O Senhor se reuniu com os discípulos que o esperavam, e acompanhado por eles, saiu de casa. Era noite. Deixou para trás a ingrata cidade que não o tinha reconhecido e subiu em direção ao Monte das Oliveiras, do outro lado da torrente do Cedron, onde costumava rezar de noite. Enquanto caminhava, olhando a todos, disse: Todos vós vos escandalizareis de mim esta noite, e fugireis, e me deixareis sozinho quando virdes o que me vai acontecer. O Senhor falava sobre o que fazia sofrer o seu coração; mostrava antecipadamente, como verdadeiro Deus, o que havia de acontecer. Para animá-los dizia que morreria por sua própria vontade e voltaria para perdoá-los, pois sabia o que iria acontecer, que não ficaria surpreendido por se escandalizarem e fugirem. Há muito tempo o Profeta Zacarias profetizou: Ferirei o pastor e as ovelhas do rebanho serão dispersas. Jesus contava que se tornariam fugitivos, porém duas coisas iriam consolar: Eu ressuscitarei ao terceiro dia, e depois de ressuscitado, esperarei por vós na Galiléia, e ali me vereis, e ao ver-me, vos enchereis de alegria.
O Senhor tinha repreendido duas vezes Pedro pela excessiva impetuosidade. Confiava em si mesmo mais do que devia e alardeava diante de todos que nunca abandonaria o Mestre, mesmo se fosse necessário ser preso e morrer. E agora voltava com a mesma suficiência, armado com uma espada para, se necessário, defender o Senhor. Pedro não tinha considerado que Jesus se referia a todos quando disse: Todos vos escandalizareis de mim. Pensava que ele era uma exceção; não reparou que Jesus sempre dizia a verdade, nem que ele era fraco. Por isso protestou e disse: Ainda que todos se escandalizem de ti, eu, porém, nunca! (Mc 14, 29). Pedro dizia o que sentia. A ele diretamente o Senhor profetizou: Em Verdade te digo: hoje, nesta mesma noite, antes que o galo cante duas vezes, três vezes me terás negado (Me 14, 30). Pedro não podia acreditar, parecia que o simples fato de não manifestar a sua determinação de segui-lo até o fim já era uma traição. Por isso insistiu: Mesmo que seja necessário morrer contigo, jamais te negarei! (Mt 26, 35). Os outros apóstolos diziam o mesmo, com semelhante vanglória.
Conversando chegaram a o vale profundo e sombrio, chamado Vale do Cedron (cf. 2Rs 23, 4). Na parte mais profunda passava um riacho seco, por Isso era chamado também de Torrente do Cedron (cf. Jr 31, 40). Do outro lado da torrente, à esquerda, no declive do Monte das Oliveiras, ficava o Horto do Getsêmani. Por ser um lugar solitário e afastado, o Senhor tinha escolhido muitas vezes para orar. Ao passar pelo vale e pela torrente, os discípulos esforçavam em parecerem corajosos, mas é de supor que estivessem angustiados e com medo. O vale era escuro e a torrente profunda e as árvores frondosas, alongavam-se sombras negras pelos penhascos e concavidades do monte; a solidão e o silêncio eram grandes; a noite estava fechada e era muito tarde. Há multo tempo Judas tinha partido.
Tinham falado de traições, de desonra, de torturas e de morte. O efeito que tudo isto pode produzir, no meio daquela escura solidão, no ânimo de uns homens fracos e indefesos era notório.
Chegando à entrada do horto, Jesus ordenou que ficassem ali. Encarregou-os de velar e que não adormecessem, porque iria fazer suas orações, e para que não cairem em tentação, que fizessem o mesmo.
A Paixão do Senhor, Luis de La Palma, 1624.
Última atualização do artigo em 13 de março de 2025 por Arsenal Católico