A tranquilidade da alma é como um banquete eterno. (Prov. XV, 15)
Que felicidade a minha, Senhor, saber que recuperei novamente a vossa graça e amizade! Agora reconheço que estais perto de mim.
Já não vos apresentais como juiz severo, acusando-me dos crimes de traição, rebeldia e ingratidão; diz-me o coração que já me perdoastes; por isso posso agora esperar, confiada, as consolações, que quiserdes derramar sobre mim.
O meu coração, há pouco ainda tão pobre, sente-se agora tão rico! Há pouco tão dividido e transviado, agora tão sereno, satisfeito e feliz! Há pouco tão só e desamparado, e agora tão feliz na vossa companhia, que ela lhe basta e o satisfaz: nada mais lhe resta que desejar.
Transformastes o meu pranto em gozo, rasgastes as minhas vestes de luto para me cingirdes de alegria. Meu Senhor e meu Deus! Quero louvar-Vos eternamente! (1)
E que diferença entre esta alegria e a do mundo! A deste, como breve e falaz, deixa sempre o vácuo no coração, e não tarda em se converter em opressão e amargura: a da boa consciência, dá ao coração um descanso duradouro e uma paz que jamais terá fim.
Sim: a boa consciência é como um banquete eterno (2).
E ainda que o testemunho da boa consciência anda sempre aliado ao temor de Deus, contudo este em nada perturba a sua paz, cheia de felicidade, porque é a guarda da boa consciência e o fundamento da esperança consoladora de que tão íntima felicidade não acabará. A boa consciência é um banquete eterno.
Sim: a boa consciência é fonte de alegria.
Dá-me o testemunho de que vou pelo verdadeiro caminho que me leva direito ao fim, que é a posse de Deus. Pode haver mais fundado motivo de alegria?
Todos os outros bens estão sujeitos a mudanças e alternativas, sobre as quais ordinariamente nada posso influir: a minha consciência porém, pertence-me: e assim posso defendê-la, de modo que nunca sofra o mais leve dano, que continue sempre boa, e unida a Deus.
Todas as alegrias desta vida encerram em si o gérmen da instabilidade e caducidade do mundo; a alegria da consciência porém, tendo o seu fundamente em Deus, é como ele imutável, e como que o princípio da alegria celeste. Não há satisfação maior do que a alegria do coração (3).
A boa consciência dá ao homem a verdadeira felicidade: porque o justo quebrou todas as cadeias e só a Deus reconhece por Senhor.
A boa consciência torna o homem corajoso. Já não teme os homens, que não lhe podem roubar a Deus, nem perturbar-lhe a paz de que desfruta.
Já não teme a morte: espera-a com a maior serenidade e confiança. Quando o justo estiver prostrado no leito de morte, dizei-lhe que será bem sucedido (4). E neste passo que a boa consciência brilha em todo o seu esplendor. É, com um porte repassado de majestade e o sorriso a brincar-lhe nos lábios, que o justo transpõe serenamente os umbrais desta vida como o sol poente, para ir amanhecer na outra, qual inextinguível estrela da manhã.
Nem os sofrimentos e desgraças o justo perde a paz interior: exulta de alegria em todas as tribulações (5), as quais não daria a troco das maiores felicidades da terra.
Oh meu Deus! Como poderei eu agradecer-vos dignamente tão grande felicidade!
Gravado sobre nós está, Senhor o lume do Vosso rosto. Destes alegria ao meu coração (6).
Concedei-me que ela seja duradoura em mim, a fim de que a nossa amizade s robusteça cada vez mais, e o pecado não tenha nunca entrada no meu coração.
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) Salm. XXIX, 12-13.
(2) Prov. XV, 15.
(3) Ecl. XXX, 16.
(4) Is. III, 10.
(5) 2 Cor. VII, 4.
(6) Salm. IV, 7.
Última atualização do artigo em 6 de abril de 2025 por Arsenal Católico