssimo Sacramento! Em quantas mãos inimigas não O haveis de ver!
“Ó Pai Eterno, olhai que não são para olvidar tantos açoites e injúrias e tão gravíssimos tormentos que o Vosso Filho sofreu durante a Sua vida terrena. Será preciso que faça ainda mais para Vos contentar? Não fez Ele já tudo? Não tinha Ele já pago bastante pelo pecado de Adão?
“Ó Pai Santo que estais nos céus, se o Vosso Filho não deixou de nos dar a nós, pobres pecadores, um dom tão grande como a Santíssima Eucaristia, não permitais, ó misericordiosíssimo Senhor que seja tão mal tratado! Ele deixou-Se ficar entre nós de um modo tão admirável que podemos oferecê-lO em sacrifício quantas vezes quisermos. Então que este augustíssimo sacrifício faça parar a maré dos pecados e desacatos que se cometem nos lugares onde este Ssmo Sacramento reside”. (cfr. T.J. Cam. 33, 2 e 3; 3, 8; 35, 3).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.