Ó Jesus, fazei-me digno de me consagra ao Vosso dulcíssimo Coração e de viver a minha consagração.
1 – Precisamente porque a devoção ao sagrado Coração desperta em nós a necessidade de corresponder ao Seu amor infinito, conduz espontaneamente a um ato de consagração pelo qual a criatura se quer entregar toda a Deus que tanto a amou. Consagrar-se ao Sagrado Coração – ensina Leão XIII – “quer dizer entregar-se, unir-se a Jesus Cristo, porque toda a honra, toda a homenagem, toda a piedade para com o Sagrado Coração se dirige na realidade ao próprio Jesus” (Enc. Annum Sacrum). E Pio XI explica em que consiste esse ato: “com esta piedosa consagração oferecemo-nos ao Coração de Jesus com tudo o que temos, reconhecendo que o recebemos da eterna caridade de Deus” (Enc. Miserentissimus Redemptor).
Amar é dar-se. “Amar é dar tudo e dar-se também a si próprio”, cantou Sta Teresa do Menino Jesus (Poesias). O amor, quando é verdadeiro, tem necessidade do dom total e neste dom total a Deus, a alma amante encontra a sua paz e o seu repouso. O grito inflamado de S. Paulo: “caritas Christi urget nos“, resume-se no seu magnífico “ut non sibi vivant, sed ei qui pro ipsis mortuus est” (II Cor. 5, 14 e 15). Sim, a caridade de Cristo constrange-nos a viver, não já para nós mesmos, mas para Aquele que morreu por nós. Quem se consagra a uma pessoa, dá-se todo a ela, não se pertence mais, já não pode viver para si mesmo; os seus gostos, os seus interesses, os seus desejos, devem dar lugar aos gostos, interesses e desejos daquele a quem se entregou e a quem agora pertence. Este é o significado profundo da consagração ao Sagrado Coração, consagração que, longe de se reduzir á recitação duma fórmula, deve abranger toda a nossa pessoa, a nossa vida, as nossas aptidões, empenhando todo o nosso ser e todo o nosso haver no serviço do Divino Coração.
2 – Quando se fala da consagração total ao Sagrado Coração, não se pretende falar da consagração que se faz a Deus por meio dos votos religiosos – reservada só a alguns – mas daquela consagração total proposta a todos por Jesus no Evangelho e que cada um está obrigado a praticar segundo o seu estado. “Amarás o Senhor teu Deus – diz Jesus – com todo o teu coração e com toda a tua alma e com todo o teu entendimento e com todas as suas forças” (Mc. 12, 30); com esta repetição de “todos”, pede-te um amor total e, por isso, pede-te também o dom total de ti mesmo, isto é, pede-te que te entregues a Ele e ao Seu serviço não a meias, mas plenamente. O caminho para o realizares, para demonstrares com fatos a veracidade do teu amor e da tua entrega total é ainda Jesus que te mostra: “Se me amais, observai os meus mandamentos” (Jo. 14, 15). Não vás longe, portanto, à busca de modos e formas particulares para avivar a tua devoção ao Coração Sagrado, não a faças consistir em coisas excepcionais ou extraordinárias, aprende antes a encontrá-la muito próximo de ti na realidade concreta da tua vida quotidiana. Consagrar-te totalmente ao Sagrado Coração, quer dizer escolher os Seus mandamentos, a Sua vontade, os Seus desejos e os Seus gostos para norma da tua vida, pronto a renunciar à tua vontade e aos teus gostos quando estiverem em contraste com os Seus. Muitos são os cristãos que se consagram ao Sagrado Coração, porém poucos os que vivem a sua consagração e a vivem plenamente. A maior parte vive esta consagração a meias, ou seja, prefere a vontade de Jesus à própria quando seria pecado grave agir de outro modo, mas quando se trata de pecados veniais, sobretudo de imperfeições, não tem escrúpulo de contrariar o Coração de Jesus e de agir a seu bel-prazer. Mas Jesus procura amigos mais fiéis, procura almas que vivam a sua consagração a ponto de jamais preferirem um desejo ou gosto pessoal aos Seus desejos e gostos. Não queres ser destes? “Filho, dá-me o teu coração”, repete-te Jesus, e acrescenta: “dá-me inteiramente, vivendo inteiramente segundo o meu coração”.
Colóquio – “Coração adorável do meu amabilíssimo Jesus, que encontrastes em mim de bom para me amardes sem medida, mesmo quando o meu coração, manchado com mil culpas, não manifestava para conVosco senão indiferença e rudeza? As grandes provas de amor que me destes mesmo quando eu Vos não amava, permitem-me esperar que aceitareis complacente as do meu amor, Aceitai, pois, amabilíssimo Salvador, o desejo que tenho de me consagrar inteiramente à honra e á glória do Vosso Coração santíssimo; aceitai a oferenda que Vos apresento de tudo quanto sou; consagro-Vos a minha pessoa, a minha vida, as minhas ações, penas e sofrimentos, querendo ser de futuro uma vítima consagrada à Vossa glória, abrasada num instante e consumida um dia totalmente pelas sagradas chamas do Vosso amor. Ofereço-Vos, ó Senhor e meu Deus, o meu coração com todos os seus sentimentos, porque desejo que em toda a minha vida sejam plenamente conformes aos sentimentos do Vosso. Eis-me aqui, ó Senhor, sou toda do Vosso Coração; eis-me aqui, sou toda Vossa. Ó meu Deus, quão grandes são as Vossas misericórdias para comigo!… Adorável Salvador, recebei também a minha consagração como reparação pelas ofensas que não deixei de Vos fazer até agora, correspondendo tão mal ao Vosso amor. Reconheço que Vos dou bem pouco, mas ao menos quero dar-Vos tudo quando possuo e sei que Vós desejais; por isso, consagrando-Vos o meu coração, dou-Vo-lo para nunca mais o retomar.
“Ensinai-me, amabilíssimo Salvador, o perfeito esquecimento de mim mesma porque só este é o caminho que me pode fazer entrar no Vosso Coração adorável; e já que doravante farei tudo por Vós, permiti que tudo quanto eu fizer seja digno de Vós. Ensinai-me o que devo fazer para chegar à pureza do Vosso amor; mas dai-me este amor, dai-mo ardentíssimo e generosíssimo. Dai-me uma profunda humildade sem a qual ninguém pode agradar-Vos e realizai em mim todos os Vossos santos desejos” (Sta Margarida Maria Alacoque).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.