A reparação

Ó Coração de Jesus ferido por nosso amor, tornai-me digno de reparar as feridas que os nossos pecados Vos infligiram.

1 – O hino das primeiras Vésperas da festa do Sagrado Coração, diz: “Eis como o insolente e horroroso séquito dos nosso crimes feriu o Coração inocente de um Deus”; e com maior realismo, continua: “A lançada do soldado foi dirigida pelos nossos pecados” (BR.). Estas expressões lembram-nos as palavras de Jesus a Sat Margarida Maria: “Eis o Coração que tanto amou os homens… mas em troca do Seu amor infinito, só recebe ingratidão, esquecimento, indiferença, ultrajes, por vezes até daqueles mesmo que deviam tributar-Lhe especial amor”. Perante esta queixa do Coração divino, a alma amante não pode ficar indiferente: quer expiar, reparar, consolar. E quer fazê-lo – ensina Pio XI – por um duplo motivo: “de justiça e de amor; de justiça, para reparar a ofensa causada a Deus pelas nossas culpas…; de amor, para sofrer com Cristo paciente e saturado de opróbios e oferecer-Lhe, segundo a nossa pequenez, algum alívio” (Enc. Miserent. Red.). Que devamos reparar pelos nossos pecados, é fácil de entender, mas que possamos fazê-lo também para consolar o Coração de Jesus, não se compreende tão claramente. “Como se poderá dizer – pergunta Pio XI – que Cristo que reina feliz no céu, possa ser consolado por estes atos de reparação? ‘Dai-me uma alma amante e ela compreenderá o que digo'” (ib.), responde o grande Papa com as palavras de Sato Agostinho. Com efeito, a alma que penetra coma mor no mistério de Jesus, compreende bem que, quando Ele via no Getsêmani todos os nossos pecados, via também todas as boas obras que faríamos para O consolar e, na verdade, consolaram-nO então os atos que hoje realizamos com esse fim. Estes pensamentos estimula-nos cada vez mais à prática de atos de reparação, a fim de que Jesus não tenha motivos para nos dirigir, também a nós, a piedosa queixa: “A dor despedaça-me o coração… esperava alguém que me consolasse e não encontrei” (Missa do S. Coração).

2 – O conceito de reparação evoca o de vítima reparadora, conceito bem conhecido dos devotos do Sagrado Coração e reconhecido oficialmente pela Igreja, através da Encíclica de Pio XI sobre a reparação. O venerando documento explica o que deve fazer a alma que pretende oferecer-se como vítima: “deverá, sem dúvida, não so aborrecer todo o pecado como mal supremo e fugir dele, mas entregar-se inteiramente á vontade de Deus e dedicar-se a reparar a honra ultrajada da divina Majestade pela oração assídua, pela mortificação voluntária, pela aceitação paciente das provas que vêm ao seu encontro, enfim, pela vida inteira vivida segundo este espírito de reparação” (Miserent. Red.). Estamos muito longe do falso conceito de vítima pelo qual, sob o pretexto de se deverem oferecer imolações extraordinárias, as almas se esquivam à realidade da vida quotidiana e se julgam capazes de quaisquer sofrimentos quando, de fato, procuram afastar-se dos sacrifícios de cada dia. O conceito de vítima reparadora proposto pela Igreja, é, pelo contrário, algo de muito sério, concreto e realista. A alma vítima deve reparar o pecado e repará-lo-á fazendo o inverso do que é o pecado. o pecado é um ato de rebelião contra Deus e contra a sua vontade, manifestada na lei e nas disposições da divina Providência. Por isso o inverso do pecado será aderir totalmente à vontade divina, abraçando-a com todo o coração e em todas as suas manifestações apesar das repugnâncias que se possam sentir. Eis o programa da alma vítima: não evitar somente o pecado, nas suas mais leves formas, mas ir ao encontro da vontade de Deus para que Ele possa realmente fazer dela tudo o que quiser. Acrescentará depois orações e penitências voluntárias, mas estas só terão valor na media em que brotarem de um coração inteiramente rendido á vontade divina. E note-se que a primeira penitência – também apontada pela Encíclica – será sempre “a aceitação paciente” das provações da vida.

Colóquio – “Ó Deus, porque não posso lavar com as minhas lágrimas e com o meu sangue todos os lugares onde foi vilipendiado o Vosso Coração? Porque não me é permitido reparar tantos sacrilégios e tantas profanações? Porque não me concedeis, por um só momento, ser senhora do coração de todos os homens, para desagravar, com o sacrifício que deles Vos faria, o esquecimento e a insensatez de todos os que não quiseram conhecer-Vos ou que, embora conhecendo-Vos, tão pouco Vos amaram? Mas, Salvador adorado, o que mais me enche de confusão e mais me aflige, é que eu própria fui destes ingratos. Vós, Deus meu, que vedes o fundo do meu coração, olhai a dor que sinto pelas minhas ingratidões e por ver como sois tão indignamente tratado. Eis-me aqui, Senhor, com o coração despedaçado pela dor, humilhado, aberto, pronto a receber da Vossa mão tudo quanto Vos aprouver exigir-me em reparação de tantos ultrajes” (Sta Margarida Maria Alacoque).

“Sim, meu Deus… Vós sabeis que nada mais desejo do que ser uma vítima do Vosso Sagrado Coração toda consumada em holocausto pelo fogo do Vosso santo amor e por isso o Vosso Coração será o altar onde se deve realizar esta minha consumação em Vós, meu querido Esposo, e Vós deveis ser o Sacerdote que consumirá esta vítima com os ardores do Vosso Santíssimo Coração. Meu Deus, quão grande é a minha confusão ao ver como é culpada esta vítima e indigna de que Vós aceiteis o seu sacrifício. Mas confio que tudo será reduzido a cinzas naquele divino fogo.

“Pela oferta completa que de mim mesma Vos fiz, quero ceder-Vos o meu livre arbítrio, porque só Vós, daqui para o futuro, deveis ser o Senhor do meu coração e por isso só a Vossa vontade deverá ser a norma das minhas ações. E assim, disponde sempre de mim como Vos aprouver porque com tudo ficarei contente… pois desejo amar-Vos com um amor paciente, com um amor morto, quer dizer, inteiramente abandonado a Vós, e com um amor operante, em suma, com um amor sólido e sem divisão e, o que mais importa, com uma amor perseverante” (Sta Teresa Margarida, Sp. pg. 324 e 325).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

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