Quantos enganos e orientações heterodoxas poderiam ter sido evitados, se o Vaticano II tivesse sido um concílio dogmático e não um concílio que se chamou pastoral!
Quando se examina as sucessivas redações de documentos conciliares, vê-se as orientações que eles deram. Permitam-se indicar algumas:
O Sacerdócio dos Fiéis
“Lúmen Gentium” faz distinção entre o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial dos padres (nº 10). Mas em continuação, apresenta as páginas que falam do sacerdócio em geral, confundindo os dois e fazendo do sacerdócio ministerial uma função mais ligada ao sacerdócio comum (nº 11).
Exaltação da Consciência acima da Lei
Igualmente se diz que o homem deve se submeter à lei de Deus (Dignitatis Humanae, nº 2). Mas logo a seguir exalta-se a liberdade do homem, a consciência pessoal (nº 3), chega-se a sustentar a “objeção de consciência” (ib. nº 3) de maneira tão geral que chega a ser falsa: “o homem não deve ser constrangido a agir contra sua consciência”.
Isto está certo somente para uma consciência verdadeira ou para uma consciência invencivelmente errônea. A tendência é colocar a consciência acima da lei e a subjetividade acima da ordem objetiva das coisas, quando na verdade, é evidente, a consciência existe para conformar-se com a lei.
Definição Liberal da Verdade
Da mesma maneira, continuamente e de um modo especial na Declaração sobre a liberdade religiosa, repete-se que não se deve forçar, que não deve haver coação (Gaudium et Spes, nº 47, Dignitatis Humanae, nº 1, 2, 3, 10). A liberdade é definida como a ausência de coação. É evidente que não há sociedade sem a coação física das penas, sem a coação moral do temor das penas que estão nas leis; em caso contrário surge a anarquia. Nosso Senhor ele mesmo não deixou de usar a coação; que coação mais forte do que a frase: “Quem não crer será condenado” (Mc 16, 16)? O inferno pesa sobre as consciências, isto é bem uma coação. Há portanto boas e saudáveis coações.
Confusões e Incoerências
Além disso, em “Dignitatis Humanae” não se faz a necessária distinção entre os atos religiosos isentos de coação por parte do Estado, e os que não são isentos; seria necessário distinguir os atos internos e externos, privados e públicos, e não atribuir a todos a mesma liberdade (Cf. nº 2).
Certamente em um país católico, tem-se o direito de impedir que os falsos cultos se manifestem publicamente, de limitar sua propaganda!
Se o Estado não tem direito de intervir em matéria religiosa, então os pais também não têm o direito de transmitir e impor uma religião a seus filhos. Se a liberdade religiosa for generalizada sem nenhuma distinção, chega-se a um absurdo!
Tendência ao Indiferentismo Religioso
Quando se afirma que toda religião é caminho para Deus, ou que o Estado não está qualificado para fazer um juízo sobre a verdade desta ou daquela religião, são ditas coisas que combinam com a heresia chamada indiferentismo: indiferentismo do indivíduo ou do Estado, com relação à verdadeira religião.
É inegável que o Concílio apresenta este indiferentismo ou uma tendência para ele. Exaltando a consciência individual, os valores espirituais e os valores das outras religiões (Nostra Aetate nº 2, Unitatis Redintegratio nº 3, Dignitatis Humanae nº 4) alimenta-se o indiferentismo individual. Proferindo incongruências inauditas, como faz Mons. De Smedt, sobre a incompetência do Estado para julgar a verdade religiosa e reconhecer o verdadeiro Deus, propaga- se o indiferentismo do Estado, seu ateísmo
Estão aí os frutos deste espírito e destas doutrinas deletérias: nenhum católico hoje sustenta que nos países católicos o Estado ainda deva reconhecer a verdadeira religião, ajudá-la com suas leis e inclusive impedir a propagação das falsas religiões. Já ninguém o faz!
Em 1966 a Colômbia era ainda um país 95% católico, graças ao Estado que impediu, pela Constituição, a propagação das seitas protestantes, o que significou uma grande ajuda para a IgrejaCatólica. Protegendo a Fé dos cidadãos, estas leis e estes chefes de estado terão contribuído para levar para o céu milhões de indivíduos, que gozarão da vida eterna graças a estas leis sem as quais não a teriam conseguido. Mas agora na Colômbia, isto acabou. Esta lei fundamental foi suprimida a pedido do Vaticano, na aplicação da liberdade religiosa do Vaticano II! Atualmente as seitas pululam e estes pobres homens estão desarmados ante a propaganda das seitas protestantes, cheias de dinheiro e meios, que trabalham sem cessar para doutrinas os analfabetos. Não invento nada. Por acaso, isto não é uma verdadeira opressão protestante e maçônica para as consciências? A isto chega a pretendida liberdade religiosa do Concílio!
Tendência ao Naturalismo
Se lermos o capítulo V da “Gaudium et Spes” sobre as relações internacionais, as organizações internacionais, a paz e a guerra, não encontraremos quase nenhuma referência a Nosso Senhor Jesus Cristo. Pode por acaso o mundo se organizar sem Nosso Senhor Jesus Cristo, ter a paz sem o “Princeps Pacifer”? É impossível! Em troca o mundo está afundando na guerra e na subversão, antes de tudo porque está afundado no pecado. É preciso primeiro dar-lhe a graça de Jesus Cristo e convertê-lo em Nosso Senhor. Ele é a única solução para o problema da paz no mundo. Sem Ele, fala-se no vazio.
Mons. Hauptmann, reitor do Instituto Católico de Paris, presidiu a comissão de redação deste texto. Esta comissão se reuniu com protestantes, na Suíça, tendo por objetivo que este capítulo pudesse agradar e chegar ao mundo internacional. Como querem que tudo isto seja sobrenatural, marcado verdadeiramente por Nosso Senhor Jesus Cristo?
Limitarei a isto minha enumeração. Não digo que neste Concílio tudo seja mau, e que não haja alguns belos textos que mereçam ser meditados; mas afirmo, com as provas na mão, que há documentos perigosos e inclusive errôneos, que apresentam tendências liberais modernistas, que inspiraram as reformas, que agora deitam a Igreja por terra.
Do Liberalismo à Apostasia – Mons. Marcel Lefebvre – Fonte: Dominus Est