Utilidade da lembrança da presença de Deus

(Detalhe) Oração - Anna Blunden - "For Only One Short Hour", 1854, Public Domain - Wikimedia Commons

Pela presença de Deus principiai toda espécie de oração, quer mental, quer vocal, e mantende esta regra sem excepção, e em pouco tempo vereis quão proveitosa vos será.

Bem certo é que vossas consolações me consolam grandemente, mas sobretudo quando são fundadas em pedra tão firme como é a do exercício da presença de Deus. Andai, pois, sempre assim perto de Deus, pois a Sua sombra é mais salutar que o sol.

Não é mau tremer, às vezes, diante daquele em cuja presença os Anjos tremem quando O miram na Sua majestade; contanto, todavia, que o santo amor, que predomina em todas as suas obras, predomine também sempre como começo e fim das vossas considerações.

A modéstia por excelência é o decoro do nosso porte exterior. É ela extremamente recomendável por várias razões, e primeiramente porque nos sujeita muito; não há virtude em que se faça mister atenção tão particular; e em nos sujeitar consiste o seu grande valor, pois tudo quanto nos sujeita por Deus é de grande mérito e maravilhosamente agradável a Deus. A segunda razão é que ela não nos sujeita só por um tempo, senão sempre e em todo lugar, tanto estando sós como acompanhados, e em todo tempo, até mesmo dormindo. Um grande santo escreveu a um discípulo seu dizendo-lhe que se deitasse modestamente na presença de Deus, tal como faria alguém a quem Nosso Senhor, estando ainda em vida, mandasse dormir e deitar-se na Sua presença; e, diz o santo, embora não O vejas e não ouças a ordem que Ele te dá, não deixes de fazer isso tal como se O viras, porque de fato Ele te está presente e te guarda enquanto dormes. Ó meu Deus, como nos deitaríamos modesta e devotamente se Vos víssemos! Sem dúvida, cruzaríamos os braços sobre o peito com grande devoção. A modéstia, pois, sujeita-nos sempre e todo o tempo da nossa vida, pelo fato de nos estarem sempre presentes os Anjos, e o próprio Deus, ante cujas vistas nos mantemos em modéstia.

Quando estivermos na presença de Deus, devemos ter duas atenções: uma nEle e outra no que estivermos fazendo.

A maioria das faltas que cometem no cumprimento do seu dever as pessoas piedosas vêm do fato de se não conservarem elas bastante na presença de Deus.

O exercício da presença de Deus é o guarda da pureza e da inocência.

Não me digais que nada fazeis na oração. E que quereríeis fazer nela senão o que fazeis, que é apresentar e representar a Deus o vosso nada e a vossa miséria? A mais bela fala que nos dirigem os mendigos é exporem à nossa vista as suas úlceras e necessidades. Mas, às vezes ainda, conforme dizeis, não fazeis nada de tudo isso, mas ficais, na oração, como um fantasma e uma estátua. Pois bem, não é pouco isso. Nos palácios dos príncipes e dos reis colocam-se estátuas que só servem para recrear a vista do príncipe: contentai-vos, pois, com servir disso na presença de Deus, e, quando lhe aprouver, ele animará essa estátua.

As árvores só frutificam pela presença do sol, umas mais cedo, outras mais tarde, umas todos os anos, outras de três em três, e nem sempre igualmente. Bem felizes somos nós de podermos ficar na presença de Deus, e contentemo-nos de que Ele nos faça dar o fruto cedo ou tarde, ou todos os dias ou às vezes, conforme o Seu beneplácito, a que plenamente nos devemos resignar.

Conservai sempre vossa alma sentada e em repouso diante de Deus durante os exercícios exteriores, e erguida e movediça durante os· interiores, como fazem as abelhas, que não voam nas colmeias e ao fazerem o seu serviço doméstico, porém só à saída. Enquanto estivermos no meio dos afazeres, devemos forcejar por conseguir a tranquilidade do coração, e por manter nossa alma sossegada na oração; se ela quiser voar, que voe; se quiser mexer-se, que se mexa; se bem que a tranquilidade e o simples repouso da alma em ver a Deus, em querer a Deus e em saborear a Deus. ainda seja extremamente excelente.

Como fazeis bem em achardes Deus bom e meigo, e em lhe saboreardes a paternal solicitude para convosco, de modo que, estando vós agora num lugar onde não podeis dispor de tempo para vos exercitardes na meditação, em compensação Ele se apresente mais frequentemente ao vosso coração para fortificá-lo por Sua sagrada presença! Sede fiel a esse divino Esposo de vossa alma, e cada vez mais vereis que, por mil meios, Ele vos fará aparecer o caro amor que vos tem.

Não me espanto, pois, se, dando-vos o gosto da sua presença, Deus vos vai desgostando aos poucos do mundo. Sem dúvida, nada faz achar o azevre tão amargo quanto alimentar-se de mel. Quando saborearmos as coisas divinas, já não será possivel nos venham as coisas mundanas dar apetite. E seria possível que, depois de considerarmos a bondade, a firmeza, a eternidade de Deus, amássemos esta mísera vaidade do mundo? Ora, temos que suportar e tolerar essa vaidade do mundo; mas só devemos amar e apreciar a verdade do nosso bom Deus, que para sempre seja louvado por vos conduzir a esse santo desprezo das loucuras terrenas.

O Segredo da Salvação, A Lembrança da presença de Deus e as Orações jaculatórias, extraído das Obras de S. Francisco de Sales, por Fernando Millon, Missionário de S. Francisco de Sales, 1952.

Última atualização do artigo em 10 de março de 2025 por Arsenal Católico

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