O Liberalismo é Pecado – 17. Vários modos por que, sem ser liberal, um católico pode não obstante tornar-se cúmplice do Liberalismo

O Liberalismo é pecado

LIBERALISMO É PECADO

D. Félix Sardà y Salvany

17. VÁRIOS MODOS POR QUE, SEM SER LIBERAL, UM CATÓLICO PODE NÃO OBSTANTE TORNAR-SE CÚMPLICE DO LIBERALISMO

Há vários modos pelos quais um católico, sem ser precisamente liberal, pode tornar-se cúmplice do Liberalismo. E é este um ponto mais prático ainda que o anterior e acerca do qual deve estar muito ilustrada e prevenida a consciência do fiel cristão nestes tempos.

É certo que há pecados, de que nos tornamos réus, digamos assim, não por verdadeira e direta comissão dos mesmos senão por cumplicidade ou convivência com seus autores, sendo de tal natureza esta cumplicidade que chega muitas vezes a igualar em gravidade a ação pecaminosa diretamente cometida. Pode, pois, e deve aplicar-se ao pecado do Liberalismo quanto sobre este ponto da cumplicidade ensinam os tratadistas de Teologia moral.

O nosso objeto não é outro que deixar apontados aqui brevemente os principais modos pelos quais acerca do Liberalismo se costuma contrair hoje em dia esta cumplicidade.

1.º Filiando-se formalmente num partido liberal. É a cumplicidade maior que pode dar-nos nesta matéria, e mal se distingue da ação direta a que se refere. Muitos há que, em seu claro juízo, veem toda a falsidade da doutrina do Liberalismo e conhecem seus sinistros propósitos e abominam sua detestável história. Mas, por tradição de família, ou por hereditários rancores, ou por esperanças de vantagens pessoais, ou por considerações a favores recebidos, ou por temor de danos que lhes possam sobrevir, ou por qualquer outra coisa, aceitam um posto no partido que sustenta tais doutrinas e abriga tais propósitos, e permitem os contem publicamente entre seus adeptos, honrando-se com o seu apelido e trabalhando debaixo da sua bandeira. Estes infelizes são os primeiros cúmplices, os grandes cúmplices de todas as iniquidades do seu partido; e também, sem conhecê-las minuciosamente, são verdadeiros coautores delas se participam de sua imensa responsabilidade. Assim, temos visto em nossa pátria homens muito de bem, excelentes pais de família, honrados comerciantes ou artistas, figurar em partidos que têm em seu programa usurpações e rapinas, que nenhuma honradez humana pode justificar. São, pois, responsáveis diante de Deus por estes atentados, como o tal partido que os cometeu, sempre que esse partido os considere não como fato acidental, mas como lógico procedimento seu. A honradez de tais sujeitos só serve para tornar mais grave esta cumplicidade; porque é claro que, se um partido mau se não compusera senão de malvados, não haveria grande motivo para temê-lo. O horrível é o prestígio que a um partido mau dão as pessoas relativamente boas, que o honram e recomendam, figurando em suas fileiras.

2.º Da mesma forma, sem estarem formalmente filiados num partido liberal, antes fazendo protestação pública de não pertencer a ele, contraem também cumplicidade liberal os que manifestam por ele simpatias públicas, elogiando seus personagens, defendendo ou desculpando seus periódicos, tomando parte em seus festejos. A razão é evidente. O homem, sobretudo, se vale alguma coisa por seus talentos ou posição, faz muito em favor de qualquer ideia só com mostrar-se em relações mais ou menos benévolas com seus fautores. Dá mais com o obséquio de seu prestígio pessoal do que se desse dinheiro, armas ou qualquer outro auxílio material. Assim, por exemplo, honrar um católico, sobretudo se é sacerdote, um periódico liberal com a sua colaboração, é manifestamente favorecê-lo com o prestígio da sua firma, ainda que com ela se não defenda a parte má do periódico, ainda que discorde nesta parte má. Dir-se-á talvez que com escrever ali se logra fazer ouvir a voz do bem por muitos que em outro periódico a não escutariam. É verdade, porém também a firma do homem bom serve ali para abonar tal periódico à vista dos leitores pouco hábeis em distinguir as doutrinas de um redator das do seu vizinho: e assim, o que se pretendia fosse contrapeso ou compensação do mal, se converte para a generalidade em efetiva recomendação dele. Mil vezes o tenho ouvido: “É mau tal periódico? Pois não escreve nele F…?” Assim discorre o vulgo, e vulgo somos quase a totalidade do gênero humano. Por desgraça é frequentíssima em nossos dias esta cumplicidade.

3.º Comete-se verdadeira cumplicidade votando candidatos liberais, ainda que não se votem por serem tais, mas pelas opiniões econômicas ou administrativas, etc., daquele deputado. Por mais que numa questão destas possa tal deputado estar conforme com o catolicismo, é evidente que nas outras questões há de falar e votar segundo o critério herético, e tornar-se-á cúmplice de suas heresias o que o colocou na posição de escandalizar com elas o país.

4.º É cumplicidade subscrever para o periódico liberal, ou recomendá-lo no periódico são pelo falso pretexto de camaradagem, ou lamentar por motivos análogos de falsa cortesia seu desaparecimento ou suspensão. Ser assinante de um periódico liberal é dar dinheiro para fomentar o Liberalismo; mais ainda, é ocasionar que outro incauto se decida a lê-lo, vendo que vós o assinais; é além disto propinar à família e aos amigos da casa uma leitura mais ou menos envenenada. Quantos periódicos maus deveram desistir da sua ruim e maléfica propaganda se os não apoiassem certos assinantes simplórios! O mesmo diremos da frase de gaveta entre os periodiquistas: nosso estimado colega, ou esta outra de desejar-lhe bom número de assinaturas, ou a mais comum – sentimos a perda do nosso colega, tratando-se do aparecimento ou desaparecimento de um periódico liberal. Não deve haver estes compadrios entre soldados de tão oposta bandeira, como são a de Deus e a de Satanás. Ao cessar ou ser suspendido um periódico destes devem dar-se graças a Deus por ter Sua Divina Majestade um inimigo de menos; ao anunciar-se sua aparição deve, não saudar-se, mas lamentá-la como uma calamidade.

5.º É cumplicidade administrar, imprimir, vender, distribuir, anunciar ou subvencionar tais periódicos ou livros ainda que seja fazendo-o ao mesmo tempo, com os bons, por mera profissão industrial ou como meio material de ganhar o sustento diário.

6.º É cumplicidade dos pais de família, diretores espirituais, donos de estabelecimentos, catedráticos e mestres calar quando são perguntados sobre estas coisas; ou simplesmente não as explicar quando tem obrigação, para ilustrar as consciências de seus subordinados.

7.º É cumplicidade às vezes ocultar a convicção própria boa, dando lugar à suspeita de a ter má. Não se esqueça que há mil ocasiões em que é obrigação do cristão dar publico testemunho da verdade, mesmo sem ser formalmente exigido.

8.º É cumplicidade comprar propriedades sagradas ou de beneficência, sem o beneplácito da Igreja, ainda que as ponha em hasta pública a lei da desamortização, a não ser que se comprem para as restituir a seu legítimo dono. É cumplicidade remir foros eclesiásticos sem permissão do verdadeiro senhor deles, ainda que se apresente muito lucrativa a operação. É cumplicidade intervir como agente em tais compras e vendas, publicar os anúncios de vendas públicas, praticar corretagens. Todos estes atos trazem além disto consigo a obrigação de restituir na proporção do que com eles se contribuiu para a iniqua espoliação.

9.º É de algum modo cumplicidade prestar a própria casa para atos liberais, ou alugá-la para eles, como por exemplo cassinos patrióticos, escolas leigas, clubes, redações de periódicos liberais, etc.

10.º É cumplicidade celebrar festas cívicas ou religiosas por atos notoriamente liberais ou revolucionários; assistir voluntariamente às ditas festas; celebrar exéquias patrióticas, que têm mais de significação revolucionaria que de sufrágios cristãos; pronunciar discursos fúnebres em elogio de defuntos notoriamente liberais; adornar com coroas e fitas os seus sepulcros, etc., etc. Quantos incautos hão fraquejados em sua fé por estas causas!

Fazemos estas indicações compreendendo só o mais geral nesta matéria. A cumplicidade pode ser de variedade infinita, como os atos da vida do homem, que por infinitos são inclassificáveis. Grave é a doutrina que em alguns pontos temos assentado; porém, se é certa a Teologia moral aplicada a outros erros e crimes, sê-lo-á menos com respeito ao que nos ocupa nesta ocasião?

O Liberalismo é Pecado – Pe. Félix Sardá y Salvany, 1949.

Última atualização do artigo em 1 de dezembro de 2024 por Arsenal Católico

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