São Luiz Gonzaga, Jesuíta

Giovanni Battista Tiepolo, San Luis Gonzaga na glória [detalhe], Domínio Público, Wikimedia Commons

O DIA 9 de Março de 1568 é a data do nascimento deste grande Santo, tão querido, admirado e venerado pela mocidade católica de que é glorioso padroeiro.

Natural de Castiglione, castelo situado nas imediações de Solferino e Villa Franca, era Luiz o primogênito entre oito filhos do Marquez Fernando Gonzaga e de sua esposa Martha Tana Santena.

Luiz (ou Aloisio, como é chamado também) logo que seus olhos se abriram à luz do mundo, veio a ser filho de Deus e de Maria Santíssima. Seu nascimento era acompanhado de circunstâncias tais que se achavam em perigo sua vida e a de sua mãe, razão porque recebeu imediatamente o santo batismo, fazendo sua mãe um voto a Mãe de Deus, consagrando-lhe o fruto das suas entranhas.

Logo que o menino começou a balbuciar as primeiras palavras, notou-se nele uma simpatia extraordinária para tudo que era de Deus. Cinco anos tinha ele apenas e não raras vezes era encontrado num ou noutro cantinho da casa, fazendo com muita devoção suas orações. Muito criança ainda, por ocasião de uma parada militar que se ia realizar em Casale, foi com seu pai para assistir àquele espetáculo. Estas evoluções foram acompanhadas pelo pequeno Luiz de um interesse tal, que o mesmo, sem que alguém o tivesse percebido, carregou uma peça de artilharia e deitou-lhe fogo. Pouco faltou para que pagasse com a vida a imprudência, pois a carreta recuando-se com a descarga, só por um milagre não o apanhou com as rodas. Estando muito tempo com os soldados, era inevitável que os ouvisse pronunciar palavras pouco decentes, que na sua inexperiência começou a repetir sem saber sua significação. Essas duas faltas Luiz as chorou toda a vida, como se fossem gravíssimos pecados.

Na idade de sete anos começou Luiz a perder o gosto pelas coisas deste mundo e se dedicar ao serviço de Deus. Este seu sétimo ano era por ele mesmo chamado o ano de sua conversão, o ponto de sua saída para uma vida mais perfeita. Desde aquela época, cumprindo seu propósito, rezava diariamente, de joelhos, o ofício de Nossa Senhora e os sete salmos penitenciais, devoção esta que nunca mais abandonou, praticando-a até nos dias de doença.

Tendo Luiz oito anos, quis seu pai que, em companhia de seu irmão menor, fosse para a corte do duque de Toscana, em Florença. Sua vida edificante, a prática das virtudes, importou-lhe o apelido de anjo. Foi em Florença que Luiz fez sua primeira confissão e fez com tanta dor de arrependimento, que caiu sem sentidos aos pés do confessor. Em novembro de 1579, partiu Luiz para Mantua e de lá para Castiglione.

S. Carlos Borromeu, Arcebispo de Milão, numa das suas visitas pastorais, passando por Castiglione, conheceu o santo menino. Descobrindo nele uma compreensão rara das coisas divinas e uma perfeição pouco comum, preparou-o para a primeira Comunhão, a qual recebeu com uma devoção comovedora. Desde então podia-se notar em Luiz uma devoção terníssima ao Santíssimo Sacramento. Recebendo a Santa Comunhão aos domingos, dedicava três dias para se preparar e outros dias para fazer a ação de graças.

Em 1580, foi com sua mãe e seu irmão menor, Rodolfo, a Monteferrato, onde se achava D. Fernando. No caminho havia de passar pelo no Ticino, cujas águas, pelas chuvas contínuas, tinham crescido extraordinariamente. O carro em que iam Luiz e seu irmão, tendo chegado ao meio da torrente, se quebrou em duas partes. A parte da frente pôde com Rodolfo atravessar o rio, quando a outra, em que ia Luiz, foi levada pela correnteza rio abaixo. Em tão evidente perigo, manifestou-se a intervenção da divina Providência. O Carro, esbarrando-se com o tronco de uma árvore, parou, podendo o naufrago assim ser socorrido e salvo.

Com o contato que Luiz teve com os padre Banabitas, despertou-se-lhe cada vez mais o desejo de pertencer a Deus e se desapegar por completo das coisas do mundo. Debalde o Marquez procurava distraí-lo com passatempos. Luiz não só não deixou afastar das suas práticas religiosas, mas ainda as multiplicou, retirando-se quase por completo da sociedade, dos seus divertimentos e prazeres.

Foi também nesta ocasião que tomou a resolução de entrar numa Ordem religiosa. Tendo, porém, apenas treze anos, guardou o maior silêncio sobre este ponto.

De volta para Castiglione, foi Luiz novamente salvo de um grande perigo, de perder a vida, desta vez num incêndio que houve no seu quarto. Uma noite, sentindo-se bastante cansado, fora deitar-se, quando se lembrou ele que ainda não tinha rezado os salmos penitenciais. Pôs-se a reza-los, mas, vencido pelo sono, esqueceu-se de apagar a vela, que se achava a sua cabeceira. Por uma eventualidade qualquer, pegou ela fogo à cama. Estava em chamas o cortinado e o colchão, quando Luiz despertou-se. Aos seus gritos acudiram os empregados, livrando-o do perigo em que se achava.

No ano ele 1581, por um desejo particular da imperatriz Maria da Áustria, esposa de Philippe II, a família Gonzaga transferiu-se para Madrid. O Marquez tomou o encargo de camareiro e seus filhos Luiz e Rodolfo foram nomeados pajens de honra do príncipe D. Diogo, filho de Philippe II.

Nos dois anos que ali estiveram, Luiz continuou seus estudos de Matemática, Filosofia e Teologia natural, adiantando-se bastante nestas matérias. Mais dificuldades achou em continuar as práticas da vida espiritual. Dias havia que tempo não achava para rezar suas orações costumadas e fazer as visitas ao SS. Sacramento. Apesar disto o santo jovem aplicou-se sempre da mais perfeita modéstia. Parecia ter feito um pacto com os olhos para que não se fixassem em coisa alguma que pudesse comprometer a santa virtude da pureza. Todo o tempo que viveu na côrte de Madrid, conservou-os tão mortificados que, sem exagero algum, podia dele se dizer que não reconhecia a rainha dentre as outras senhoras.

Foram de grande importância para Luiz os dois anos que passou na Espanha, porque ali se decidiu a grande questão de sua vocação. Embora já tivesse resolvido a entrar em uma Ordem religiosa, existiam ainda dúvidas sobre a escolha que devia fazer. Para obter o conhecimento da vontade de Deus neste particular, mais que nunca dedicou-se à oração. Depois de ter comparado as diversas Ordens religiosas entre si, Luiz escolheu a Companhia de Jesus como aquela que mais parecia ser de­ acordo com suas qualidades físicas e intelectuais. Um dia – era o da festa da Assunção de Nossa Senhora, quando se estava preparando para receber a Santa Comunhão, ouviu uma voz interior que lhe dizia: “Deves entrar na Companhia de Jesus: comunica logo minha vontade ao teu confessor.”

Obediente à esta ordem, Luiz referiu ao confessor o que se tinha passado e fez também sua mãe conhecedora do seu segredo. Esta experimentou grande satisfação ao saber da resolução do filho; não assim D. Fernando Gonzaga. Ele, ficando ciente do plano de Luiz, tão fóra de si ficou, que num ímpeto de cólera rompeu com palavras ásperas e duras, ameaçando-o até com medidas de excessivo rigor.

Em 1584 a família Gonzaga voltou para a Itália. O Marquez lançou mão de todos os meios para fazer seu filho desistir da resolução de entrar numa Congregação religiosa. Para Luiz foram anos de amargura e de sofrimento horrível. Quanto maiores pareciam as dificuldades que se levantavam contra a realização de sua ideia, com tanto mais fervor se dedicava à oração e às costumadas penitências. O pai, vendo que nada alcançava com meios persuasivos, recorreu à medidas de rigor, chegando ao ponto de expulsar seu filho de casa. Não faltaram pessoas que, interessando-se pela causa de Luiz, falaram a D. Fernando em seu favor. Este só se deixou convencer da vocação de seu filho quando, após uma cena violenta, foi testemunha ocular de uma das penitências que seu filho costumava sujeitar seu inocente corpo. Perturbado, comovido e arrependido de sua excessiva austeridade, resolveu afinal conceder o seu consentimento. Antes, porém, de Luiz tomar o hábito de religioso, quis a vontade do pai que fosse a Milão tratar de negócios importantes. Nove meses durou sua estadia naquela cidade. Durante esse tempo todo Luiz não perdeu ocasião de calçar aos pés as vaidades do mundo. Sendo obrigado muitas vezes a acompanhar os nobres fidalgos em suas festas e diversões, sempre o fez de um modo tal de tirar proveito para sua alma. Todo o tempo que ficava à sua disposição, dedicou-o só às práticas da piedade, mais ainda ao estudo de Física e Matemática no Colégio Brera, dos Padres da Companhia.

Luiz julgava chegado o momento de sua renúncia oficial de todos os seus direitos para entrar na Companhia de Jesus, quando, ele surpresa, chegou em Milão D. Fernando, fazendo novamente oposição à realização de seu plano. Desta vez não foram ameaças e imprecações  as armas de que o Marquez se serviu. Deixou falar o coração paterno, que na sua amargura e nos sentimentos de pai cristão apelava ao coração do filho. Luiz ficou firme, mas teve de permitir que um sacerdote da Companhia de Jesus, durante uma hora, estando o pai presente, o examinasse sobre a vocação. Embora o resultado deste exame fosse favorável ao santo jovem, D. Fernando ainda não se animou a dar seu consentimento. Luiz, entretanto, aumentando suas penitências e orações, preparou-se para a luta decisiva. Um dia, estando o pai de cama, por causa da gota, Luiz entrou no quarto e em tom firme e resoluto, disse-lhe: “Senhor meu Pai, entrego-me inteiramente às vossas mãos, mas protesto-vos que Deus me chamou para a Companhia de Jesus, e que opondo-vos a este desígnio divino, resistis à vontade de Deus. ”Sem esperar resposta saiu do quarto, deixando ao pai tempo para refletir. Este, então, começou a sentir escrúpulos por causa da sua resistência; chorou largo tempo, entregando-se a dor por perder tão bom filho. Afinal mandou que lhe chamassem Luiz e disse a este: “Filho, sangra meu coração de dor pela tua resolução. És merecedor de meu amor. Em ti pusera as esperanças da família, mas vendo que é outra a vontade de Deus, vai, meu filho; siga a voz de Deus e te dou muitas bênçãos.”

Em ato solene, na presença dos parentes mais próximos Luiz fez sua renúncia para no dia seguinte se separar da família e dos pais. Foi um dia de grande dor para estes. Luiz seguiu para Roma, onde se hospedou em casa dum tio seu, Scipião Gonzaga.

Chegou, afinal, o dia desejado que lhe abriu as portas do convento. Luiz contava dezessete anos quando foi aceito como noviço da Companhia de Jesus. Modelo de virtude, que fôra no mundo, muito mais o era no convento. Desejoso de regular sua vida pelas obrigações da vida comum, pediu aos Superiores que não usassem com ele de nenhuma consideração, querendo ser tratado como um dos últimos da casa.

De acordo com o espírito religioso, reconhecia na obediência o fundamento de toda a virtude. “Durante todo o tempo que com ele vivia, diz o cardeal Belarmino, nunca o ouvi proferir uma palavra de queixa ou uma observação contra as ordens dos Superiores.”

Para acompanhar o mestre do noviciado, cuja saúde bastante alterada reclamava uma mudança de clima, Luiz mudou-se em 1586 para Nápoles, onde permaneceu apenas um ano, visto que sua constituição debilitada também não se dava com o clima daquela cidade.

Em 23 de Novembro de 1587, tendo completado seu noviciado, fez seus votos em Roma para depois continuar seus estudos de metafísica e teologia. Dotado de belo talento e inteligência clara, foram admiráveis os progressos que fez naquelas matérias, apesar de graves indisposições.

Antes do estudo, costumava ajoelhar-se e fazer algumas orações. Antes da aula ia à capela visitar o SS. Sacramento. Em todo este tempo de noviciado como depois, Luiz deu belíssimo exemplo na prática das virtudes que transformam o jovem em anjo. Sem dar o menor sinal de ostentação seu exterior traduzia a modéstia, a humildade, a caridade e movia a devoção quantos o viam.

Pela morte do pai de Luiz, surgiram graves desavenças entre Rodolfo e Vicente Gonzaga, seu parente e duque de Mantua. As divergências assumiram proporções tais que era de recear-se um desfecho desastroso. Nesta emergência, a mãe de Vicente pediu aos Superiores de Luiz consentissem que o mesmo se prestasse de árbitro entre os dois contendores. Luiz, com o consenti­mento de seus Superiores, pôs-se a caminho de Castiglione. Recebido por todos quase que em triunfo, foi, em seguida, tão feliz em suas negociações, que só com uma palavra sua restabeleceu a paz e harmonia.

O ano de 1591 começou com os presságios funestos de grande carestia. Faltando o pão, os camponeses fugiram para Roma. A aglomeração de tanta gente originou uma doença contagiosa que, aliada à fome, semeou a desolação e a morte. Os religiosos da Companhia de Jesus tudo fizeram para aliviar a triste sorte dos pobres doentes. Nas ruas, nas praças, nos hospitais, viam-se os filhos de Santo Ignácio socorrer os miseráveis com suas esmolas e sua assistência.

Luiz Gonzaga entre eles era um dos primeiros e mais dedicados. Ia de casa em casa pedir esmola aos ricos para os pobres. Não satisfeito com isso, pediu aos Superiores licença para diretamente acudir às necessidades dos empestados e prestar-lhes serviços nos hospitais. Obtida a licença, sua dedicação e caridade não tiveram mais limites.

Sua fraca constituição não resistiu às grandes fadigas e esforços verdadeiramente sobre-humanos que Luiz fazia no serviço hospitalar, prostraram-no.

Por revelação divina, conhecia ele que a morte estava próxima. Com paciência angélica suportou os graves incômodos do mal que o tinha acometido. Remédios amargos que se lhe davam, ele conservava-os mais tempo na boca para mortificar o paladar. Tendo alguém instado com ele para que pedisse a saúde e a prolongação de sua vida, respondeu-lhes: “É melhor que eu morra.” A morte não podia amedrontar o angélica jovem. Quando soube que tinha chegado a hora de se preparar para a última viagem, exclamou ele com emoções de alegria: “Eu me alegrei no que foi dito: à casa do Senhor iremos.” (Ps. 121). Durante os últimos três dias segurava constantemente o crucifixo e o terço. De vez em quando beijava a imagem de Jesus e seus olhos se enchiam de lágrimas de amor. No seu rosto via-se estampada uma paz celestial, – reflexo de sua alma pura e cândida.

Oito dias depois da festa do Corpo de Deus, em 21 de Junho de 1591, Luiz Gonzaga entregou sua alma ao seu Criador. Suas últimas palavras foram os nomes de Jesus e Maria. Treze anos depois de sua morte, vivendo ainda sua mãe, seu nome foi inscrito no catálogo dos beatos. Sua canonização foi em 1726 celebrada pelo Papa Benedito XIII.

REFLEXÕES

S. Luiz Gonzaga é o padroeiro da mocidade masculina, que a ele se deve dirigir para aprender a virtude da castidade, tão agradável a Deus, tão estimada entre os homens, virtude, porém, a cuja prática se opõe toda a sorte de dificuldades, parecendo que o inferno tem um interesse particular em afastar os jovens cada vez mais dos bons princípios da moral procurando neles implantar um desejo louco de liberdade, que quase sempre conduz ao caminho da impureza.

Quem quer conservar-se casto e puro, deve:

1º evitar as más leituras, que tratam aberta ou disfarçadamente de assuntos escabrosos;

2º fugir da ociosidade, que é a causadora de muitos males;

3º aplicar-se a maior sobriedade no comer e no beber;

4º fugir das más companhias como da peste;

5º só, ter em grande respeito seu corpo, que é um templo do Espírito Santo e trata-lo sempre com a devida modéstia;

6º conservar-se sempre no santo temor de Deus. Quem se lembra da presença de Deus em todo lugar, sairá vencedor das tentações, por mais fortes que sejam;

7º ter em viva lembrança a Sagrada Paixão e Morte de Deus N. Senhor, as grandes verdades da ressurreição da carne e juízo particular e universal. Quem crê verdadeiramente nestas verdades, dificilmente pecará.

Na Luz Perpétua, Leituras religiosas da Vida dos Santos de Deus para todos dos dias do ano, apresentadas ao povo cristão por João Batista Lehmann, Sacerdote da Congregação do Verbo Divino, Volume I, 1928.

Última atualização do artigo em 15 de dezembro de 2024 por Arsenal Católico

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