Ó Jesus Salvador, tenho necessidade de Vós. Curai-me, tende piedade de mim!
1 – No ciclo dos domingos depois do Pentecostes, a Igreja continua a pôr-nos diante dos olhos, ora sob um aspecto ora sob outro, a obra misericordiosa de Jesus para com as nossa almas. Há quinze dias apresentava-no-la figurada na cura do surdo-mudo; no domingo passado, na ação piedosa do samaritano; e hoje, na cena comovedora dos dez leprosos curados pelo Senhor. Deste modo a Igreja tem em vista manter desperta em nós a humilde consideração da nossa miséria, da necessidade imensa que temos continuamente da obra redentora de Jesus e, ao mesmo tempo, quer fazer-nos sentir que esta obra está sempre em atividade e que em cada dia e a cada momento vivemos sob o seu influxo. O trecho evangélico (Lc. 17, 11-19) escolhido para a Missa de hoje, põe particularmente em evidência o aspecto central da Redenção; a cura das nossas almas da lepra do pecado. Já na antiguidade a lepra foi considerada como a figura mais adequada para nos dar a ideia da fealdade do pecado e, com efeito, seria difícil imaginar coisa mais horrível e repugnante. Todavia ao passo que a lepra do corpo é tão temida, que indiferença e despreocupação entre os cristãos perante a lepra da alma! Como estamos longe do sentimento profundo e realista que os santos tinham da ofensa a Deus! “Ah! – exclama Sta Teresa – porque não compreendemos que o pecado é uma guerra aberta de todos os nossos sentidos e potências contra Deus! Quem mais pode, mais traições inventa contra o seu Rei” (Ex. 14, 2). Um dos frutos do Evangelho deste dia é precisamente o de despertar nas nossas almas um arrependimento vivo e eficaz das culpas cometidas, e um sentimento de humildade profunda ao reconhecermos a nossa miséria. Vamos nós também juntamente com os dez leprosos ao encontro do Senhor e gritemos-Lhe: “Jesus, Mestre, tem compaixão de nós!”
2 – O Evangelho de hoje indica-nos também os remédios contra o pecado. Acima de tudo, a humildade sincera que reconhece a própria miséria; mas a humildade não basta, é preciso que vá acompanhada do recurso confiante de Deus. Os pobres leprosos, conscientes do seu miserável estado, confiaram em jesus e dirigiram-Lhe a sua súplica cheia de confiança: foi o primeiro passo para a cura. Certas almas choram as suas misérias, afligem-se por causa delas, e contudo não se curam porque não sabem recorrer confiadamente a Jesus, o único médico capaz de as curar. A lembrança das suas culpas retém-nas, quase não se atrevem a aproximar-se dEle, não ousam confiar na Sua misericórdia; estas almas não compreendem que devemos ir a Jesus exatamente porque somos pecadores e que “os sãos não têm necessidade de médico, mas sim os enfermos” (Lc. 5, 31).
O divino Mestre não curou diretamente os pobres leprosos, mas enviou-nos aos sacerdotes: “Ide, mostrai-vos aos sacerdotes”; eles obedeceram sem discutir, sem duvidar, “e enquanto iam, ficaram limpos”. Assim procede Jesus conosco. É sempre Ele que nos cura, mas ordinariamente quer fazê-lo por meio dos Seus ministros. Algumas almas não têm fé suficiente na palavra e na obra do ministro de Deus, não acreditam bastante na eficácia dos sacramentos, da absolvição sacramental e vivem por isso em contínuas angústias. Quando uma alma expôs com sinceridade o estado da sua consciência sem intenção alguma de enganar, deve ficar tranquila e confiar plenamente no juízo do sacerdote. Neste caso, pôr em dúvida a palavra do ministro de Deus, duvidar da absolvição recebida, equivale a duvidar do próprio Jesus, visto que Ele decidiu agir em nós por meio da ação dos Seus representantes.
Dos dez leprosos curados só um sentiu o dever de voltar atrás a fim de exprimir o seu reconhecimento ao Senhor. “Feliz a alma – comenta S. Bernardo – que a cada dom da graça de Deus se volta para Aquele que, à nossa gratidão pelos benefícios recebidos, responde com novos benefícios. O que nos impede de progredir na vida cristã, é a ingratidão, porque Deus considera como perdido aquilo que recebemos sem reconhecimento e abstém-Se de nos conceder novas graças”.
Colóquio – “Ó Senhor, médico das almas, sarai-me para que Vos confesse, ó Saúde da minha alma e Vos agradeça com todo o meu coração, os benefícios com que me sustentastes desde a minha juventude e me sustentareis até ao declinar da velhice. Rogo-Vos que me não abandoneis, pela Vossa bondade. Vós fizestes-me quando eu não existia; quisestes-me remir quando eu estava pedido e morto; descestes até ao morto; assumistes a mortalidade; sendo Rei, viestes ao servo para o remir e destes-Vos a Vós mesmo a fim de que eu vivesse; sofrestes a morte, vencestes a morte e, humilhando-Vos, restaurastes-me.
“Eu perecia, estava longe, imerso nos pecados; Vós viestes a mim para me remir e tanto me amastes que destes o Vosso Sangue por mim. Amastes-me, ó Senhor, mais do que a Vós mesmo, pois quisestes morrer por mim. Com tal pacto a um tão elevado preço, reconduzistes-me do exílio, libertastes-me da servidão, arrancastes-me ao suplício, chamastes-me com o Vosso nome, marcastes-me com o Vosso Sangue, para que sempre estivesse em mim a Vossa memória e nunca se apartasse do meu coração Aquele que por mim não Se retirou da cruz. Ungistes-me com o Vosso óleo, o mesmo com que fostes ungido, a fim de que por Vós, ó Cristo, eu fosse chamado Cristão. Assim, a Vossa graça e a Vossa misericórdia preveniram-me sempre. De muitos e graves perigos me livrastes muitas vezes, ó meu Libertador, e quando me extraviei logo me reconduzistes ao bom caminho; quando jazia na ignorância, ensinastes-me; quando pequei, corrigistes-me; quando estive triste, consolastes-me; quando desesperei, confortastes-me; quando caí, levantastes-me; quando estava de pé, sustentastes-me; quando caminhava, guiastes-me; quando cheguei, recebestes-me; quando dormia, guardastes-me; quando Vos invoquei, ouvistes-me” (Sto Agostinho).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.
Última atualização do artigo em 24 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico