Santo Inácio de Antioquia

Santo Inácio de Antioquia († 107)

Santo Inácio de Antioquia, natural da Síria, é uma das figuras mais simpáticas do tempo apostólico. Discípulo dos Apóstolos, era Santo Inácio primeiro sucessor de São Pedro na sede episcopal de Antioquia, que, naquele tempo, chamada “Rainha do Oriente”, era depois de Roma a cidade mais importante do velho mundo.

São muito poucas as datas que a história nos transmitiu sobre a vida deste Santo. Escritores antiquíssimos reconhecem em Santo Inácio aquele menino que o divino Mestre apresentou aos Apóstolos quando estes entre se disputavam sobre a primazia no céu, e lhes disse: “Aquele que se humilhar como este menino, será no reino dos céus o maior.” (Math. 1 8-4-). Certo é, que Santo Inácio era contemporâneo dos Apóstolos; não só os conheceu, mas neles venerava seus mestres. Há uma opinião bastante fundamentada que diz Santo Inácio ter sido companheiro e discípulo de S. João Evangelista. Inácio é conhecido também pelos nomes de Nurono (palavra síria que significa como Inácio, fogo) e Theophoro. Theophoro o chamaram em alusão ao fato que Matheus refere no capítulo 18 do seu Evangelho. A vida de Santo Inácio, em particular a gestão da Igreja de Antioquia coincidiu com a perseguição religiosa decretada pelo Imperador Trajano.

Com Trajano (98-117) subiu ao trono o protótipo do espírito romano com sua face luminosa e tenebrosa, o espírito de sabedoria e mesquinhez, o espírito prático e superficial, o espírito defensor do direito e da justiça e ao mesmo tempo tirânico e de dureza implacável. Trajano, soldado por excelência e habilíssimo administrador, era inimigo fidalgo de toda a espécie de associação e seleção partidária, exigindo de todos sujeição incondicional às tradições e determinações governamentais. Natural era, pois, que não podia viver em boa paz com a religião dos cristãos. Se, portanto, a perseguia, esta perseguição não era violenta e impetuosa como de outros imperadores, seus antecessores e sucessores, mas a sua era mais calculada e persistente que as deles. As seguintes palavras dirigidas a Plínio, legado imperial de Bithynia caracterizam seu modo de agir: “Não convém dar busca aos cristãos; porém acusados e examinados, devem ser condenados à morte, caso não queiram largar do Cristianismo. Assim se explica que a perseguição de Trajano não se generalizava no império inteiro; em compensação era mais lenta e parcial, dependendo mais das autoridades locais do que da ordem expressa do Imperador. (Meschler.)

Uma das vítimas da perseguição de Trajano era Santo Inácio. Acusado e condenado em Antioquia, foi levado a Roma onde sofreu o martírio, sendo Sura e Senecio cônsules.

Escoltado por 10 soldados, fez a viagem à capital do império, sendo por toda a parte festivamente recebido pelos cristãos das cidades por onde passava. De Seleucia, porto de Antiochia, o navio o transportou a Smyrna, onde se encontrou com o bispo Policarpo e onde recebeu as numerosas comissões que as Igrejas da redondeza tinham delegado para o saudar. De Smyrna chegou a Troas, de onde dirigiu diversas epístolas aos Philadelphios, a Policarpo e aos Smyrnenses. A viagem prosseguiu por mar até a Macedônia e só depois de onze meses chegou a Roma. Embora sujeito a uma rude escolta de soldados ímpios e desalmados, Inácio transformou sua viagem de tortura em percurso apostólico. As admiráveis epístolas que escreveu, são o reflexo do seu grande amor a Jesus Cristo e a sua santa igreja. Em todas elas manifesta um zelo extraordinário pela salvação das almas e pela conservação da fé pura.

Comovedoras são as palavras com que conforta, anima e consola os fiéis. Não perde ocasião de pô-los de sobreaviso do perigo que vinha dos judeus e de seitas “judaizantes” que negavam a morte e a humanidade de Jesus Cristo. Ao mesmo tempo admoestava-os para se conservar na unidade da fé. “Todos devem honrar os diáconos como a Jesus Cristo e respeitar ao Bispo, como à imagem do Pai e acatar os Presbíteros, que são o senado de Deus e o Colégio dos Apóstolos. Sem esta autoridade não há Igreja”. E em outro lugar escreve: “Onde está o Bispo, lá esteja o povo como a Igreja está onde está Cristo.” Da grandiosa epístola aos Romanos seja permitido transcrever o que segue: “como fruto das minhas orações considero a graça de poder ver as vossas faces; alcanceis mais que pedi. Como prisioneiro de Cristo tenho a esperança de vos poder saudar, se Deus me der a graça de como tal perseverar até o fim. O começo foi bom; permita Deus que nada me impeça receber a herança que me é reservada. Tenho medo da vossa caridade. Ocasião mais propícia de me unir a Deus nunca terei, e obra mais meritória não podereis fazer senão esta, de vos abster completamente de qualquer intervenção. Se nada empreenderdes, eu darei testemunho de Deus. Deixai-me sacrificar, eis aí o altar. Eu digo às Igrejas, que quero morrer por Deus, se vós não o impedirdes. Eu vos conjuro, que me poupem de uma caridade importuna. Deixai-me tornar o alimento das feras, para ser unido a Deus. Sou trigo de Deus, pronto para ser triturado pelos dentes das feras, para que possa ser pão imaculado de sacrifício por Cristo. Tratai bem das feras, para que, sendo elas minha sepultura, nada deixem do meu corpo, e a ninguém fique oneroso meu enterro.

Verdadeiro discípulo de Cristo sou, quando o mundo não mais me vê. Estou me exercitando no combate com as feras, que estão a minha espera. Espero, que me recebam benignamente! Até as agradarei, para que me dilacerem sem demora e não me tratem como a outros, que não se atrevem tocar. Se não querem, as obrigarei. Perdoai-me; pois sei o que mais para mim convém.

Agora, sim, começo a ser discípulo verdadeiro de Jesus Cristo. Nada, nem seres visíveis nem invisíveis me impedirão gozar em Jesus Cristo. Venha sobre mim o que for, como sejam fogo e cruz, e feras, mutilação dos membros, esquartejamento do corpo toda a sorte de tormentos dos maus espíritos – contanto que fique unido a Cristo. Nenhum valor tem para mim o mundo e seus impérios. Melhor é morrer por Cristo que reinar no mundo. Eu procuro aquele que morreu por nós e só quero aquele que ressuscitou por nós. Está perto a minha libertação. Tende piedade de mim, meus irmãos, e não me priveis da verdadeira vida; não me condeneis àquilo que para mim é morte… Eu quero morrer. Meu amor é o crucificado.

Há só uma fonte de vida: é aquela que em mim se manifesta e diz: Vamos ao Pai! Se consigo a felicidade de sofrer, vereis nisso o efeito de vossa boa vontade; se não a alcançar, será por vossa culpa e me tereis tratado como inimigo.”

É esta a linguagem dum verdadeiro herói, a expressão mais sublime da ideia cristã, o cântico dos cânticos do Martírio por amor de Jesus.

Quando Inácio chegou a Roma a cidade dos imperadores estava em grandes festas. Terminada a vitoriosa campanha contra os Dacios, o imperador Trajano regalava o povo com festas estrondosas durante 123 dias. Os anfiteatros regurgitavam e mais de 10.000 gladiadores deixaram a vida nos combates com as feras. De todas as províncias vinham os atletas e os governadores dos países mais longínquos mandaram feras, prisioneiros, sentenciados e criminosos para a metrópole. É provável que a viagem de Santo Inácio obedecesse à ordem do governador de Antioquia, que querendo também pagar seu tributo às festas do triunfo, mandou o bispo daquela cidade.

Chegou o dia 20 de Dezembro, dia em que Inácio devia comparecer no Coloseo. Lá estava ele no meio da arena. Ele o bispo de Antioquia, o discípulo de S. João, o intrépido mártir da fé.

Para onde queria que se voltasse, seu olhar sereno e calmo se cruzava com o olhar de milhares e milhares, sedentos do seu sangue, pedindo sua morte.

Já se elevam as jaulas, que trazem preso o rei do deserto. Abrem-se as grades e as feras, sequiosas do sangue das pobres vítimas, sobre elas se precipitam com uivos que fazem gelar o sangue nas veias. Santo Inácio as espera com calma e santo desejo. Elevadas as mãos ao céu, recomenda seu espírito ao seu Divino Mestre, com quem deseja estar unido.

Momentos depois poucos vestígios do sangue na branca areia determinam o lugar, onde o santo mártir exalou seu último suspiro e onde sua alma puríssima encetou o voo sublime ás alturas do reino do céu.

Aqui e acolá se vê um ou outro osso esparso, que dá testemunho da prontidão com que as feras cumpriram o desejo do Santo. Horas depois vê-se um pequeno grupo de cristãos entrar na arena do anfiteatro, agora deserto, para retirar e guardar as santas relíquias do Bispo de Antioquia. Que contraste: de um lado um pequeno grupo de cristãos, reunidos ao redor da urna que contém os restos mortais dum santo mártir e de outro lado a sociedade romana, ébria de poder, riqueza e civilização, saciando seus olhares com um espetáculo no anfiteatro, onde um pobre velho é atirado às feras.

As relíquias de Santo Inácio foram transportadas para Antioquia.

Algumas partículas das suas relíquias descansam à sombra do terrífico anfiteatro em Roma, que bebeu o sangue do Santo mártir.

Santo Inácio era bispo na mesma religião que nós professamos. Perguntemo-nos: que faríamos nós se as circunstâncias nos colocassem em condições análogas as de Santo Inácio? Temos a mesma fé, o mesmo amor a Jesus Cristo e sua Igreja?

REFLEXÕES

1. Ardente era o desejo de Santo Inácio, de poder sofrer e morrer por Cristo. Este desejo tinha sua origem no grande amor a Jesus crucificado. Muitas vezes seus discípulos ouviram-no dizer: “Meu amor é o crucificado.” – Para em verdade poderes dizer, que o crucificado é teu amor, necessário é que o anteponhas ao século e a seus prazeres. Enquanto o mundo te atrair mais que Jesus Cristo, não é verdade, que, Jesus é teu amor. Os dias do Carnaval te darão ocasião ótima para mostrar que teu amor a Jesus é sincero. Muitos católicos, deixando-se levar pela onda da paixão, da cegueira e loucura, cometem graves erros nos dias dedicados ao Momo. Não os imites, mas coloca-te ao lado dos bons amigos de Jesus, evitando o pecado e consolando-o no seu grande Sacramento do amor.

2. Santo Inácio, antes de sofrer o martírio, recomendou aos seus fiéis muita obediência aos bispos. “Onde está o bispo, escreveu ele – lá deve estar o povo, da mesma forma como se diz: onde está Cristo, lá está a igreja. Eu estando entre vós, bradava em alta voz, para que todos me ouvissem e dizia: “Conservai-vos em união ao bispo, aos sacerdotes e diáconos! Era o Espírito de Deus que falava pela minha boca. Nada façais sem o vosso bispo.” – Os bispos, segundo a doutrina de S. Paulo (Act. 20. 28) são colocados pelo Espírito Santo. Na epístola aos Hebreus diz o mesmo Apostolo: (13. 17.) “Obedecei aos vossos Superiores, e sede-lhes sujeitos. Porque eles velam, como quem há de dar conta das vossas almas, para que façam isto com gozo, e não gemendo: pois isto é uma coisa que vos não convém.”

– O tempo em que vivemos é da anarquia, da desobediência, da desordem. Ninguém mais quer obedecer e servir. As ordens, os mandamentos dos bispos são por muitos criticados, desprezados e até ridicularizados. Que responderão eles ao eterno juiz, que disse: Quem vos ouve, a mim ouve; quem vos despreza, a mim é que despreza”, e ainda: “Quem não ouvir a igreja, seja havido como pagão e pecador público. (Math. 18. 17.)

Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume I, 1928.

Última atualização do artigo em 27 de março de 2025 por Arsenal Católico

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