Santa Teresa de Ávila († 1582)
A Igreja comemora hoje o dia da filha do Carmelo, Santa Teresa, que nasceu em Ávila, na Espanha em 1515. A educação que os pais lhe deram e ao irmão Roderico, foi a mais sólida possível. Acostumada desde pequena à leitura de bons livros, o espírito da menina não conhecia maior encanto que o da vida dos santos mártires. Tanto a impressionou esta leitura que, desejosa de encontrar o martírio, combinou com o irmão a fuga da casa paterna, plano que realmente tentaram executar, mas que se tornou irrealizável, dada a vigilância dos pais.
A ideia e o desejo do martírio ficaram, entretanto, profundamente gravados no coração da menina. Quando tinha doze anos, perdeu a boa mãe. Prostrada diante da imagem de Nossa Senhora, exclamou: “Mãe de Misericórdia, a vós escolho para serdes minha mãe. Aceitai esta pobre orfãzinha no número das vossas filhas”. A proteção admirável que experimentou durante toda a vida, da parte de Maria Santíssima, prova que esse pedido foi atendido.
Deus permitiu que Teresa por algum tempo, enfastiando-se dos livros religiosos, desse preferência a uma leitura profana, que poderia pôr lhe em perigo a alma. Também umas relações demasiadamente íntimas com parentas levianas, levaram-na ao terreno escorregadiço da vaidade. O resultado disto tudo foi perder o primitivo fervor, entregar-se ao bem estar, companheiro fiel da ociosidade, sem, entretanto, chegar ao extremo de perder a inocência.
O pai, ao notar a grande mudança que verificara na filha, entregou-a aos cuidados das religiosas agostinianas. A conversão foi imediata e firme. Uma grave enfermidade obrigou-a a voltar para a casa paterna. Durante esta doença percebeu o profundo desejo de abandonar o mundo e servir a Deus, na solidão de um claustro. O pai, porém, opôs-se a este plano, no que foi contrariado por Teresa, que fugiu de casa, para se internar no mosteiro das Carmelitas em Ávila. No meio do caminho lhe sobreveio uma grande repugnância pela vida religiosa e por um pouco teria desistido da ideia. Vendo em tudo isto uma cilada do inimigo de Deus e dos homens, seguiu resolutamente o caminho, e ao transpor o limiar do mosteiro, os receios e escrúpulos deram lugar a uma grande calma e alegria de coração.
Durante o tempo do noviciado lhe sobreveio um outro relaxamento no fervor religioso, que, aliás, pouco tempo durou. Deus mais uma vez lhe tocou o coração, mas de uma maneira tão sensível, que Teresa, debulhada em lágrimas, prostrada diante do crucifixo, disse: “Senhor, não me levanto do lugar onde estou, enquanto não me concederdes graça e fortaleza bastantes, para não mais cair em pecado e servir-vos de todo o coração, com zelo e constância.” A oração foi ouvida, e de uma vez para sempre estava extinto no coração de Teresa o amor ao mundo e às criaturas e restabelecido o zelo pelas coisas de Deus e do seu santo serviço.
Foi-lhe revelado que essa conversão era o resultado da intercessão de Maria Santíssima e de S. José. Profunda era a dor que sentia dos pecados e dolorosas eram as penitências que fazia, se bem que os confessores opinassem que nenhuma dessas faltas chegara a ser grave. Em visões lhe foi mostrado o lugar no inferno, que lhe teria sido reservado, se tivesse prosseguido no caminho das vaidades. De tal maneira se impressionou com esta revelação, que resolveu restabelecer a Regra carmelitana, em todo o rigor primitivo. Esse plano encontrou a mais decisiva resistência da parte do clero e dos religiosos. Teresa, porém, tendo a intuição de agir por vontade de Deus, pôs mãos à obra e venceu.
Trinta e dois mosteiros foram por ela fundados e outros tantos reformados e em todos, tanto nos conventos dos religiosos, como das religiosas, entrou em vigor a antiga Regra.
Esta obra sobre-humana não teria tido o resultado brilhante que teve, se não fosse a execução da vontade divina, e se Teresa não tivesse sido pessoa toda de Deus, possuidora das mais excelentes e sólidas virtudes, dotada de grande inteligência e senhora de profundos conhecimentos teológicos.
