Paternidade e maternidade espirituais

Ó meu Deus, uni-me a Vós com o vínculo dum amor intenso e fazei que em virtude desta união eu possa gerar-Vos almas.

1 – Deus concedeu ao homem a grande honra de o tomar por Seu colaborador na obra que mais Lhe é própria e que só a Ele pertence essencialmente, isto é, na comunicação da vida, não só da vida natural, mas também da sobrenatural. No plano natural, que poderíamos chamar o plano da criação, são Seus colaboradores os pais e mães de família, e a eles foi confiada a alta missão de comunicar a vida a novos seres humanos, de os criar e de os educar para a glória divina. no pano sobrenatural, o plano da Redenção, são colaboradores de Deus todos aqueles que, dedicando-se ao apostolado, têm a missão, muito mais nobre e vasta, de comunicar aos homens a vida da graça, sem a qual seriam criaturas infelizes e diminuídas, em certo sentido, não podendo chegar à vida eterna. Na Encíclica Menti nostrae o Papa Pio XII declara: “O sacerdote é… o órgão de comunicação e de incremento da vida do Corpo místico de Cristo. Com a lei do celibato, em vez de perder o dom e o encargo da paternidade, aumenta-a até ao infinito, porque não gera uma prole para a vida terrena e caduca, mas para a celestial e eterna”. Guardadas as devidas proporções, pode afirmar-se o mesmo de qualquer apóstolo, pois o fim último de todo o apostolado é precisamente gerar almas para a vida sobrenatural.

“Filhinhos meus, por quem sinto de novo as dores do parto, até que Jesus Cristo se forme em vós!” – exclama S. Paulo dirigindo-se aos Gálatas (4, 19); de igual modo todo o apóstolo, a respeito das almas pelas quais se sacrifica dando-se inteiramente a si mesmo, tem o direito de se sentir pai e mãe ao mesmo tempo; paternidade e maternidade que são um reflexo, ou melhor, uma participação da paternidade divina. Na ordem natural, Deus estabeleceu que a fecundidade, fonte de vida, fosse o fruto da união entre duas criaturas; na ordem sobrenatural também a fecundidade é fruto de união, mas duma união imensamente superior e toda espiritual, a da alma com Deus. Quanto mais uma criatura se une a Deus por amor, tanto mais participa da Sua fecundidade inesgotável, cujo fim é a comunicação da vida divina aos homens. Quem pois renunciou à paternidade ou maternidade naturais para se consagrar a Deus, não empobreceu nem atrofiou a sua vida na esterilidade, mas em virtude da sua união com Deus, é elevado a uma paternidade e maternidade infinitamente superiores.

2 – É pai ou mãe das almas não só quem trabalha no campo do apostolado exterior, mas também quem se dedica á vida contemplativa pura. S.ta Teresa do Menino Jesus, ainda que totalmente separada do mundo, sente crescer desmedidamente no seu coração o sentimento da maternidade espiritual e, na solidão do Carmelo, escreve: “Ser Vossa esposa, ó Jesus, ser, pela minha união conVosco, mãe das almas!” (M.B. pg. 230); eis a aspiração fundamental do seu espírito, o ideal que a atrai, que a ampara e impele para uma vida de contínua e penosa imolação. A humilde enclausurada tem perfeita consciência de que deve dar-se, sacrificar-se pelas almas, pôr-se inteiramente à sua disposição tal como uma mãe amorosa se dá toda pelos seus filhos. Certo dia, vendo uma noviça dirigir-se indolentemente para o trabalho, a Santa, cheia de fervor, repreende-a: “Bonita pressa para quem tem filhos a sustentar e obrigação de trabalhar para que possa viver!” (CL.).

O verdadeiro apóstolo tem consciência de que tem filhos para alimentar, de que deve consumir por eles toda a sua vida, sustentando-os com os seus suores, com as suas orações, com as suas canseiras e, acima de tudo, com o seu amor. É ao amor – àquele amor que o une a Deus – que vai buscar a força de se sacrificar por eles e também a fecundidade espiritual que faz dele um colaborador de Deus na comunicação da vida da graça. À medida que o amor cresce, amis profunda se torna a união com Deus produzindo um maior poder de comunicação da vida divina a um número imenso de almas. Quem poderá dizer a quantas almas se estende a paternidade e maternidade espiritual dos santos?

Não há vida interior, não há santidade autêntica que não seja adornada com a auréola da paternidade e maternidade espiritual. Mas como no campo natural a mãe não dá á luz os filhos senão na dor, assim na ordem espiritual ninguém se torna pai ou mãe das almas sem sofrimento. Jesus gerou-nos para a vida divina morrendo na cruz; se nos queremos associar à Sua obra redentora, aprendamos dEle a não temer nem perseguições, nem escárnios, nem açoites, nem espinhos, nem cravos, nem cruz, mas a estarmos prontos a dar pelas almas tudo o que temos e somos, até consumir por elas toda a nossa substância e alimentá-las com o nosso próprio sangue.

Colóquio – “Ó eterno Pai, Vós não podeis ignorar que os pobres pecadores são criaturas Vossas e que Vos pertencem pelo título supremo da sua criação.

“Ó Filho, ó rei bendito, Vós não podeis negar que estes miseráveis são Vossos, que foram conquistados por Vós pelo título incontestável da Redenção. Escutai-me, ó Filho obedientíssimo, escutai-me e mostrai-Vos propício às minhas preces porque, apresentando-me eu ao eterno Pai munida com o penhor do Vosso Sangue e da Vossa Paixão, Ele não me poderá repelir para longe de Si sem primeiro ouvir os meus rogos.

“Ajudai-me, ó eterno Espírito Santo! Estes pecadores, ainda que abomináveis pela enormidade dos seus crimes, pertencem-Vos também, porque os fizestes Vossos ao admiti-los à participação da Vossa bondade.

“Ó Senhor, o meu único refrigério é ver o meu próximo converter-se a Vós, e só por isso quero sofrer pacientemente a Vossa ausência. Se não me concedeis esta satisfação, que deverei fazer então? Não me expulseis da Vossa presença, clementíssimo Senhor!

“Vós estais já resolvido e disposto a ouvir-me, pois, ao volverdes, para mim os Vossos olhos benignos, vislumbro, revestidos da Vossa luz, os meus filhos e filhas espirituais, os meus irmãos e todos aqueles que dia a dia ganho para Vós, com o desejo de os ver fiéis a Vós em todo o tempo.

“Recomendo-Vos, ó sumo e eterno Pai, os meus amados filhos, que Vós pusestes sobre os meus ombros, e peço-Vos que os visiteis com a Vossa graça; fazei-os viver como que mortos para o mundo numa verdadeira e perfeita luz e unidos entre si pelo doce vínculo da caridade. Rogo-Vos Pai eterno, que nenhum me seja arrebatado das mãos e perdoai-nos todas as nossas iniquidades. Ofereço-Vos e recomendo-Vos os meus amados filhos porque são a minha alma” (S.ta Catarina de Sena).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

Última atualização do artigo em 8 de março de 2025 por Arsenal Católico

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