Quem morrer separado de Deus, entra na eternidade separado de Deus

Poucos dogmas da nossa Religião sofrem tantas contraditas, como a existência do inferno. Os materialistas o negam, porque não acreditam na existência da alma; negam, por isso, também o céu. Os racionalistas negam a eternidade das penas, a qual eles dizem que não é compatível com a misericórdia e a sabedoria de Deus. Negam-no os espíritas, ensinando que todas as almas se salvam, depois de sofrerem vários castigos em “encarnações” sucessivas. Há mesmo pessoas católicas (mas não o são…) e negam a existência do inferno.

O fim do homem é salvar a própria alma. É ir para o céu. É, portanto, evitar o inferno. Por isto mesmo, a Sagrada Escritura ensina claramente a sua existência, traçando em palavras enérgicas os tormentos que lá se padecem e mostrando como devemos evitá-lo.

Já vimos que alguns não querem admitir a eternidade do inferno. Existe, sim, dizem, mas não é eterno.

Nós recebemos a doutrina do próprio Jesus. Vejamos, pois, o que Jesus ensina a este respeito. Ora, o Evangelho é claro quando fala do inferno eterno. A expressão “fogo eterno” está duas vezes em São Mateus (18, 8 e 24, 41). A segunda citação é a mais expressiva: no dia do juízo final, Jesus dirá aos maus: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno”. Além de tudo, esta sentença sendo final, os maus não terão mais para onde ir. Aquela situação é definitiva para eles.

Neste mesmo capítulo de São Mateus, diz nosso Senhor que os maus “irão para o fogo eterno” (vers. 46). Em São Marcos 3, 29, diz Jesus que “quem blasfemar contra o Espírito Santo, nunca jamais terá perdão: mas será réu de eterno delito”.

A alma em estado de pecado mortal está separada de Deus. Quem morrer separado de Deus, entra na eternidade separado de Deus. Ora, na eternidade não se pode mudar. Logo, aquela alma há de permanecer eternamente separada de Deus.

Se não existe o inferno, ou se não fosse eterno, os pecadores poderiam zombar impunemente de Deus. Com efeito, Deus daria as suas ordens (os mandamentos), seria desrespeitado, e não teria com que castigar os culpados. Ou então castigaria, mas o inferno não sendo eterno, os pecadores ainda zombariam, dizendo: “um dia sairemos daqui, e gozaremos eternamente, mesmo sem te obedecermos”. E um Deus, que se sujeitasse a isto, não seria Deus.

Dizem: “Deus é bom; não vai condenar ninguém ao inferno”. Respondemos: Não é Deus que condena; é o sujeito que se condena.
E mais ainda: É a bondade de Deus, que exige o castigo do inferno. Nós vimos em que consiste a bondade de Deus: em amar necessariamente o bem, em detestar necessariamente o mal. Quem morre em pecado mortal não pode mais nunca ser amado por Deus; só pode ser detestado por ele.

Devemos concluir: Deus é bom, logo o inferno existe. Não confundamos a bondade de Deus com a “bondade” de certos pais que desculpam e até favorecem os males dos filhos. Não são bons: são “bonzinhos”…

Duas sortes de penas devemos distinguir. Não somente os condenados estão privados da visão beatífica, mas padecem também tormentos corporais. São as penas chamadas de dano e dos sentidos.

PENA DE DANO: O maior castigo do inferno é a privação da visão de Deus. Quanto maior é o bem que se perde, tanto maior é a dor. Os condenados perderam o Infinito Bem; o seu sofrimento não tem comparação com nenhum outro. A essência da condenação eterna está nesta separação. Jesus frisou bem isto, quando explicou que dirá aos condenados: “Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno” (Mt 25, 41).

Isto, aliás, é fácil de compreender. A alma humana tende naturalmente para Deus, que é o seu último fim. Aqui no mundo se afasta de Deus sem sentir tanto a separação, porque se ilude com os bens sensíveis. Mas, separada do corpo, sem as ilusões deste mundo, conhece a Deus tal como ele é. Vê que somente com ele poderia ser feliz, e que sem ele não há felicidade possível. Sente, então, um natural e irresistível desejo de se unir a Deus. Mas é tarde, é impossível.

É preciso refletir bem nesta verdade, para poder sentir a sua força.

PENA DOS SENTIDOS: O Evangelho chama ao inferno o lugar dos tormentos. (Lc 16, 28). Portanto, é apenas a privação da visão de Deus. Também as várias expressões usadas por Nosso Senhor indicam os padecimentos que afligem os condenados.

Já vimos também que a existência do fogo no inferno está muito clara no Evangelho. Embora não saibamos de que natureza é este fogo, capaz de castigar as almas, é impossível negá-lo, porque as declarações de Cristo são expressas e repetidas. Também não se pode tomar isto num sentido metafórico ou figurado, mas, sim, real: é mesmo um fogo, ainda que seja diferente do que existe aqui.

Dos rigores da pena dos sentidos podemos imaginar pela energia das expressões de Jesus: “Ali haverá choro e ranger de dentes” (Mt 24, 51).

A tudo isto acrescente-se o desespero. A pessoa agora vê tudo com clareza e sem a mínima ilusão. Sabe que se condenou por culpa própria: nunca lhe faltou a graça divina, e bastava um instante de arrependimento.

Somos criados para salvar a nossa alma. Para este fim primeiro e último é que estamos no mundo. O céu é a nossa verdadeira pátria: “não temos aqui morada permanente” (Heb 13, 14). Desviar-nos do céu é a maior desgraça que nos pode acontecer.

Por isso mesmo nenhum mal é comparável ao pecado mortal, a revolta contra Deus. Querer ir para o céu e pecar mortalmente são coisas incompatíveis. O cristão deve viver permanentemente em estado de graça.

Para viver em estado de graça, devo fugir das ocasiões de pecado, recorrer sempre à oração e aos sacramentos, ser cauteloso com os sentidos, principalmente a vista.

Não ficar em pecado mortal. Mesmo que tenhamos a desgraça de cair, corrermos imediatamente a confessar-nos. Quando, de todo, não for possível a confissão imediata, acostumar-nos ao ato de contrição perfeita. Confessando-nos na primeira oportunidade.

O inferno é o castigo do pecado mortal. De um certo modo podemos dizer que os tormentos do inferno já começam nesta vida, para o pecador. Ele vive separado de Deus, e sob o poder do demônio. Não sente paz interior, mas o verme do remorso lhe rói a consciência. E ai dele, se não sente mais o remorso, nem o temor; então está bem próxima a sua condenação.

Tenhamos muita caridade para com o próximo. Quantos homens caminham para o inferno! Vamos em seu auxílio, rezando, aconselhando, divulgando a verdade, combatendo os erros e os vícios. Os trabalhos da Ação Católica têm em vista a salvação das almas – e isto é uma obrigação nossa.

Para nosso proveito individual, pensemos algumas vezes nas penas eternas. Uma boa meditação sobre o inferno pode evitar que caiamos nele. “Entremos no inferno durante a vida, para não entrarmos depois da morte” (Sto. Agostinho). Quem vive em estado de graça, não deve temer o inferno.

Padre Álvaro Negromonte in A Doutrina Viva – 1938

Última atualização do artigo em 28 de novembro de 2024 por Arsenal Católico

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