Santa Teresa teve o dom de ler nas consciências e predizer coisas futuras. Não lhe faltou a cruz dos sofrimentos físicos e morais. No meio das maiores provações, nas ocasiões em que lhe parecia ter sido abandonada pelo céu e pela terra, era imperturbável sua paciência e conformidade com a vontade de Deus. No SS. Sacramento achava a força necessária para a luta e para vitória.
Oito anos antes de deixar este mundo, lhe foi revelada a hora da morte. Sentindo esta se aproximar, dirigiu uma fervorosa circular a todos os conventos de sua fundação ou reforma. Com muita devoção recebeu os santos Sacramentos, e constantemente rezava jaculatórias como estas: “Meu Senhor, chegou afinal a hora desejada, que traz a felicidade de ver-vos eternamente.” – “Sou uma filha de vossa Igreja. Como filha da Igreja Católica quero morrer!” – “Senhor, não me rejeiteis da vossa face. Um coração contrito e humilhado não haveis de desprezar.”
Santa Teresa morreu em 1582, na idade de 67 anos.
Logo após a morte, o corpo da Santa exalava um perfume deliciosíssimo. Até o presente dia se conserva intacto.
REFLEXÕES
Da vida de Santa Teresa podemos tirar três grandes ensinamentos: 1. O ensinamento sobre “a grande importância da oração”. Uma das graças mais preciosas que Deus pode dar ao homem, é o amor à oração. Tereza possuía este amo já no tempo que precedia a sua conversão à vida perfeita. Coisa pior não pode acontecer à alma que perder o gosto pela oração. A alma que não reza, diz a nossa Santa, perde o fundamento; é como um corpo entrevado de reumatismo; torna-se uma coluna de sal diante do perigo que se aproxima. A oração perseverante vence todas as dificuldades e imuniza a alma contra todos os perigos. Santa Teresa experimentou o valor da oração, desde que aprendeu a vencer a si próprio e se desapegar de todas as vaidades.
2. Santa Teresa ensina-nos um modo prático de “suavizar a mortificação”, que tanto custa à natureza humana. Escreveu ela: “Não conheço dificuldade, que me falte ânimo para enfrenta-la. Disto eu tenho provas, e em coisas bem difíceis. Se logo ao começar uma obra santa, conseguia vencer a resistência da natureza cobarde, sempre me vi de parabéns. Se trabalhamos só para Deus, acontece que Ele, para aumentar o nosso merecimento, deixa a alta experimentar certo medo, até o momento que esta se resolva agir. Quanto maior for o pavor antecedente, tanto mais pura costuma ser a alegria depois da obra executada, que a princípio impraticável parecia. Se me é lícito dar um conselho, é este: Aprendi da minha experiência, de nunca dar atenção ao pavor natural do coração e nunca desconfiar da bondade de Deus, quando vos der uma inspiração ata e nobre. Se o único fim é sua honra, não duvideis do feliz êxito, pois Deus é grande e poderoso”. O ensinamento, pois, que Santa Teresa nos dá é que devemos ser corajosos e generosos. O aguilhão da mortificação é o medo e a dor. A generosidade que vai de encontro às dificuldades, e ama a dor, quebra e inutiliza-a, porque só Deus é o único objeto do seu amor e do seu temor. Teresa crucificou o medo, pelo amor e pela generosidade.
3. O terceiro ensinamento que a vida de Santa Teresa nos oferece, é este: “O poder invisível da oração e do sacrifício” é grande, tão grande que sua eficácia às vezes se faz sentir na direção dos povos e da Igreja, Deus se aproveitando do que é fraco para afastar grandes males e operar grandes coisas. Como bem poucos do seu tempo, Santa Teresa, no silencio da oração e do sacrifício, tem sido regeneradora da fé e dos costumes da sua nação. Com a reforma da sua Ordem, Teresa mais fez pela conservação do catolicismo na Espanha, de sua propagação em ultramar, que a grande Armada e o Instituto da Aquisição. Sem a obra de Santa Teresa, a Espanha teria sido preza do Protestantismo invasor, e com ele as terras do novo mundo, a América latina de domínio espanhol. No entanto mais fácil é ganhar povos à religião, do que reformar uma Ordem. Esta é a obra maravilhosa de Santa Teresa, da mulher forte, assombro do seu século, de que Deus se serviu para governar e orientar homens, só porque teve a coragem de confiar em Deus. (Meschler).
Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume II, 1935.