Ó Jesus obedientíssimo, fazei-me compreender o valor da obediência.
1 – “O Senhor – ensina S. João da Cruz – prefere de ti o menor grau de obediência e sujeição a todos esses serviços que pensas fazer-Lhe” (A.M. I, 13). Porque? Porque a obediência te faz renunciar à tua vontade para aderir à de Deus, expressa nas ordens dos superiores, e é precisamente na completa conformidade da tua vontade com a vontade divina que consiste a perfeição da caridade, que consiste a essência da união com Deus. A caridade será perfeita em ti quando em todas as tuas ações te regulares, não segundo as tuas inclinações e desejos pessoais, mas segundo a vontade de Deus, com a qual deves conformar a tua. Este é o estado de união com Deus, pois a alma “que totalmente tem a vontade conforme e semelhante à divina, totalmente está unida e transformada m Deus” (J.C.S. II, 5, 4).
Podes encontrar a vontade de Deus expressa nos Seus mandamentos, nos preceitos da Igreja, nos deveres do teu estado; além disso fica-te ainda um vasto campo de ação em que podes escolher livremente; todavia nem sempre te será fácil conhecer, com certeza, o que Deus quer de ti. Pelo contrário, através da voz da obediência, a vontade divina toma uma forma clara, precisa, manifesta-se abertamente, não havendo já perigo de errar. Com efeito, “não há poder que não venha de Deus” (Rom. 13, 1); portanto, obedecendo aos teus legítimos superiores, podes estar certo de obedecer a Deus. O próprio Jesus, ao confiar aos Seus discípulos a missão de evangelizar todas as gentes, disse: “o que vos ouve, a mim ouve e o que vos despreza, a mim despreza” (Lc. 10, 16); ensina-nos assim que os superiores eclesiásticos O representam e nos falam em Seu nome. De resto, S. Tomás demonstra que em toda a autoridade legítima – ainda que seja de ordem natural, por exemplo, de ordem civil ou social – existe uma manifestação da vontade divina, desde que ordene dentro dos justos limites do seu poder. Neste sentido o apóstolo não hesita em dizer: “servos, obedecei aos vossos senhores… como a Cristo… fazendo de coração a vontade de Deus” (Ef. 6, 5 e 6).
2 – Um dos maiores obstáculos para a plena conformidade da tua vontade com a de Deus, é o apego ao teu querer, aos teus desejos, às tuas inclinações. Ora, a obediência, pedindo-te que te regules pelo querer de outrem, é o melhor exercício para te habituares a negar a tua vontade, a desprender-te dela e a unir-te à vontade divina, manifestada através das ordens dos superiores. E quanto mais estrita é a forma de obediência a que estás sujeito, quer dizer, quanto mais tende a abranger não só algum aspecto particular, mas toda a tua vida, mais intenso será este exercício e mais te conformará com a vontade de Deus. É este o grande valor da obediência: conformar a vida do homem com a vontade de Deus, dar ao homem, em todas as circunstâncias, a possibilidade de regular a sua conduta, não segundo a sua vontade, tão débil, frágil, sujeita ao erro, tão limitada e cega, mas segundo a vontade de Deus, tão boa, perfeita e santa, que jamais pode errar, nem querer o mal, mas só o bem, e não o bem transitório que hoje existe e amanhã desaparece, mas o eterno e imperecível.
A obediência leva-te a fazer esta feliz troca: deixar a tua vontade para abraçar a de Deus. É este o motivo pelo qual os santos corriam ao encontro da obediência: conta-se de Sta Teresa Margarida do Coração de Jesus que “não somente voava na execução das ordens, mas até gozava extremamente e exultava em obedecer” (Sp. pg 74). Se custa à natureza negar a própria vontade, renunciar a um projeto, a um plano, a um trabalho muito do nosso gosto, não é nesta renúncia que a alma de vida interior fixa o olhar, mas sofrendo e lutando para se vencer a si própria, lança-o para mais longe: fixa-o na vontade de Deus, que se lhe apresenta escondida na voz da obediência e para essa vontade tende com todas as suas forças, porque abraçar a vontade de Deus é abraçar o próprio Deus.
Colóquio – “Oh! como é doce e gloriosa esta virtude da obediência, que encerra todas as outras virtudes! Nascendo da caridade, nela se apoia o rochedo da nossa santa fé; é uma rainha, e quem a toma por esposa não sente nenhum mal, mas só paz e quietação. As ondas do mar tempestuoso não a podem prejudicar, porque navega na Vossa vontade, meu Deus… Não há desejo algum que não seja satisfeito, porque a obediência fá-la desejar somente a Vós, ó Senhor, que podeis, sabeis e quereis realizar os seus desejos. Oh! obediência, que navegas sem fadiga e chegas sem perigo ao porto de salvação! Ó Jesus, vejo a obediência conformar-se conVosco, e conVosco a vejo subir para a barquinha da santíssima cruz. Concedei-me, pois, Senhor, esta santa obediência, ungida de verdadeira humildade, reta, sem curva alguma, que traz consigo a luz da graça divina. Concedei-me esta pérola escondida e calcada pelo mundo, que se humilha a si mesma, submetendo-se, por Vosso amor, às criaturas” (Sta Catarina de Sena).
Ó Senhor, só tenho uma vida, e de que modo poderei empregá-la melhor para Vossa glória e para a minha santificação do que pondo-a diretamente sob a obediência? Só assim terei a certeza de não perder o tempo e de não me enganar, porque entregar-se á obediência é entregar-se à Vossa vontade. Se a minha vontade é tão defeituosa, a Vossa é santa e santificante; se a minha vontade possui o triste poder de me fazer errar, a Vossa tem o grande poder de santificar a minha pobre vida, de santificar todas as minhas ações, mesmo as mais simples e indiferentes, desde que sejam realizadas sob o Vosso impulso. Ó Senhor, o desejo de viver totalmente segundo a Vossa vontade impele-me para a obediência, faz-me amar e abraçar esta virtude, apesar do meu grande amor à liberdade e à independência.
Ó santa e santificante vontade do meu Deus, quero amar-te sobre todas as coisas, quero abraçar-te em cada instante da minha vida, nada quero fazer sem ti, fora de ti.
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.