Os benefícios de Deus

Uma mulher rezando o Rosário - Martinus Rørbye, 1836, Museu Nivaagaard - Public Domain - Wikimedia Commons

Oh meu Deus! quão grande é a vossa bondade para comigo!

Se considero quanto fizestes por esta indigna criatura, sinto-me confundida e esmagada debaixo da imensidade do Vosso amor!

Tirastes-me do nada para a vida, dando-me deste modo a mim mesma.

Exaltastes-me por Vossa livre vontade a um grau apenas inferior ao dos anjos (1), e destinastes-me para ser eternamente semenlhante a eles no céu (2).

O meu corpo com os seus membros e sentidos é uma obra prima de impenetrável sabedoria.

A minha alma tem impressa em si Vossa imagem e semelhança (3). Pelo entendimento e vontade pode-Vos conhecer e amar! Oh que dita inefável; que nobreza tão excelsa!

Pusestes à minha disposição toda a criação, que está apregoando bem alto a Vossa grandeza, onipotência, sabedoria e bondade; as criaturas são para mim os degraus de escada celeste, pela qual hei de subir até Vós.

Pondes ao meu serviço os próprios anjos para me protegerem, ensinarem e guiarem (4).

E em todas estas criaturas quereis Vós assistir ao meu lado, porque todas elas existem em Vós e por Vós, e cada uma delas tem impressos em si os sinais da Vossa perfeição. Contudo, não Vos destes ainda por satisfeito. O amor não descansa, enquanto não se comunica inteiramente. Por isso, Vós, Senhor, comunicastes o Vosso ser, fazendo-Vos Homem e unindo, por um milagre inaudito e impenetrável, numa só pessoa divina as duas naturezas divina e humana.

Oh mistério inefável! A tal extremo amastes o mundo que lhe destes o Vosso Filho unigênito (5). Por meu amor veio à terra miserável, tomou a forma de escravo (6), fez-se menino fraco e viveu na necessidade, em trabalhos e em privações; por meu amor ensinou, trabalhou e percorreu regiões inteiras, espalhando bênçãos por toda a parte; entregou-se, padeceu e morreu por mim.

E que lições saíram dos seus divinos lábios, que exemplos de virtudes nos deixou!

E que diremos da fundação da Igreja, coluna e fundamento da verdade! que diremos dos sacramentos, fonte inesgotável de toda a sorte de graças!

Que diremos do Santíssimo Sacramento do Altar, onde Ele está sempre presente para minha consolação! Oh monumento dum amor sem limites, quão poderosamente me moves a corresponder-te!

Estes são os benefícios que recebi em comum com todos os homens! Mas de quantos modos mostrastes a Vossa bondade, particularmente para comigo?!

Destes-me bons pais, provestes à minha educação e ensino, e colocastes-me em circunstâncias muito favoráveis para ser feliz no tempo e na eternidade!

Destes-me boas qualidades e bens de fortuna e lançastes no meu coração os gérmens de vida. Quantas graças me concedestes! Quantas vezes instais comigo para que Vos sirva com maior fervor e perfeição! E quantas vezes a Vossa voz repreendeu a minha tibieza! São inúmeras as imensas graças que recebi de Vós, sem nenhum merecimento meu; só no dia do juízo elas serão manifestas!

Mas, se todos estes benefícios são uma prova do Vosso amor, melhor prova é ainda o modo como Vós mos concedeis! Que dignação a Vossa! Sois o Senhor infinito, eterno, o único soberano e grande; e eu, uma criatura miserável, frágil e tirada do nada! E Vós, dignastes-Vos lembrar-Vos de mim para me amardes!

E amais-me porventura como o príncipe bondoso aos súditos, ou como o bom senhor dos criados? Não! Pai nosso, que estais no céu (7), podemos nós dizer-Vos. Amais-nos com amor de pai.

E desde quando? Desde a eternidade: muito antes que eu Vos pudesse corresponder, já Vós pensáveis em mim e ordenáveis tudo para o meu maior bem.

E porque me amais? Acaso por necessitardes de mim? Posso eu acaso contribuir com alguma coisa para a Vossa glória? Não. O Vosso amor é mais puro e desinteressado. Quereis que eu corresponda ao Vosso amor, unicamente para meu bem, para me tornar digna de novas bênçãos.

Oh meu Deus, em verdade Vós sois todo amor!

Oh abismo de bondade, oh oceano de amor! Quem poderá medir a sua profundidade, largura e extensão? Verdadeiramente aqui um abismo está chamando por outro abismo: (8) o abismo da bondade pelo da indignidade.

Como poderei eu pagar-Vos, ó magnânimo e desinteressado dispensador, todos os benefícios que me fizestes e continuais a fazer? (9)

Oh meu Deus! Cesse imediatamente o meu coração de pulsar, como indigno de viver mais um minuto, se á vista de tantos benefícios não bater por Vosso amor.

Se em meu lugar tivésseis criado outra criatura e a tivésseis cumulado de tantos benefícios como a mim, talvez o seu coração estivesse abrasado no fogo da Vossa caridade. Mas até quando resistirá o meu coração ao Vosso amor?

A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.

(1) Salm. VIII, 6.
(2) Mat. XXII, 30.
(3) Sab. II, 23.
(4) Salm. XC, 11-12.
(5) Joan. III, 16.
(6) Fil. II, 7.
(7) Mat. VI, 9.
(8) Salm. XLI, 8.
(9) Salm. CXV, 3.

Última atualização do artigo em 10 de março de 2025 por Arsenal Católico

Compartilhe:

Picture of Arsenal Católico

Arsenal Católico

O Arsenal Católico é um blog dedicado à preservação e divulgação da tradição católica, abordando tudo sobre a Igreja Católica Apostólica Romana. Aqui, você encontra orações católicas, novenas, ladainhas, documentos da Igreja e reflexões sobre os santos e a doutrina católica. Nosso compromisso é oferecer conteúdos profundos e fiéis aos ensinamentos da Igreja, promovendo a formação e o fortalecimento da espiritualidade de cada visitante.
Encontre-nos aqui

Relacionados