“Todo aquele que quiser ser amigo
deste século, constitui-se inimigo de Deus.” (Sant. IV, 4.)
O mundo, segundo a linguagem do Evangelho, não é mais do que o conjunto dos pecadores, e de tudo o que nos incita a pecar.
Dá-se a estes homens o nome de mundo, porque todos os seus pensamentos e ações se dirigem para as coisas matérias, sendo aos seus olhos completamente desprovidas de valor, as espirituais.
Poderá haver maior oposição do que a que existe entre os princípios do Evangelho e os do mundo?
Se o Evangelho diz: Bem-aventurados os pobres; (1) o mundo afirma que a pobreza é a maior e única desgraça que pode haver.
Se o Evangelho nos ensina que são: Bem-aventurados os que sofrem perseguição; (2) o mundo declara-nos que toda a felicidade consiste em gozar comodamente das alegrias da vida.
Se o Evangelho diz: Bem-aventurados sois, quando vos injuriarem; (3) o mundo o que mais estima é o bom nome e a fama.
Se o Evangelho nos declara que a nossa verdadeira pátria está na outra vida; o mundo apenas conhece a presente.
O mundo é, pois, o avesso de Cristo. É o espírito do inferno sobre a terra, procurando a ruína própria e a alheia. É a idolatria constante do eu, da natureza, da matéria, do tempo com os seus pontífices, adoradores, altares, sacrifícios e cerimônias.
Não é pois, de estranhar que dele se tenha dito que está debaixo do domínio do demônio, (4) que quem é seu amigo se constitui inimigo de Deus, (5) e que Jesus Cristo nos exorte tantas vezes dum modo tão expressivo a que nos guardemos dele.
Não ameis o mundo, nem as suas coisas. Quem o amar, não tem em si o amor do Pai. (6)
Estes dois amores, de Deus e do mundo, não cabem simultaneamente no mesmo coração: um afogará o outro. Não pode pois, haver inimigo mais perigoso do que o amor do mundo.
Nos primeiros tempos do cristianismo os filhos de Deus distinguiam-se facilmente dos do século; agora porém, a tibieza de muitos cristãos fez que entre eles se formasse um mundo, cujos partidários nem sempre é fácil distinguir à primeira vista.
Conservam algumas práticas externas da religião, mas o coração está inteiramente inficionado pelas máximas do século.
O que importa é que se não vá infiltrando em nós insensivelmente e sem o percebermos, semelhante veneno.
Vão empenho é procurar conciliar o mundo e o Evangelho, Cristo e Belial. Quem não está comigo, é contra mim, diz Jesus Cristo. (7)
Por conseguinte, só há um meio para a salvação; quebrar por completo com o mundo, e fazer guerra aberta às suas máximas e costumes.
Digamos com São Paulo: o mundo está morto e crucificado para mim, e eu morto e crucificado para o mundo. (8)
Seja crucificado este traidor que pregou na Cruz o Senhor, e que persegue e despreza os fiéis servidores de Deus.
Seja crucificado este falsário, que prometendo tudo, nada cumpre.
Seja crucificado este louco, que, prezando-se de ilustrado, despreza a doutrina da eterna sabedoria.
Morra na cruz este tirano, que, colocando-se em lugar de Deus, exige dos seus escravos a mais cega obediência.
Morra na cruz este assassino, que lança no peito das suas vítimas o verme da consciência para depois as precipitar no abismo do inferno.
Descem do céu e sobem do inferno mil maldições contra o mundo.
Foge, foge dele; teme os seus atrativos! Seja tua consolação e glória o vitupério, o escárnio e a perseguição por amor de Jesus.
E se ainda assim não te deixar, livra-se dele pela força. Sê por tua parte uma cruz para ele. (9) Bem sabes que ele não a pode sofrer.
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) Mat. V, 3.
(2) Mat. V, 10.
(3) Mat. V, 11.
(4) I Joan. V, 19.
(5) Sant. IV, 4.
(6) I Joan. II, 15.
(7) Mat. XII, 30.
(8) Gal. VI, 14.
(9) Gal. VI, 14
Última atualização do artigo em 10 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico