O espírito de penitência

Santa Rosa de Lima, penitente e mística, 1683, por Claudio Coelho, Museo del Prado, Domínio Público, Wikimedia Commons

Por conseguinte, farei frutos dignos de penitência (Mat, III, 8).

Se Jesus Cristo quer que façamos frutos dignos de penitência, é claro que não basta cumprirmos as obras de satisfação, que o sacerdote nos impõe; é ´preciso que toda a vida do pecador arrependido seja animada do espírito de penitência, e de obras de mortificação.

Se não nos esquecêssemos com tanta facilidade do inferno que merecemos, e no qual devíamos estar há muito tempo, se tivéssemos sempre presentes as injúrias, a ingratidão e os agravos que cometemos contra Deus, se nos lembrássemos com mais frequência das penas que temos de sofrer no purgatório pelas nossas culpas, então o nosso coração inflamar-se-ia num verdadeiro espírito de penitência, e sentiria a necessidade que tem de padecer, de dar a Deus a satisfação que lhe deve, de castigar o pecado em nós.

Oh! como nos devemos sentir envergonhados à vista do fervor dos primeiros cristãos! Que significam aquelas diversas espécies de penitência pública, e os exercícios penosíssimos de jejuns, vigílias e penitências que eles impunham por largos anos, em satisfação de pecados que tantos cristãos cometem, e às vezes até habitualmente, nos nossos dias.

E se a prática da igreja mudou, o espírito é o mesmo.

Façamos pois, frutos dignos de penitência. E lembremo-nos que ela há de ser proporcional ao número e gravidade dos nossos pecados, que há de ser profunda e sincera, como convém ao verdadeiro penitente, e que há de ser perseverante.

Feliz de ti, se morreres na penitência: a tua morte será digna de inveja.

Como será agradável a passagem das amarguras da penitência para as alegrias da glória! Ainda não se acabaram de enxugar as últimas lágrimas nas pálpebras preciosas, engastadas pelos anjos na sua coroa de glória.

Sim; a penitência é um segundo batismo, um batismo de lágrimas; e, segundo diz um grande mestre da vida espiritual, é um julgamento contínuo, que o pecador exerce em si mesmo. Estais mortos, e a vossa vida está oculta com Cristo em Deus. (1)

É uma declaração de guerra ao homem decaído, começada com denodo, continuada com constância, e cada vez mais viva e sangrenta.

Oh tirania santa, que levou S. Pedro de Alcântara a exclamar, quando apareceu a Santa Teresa: Feliz a penitência, que me conquistou tão grande grau de glória!

A penitência é realmente uma fonte de infinitos tesouros.

É mãe de muitas e magníficas virtudes.

Leva à humildade e confirma nela.

Tem por filha a esperança.

Afugenta o desespero, porque apaga a sentença de condenação de que fala o Apóstolo. (2)

É um escudo contra a concupiscência dos olhos e da carne, e contra a soberba da vida.

Abafa o fogo da sensualidade e é fonte dessas consolações celestiais, que não sofrem comparação com nenhuma alegria da terra.

Dá liberdade ao espírito e transforma a juventude numa pléiada de heróis.

A penitência é amor! primeiro temor amoroso que se converte em amor temeroso.

Exercita a caridade, porque sendo severa consigo, é benigna, boa e amistosa com os outros. É severa, mas não melancólica; é confiada, jovial e alegre. É um tesouro de merecimentos incalculáveis.

Finalmente, é a chave do céu. O ferro geme, quando o introduzem na forja; depois, quando já em brasa o levam à bigorna para o afeiçoarem a golpes de martelo, despede de si um mar de faíscas; mas, quando por fim nos aparece transformando em chave preciosa, é ele que nos abre a porta estreita do céu, e que vai adiante de nós, anunciar a chegada do peregrino da terra!

Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados! (3)

Oh Santa Rosa, vítima inocente entre os abrolhos da penitência, vinde ensinar às jovens o que é esta virtude! Vinde ensinar os inocentes, como hão de conservar intacto o frágil vaso, que sustentam nas suas mãos! Vinde ensinar os pecadores como a penitência é cimento sólido, amassado com lágrimas, para unir os destroços do vaso partido por imprudência ou malícia, e para lhe dar a nova forma com que há de ser apresentado aos olhos de Deus, santíssimo e puríssimo.

Sou uma miserável e uma covarde! Posso pecar e não hei de poder fazer penitência?! Tenho audácia para me despenhar no abismo do inferno, e falta-me ânimo para subir a encosta escarpada do céu?!

Ai de ti Corozaim, ai de ti Betsaida! porque se as maravilhas que dentro de vós se fizeram, fossem operadas em Tiro e Sidônia, há muito que elas teriam feito penitência, cobrindo-se de cinza e de cilícios. Contudo, eu vos declaro, que no dia de juízo Tiro e Sidônia experimentarão menos rigor do que vós. (4)

A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.

(1) Col. III, 3
(2) Col. II, 14.
(3) Mat. V, 5.
(4) Mat. XI, 21-22.

Última atualização do artigo em 15 de dezembro de 2024 por Arsenal Católico

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