Ó Senhor, Vós que sois doce e suave, ensinai-me a doçura do coração e a suavidade nas relações com os outros.
1 – A doçura é a flor da caridade; é uma participação na suavidade infinita com que Deus guia e governa tudo. Ninguém deseja tão ardentemente o nosso bem, a nossa santificação, como Deus; e todavia Ele não o deseja com dureza, com rigidez ou violência, mas com uma força sumamente suave, respeitando sempre a nossa liberdade, sustentando os nossos esforços, aguardando a nossa adesão à graça com paciência e doçura infinitas. O Evangelho descreve-nos assim a doçura de Jesus: “Não contenderá, nem chamará, nem alguém ouvirá nas praças a sua voz; não quebrará a cana fendida, nem apagará a torcida que fumega” (Mt. 12, 19 e 20). Os fariseus murmuram porque O vêem comer com os publicanos e pecadores e Ele replica: “Ide e aprendei o que quer dizer: ‘Quero misericórdia e não sacrifícios’; porque eu não vim chamar os justos, mas os pecadores” (Mt. 9, 13). Os Apóstolos estão prontos a pedir fogo sobre os samaritanos que rejeitam o Mestre, mas Ele repreende-os: “Vós não sabeis de que espírito sois. O Filho do Homem não veio para perder as almas, mas para as salvar” (Lc. 9, 55 e 56). às almas que, combatendo contra as suas misérias, sentem o peso e a fadiga da luta quotidiana, diz: “Vinde a mim todos os que trabalhais e vos achais carregados e eu vos aliviarei. O meu jugo é suave e o meu peso, leve” (Mt. 11, 28 e 30). O que torna suave o jugo do Senhor, o que torna leve o seu peso, é a Sua caridade infinita que espalha por toda a parte um sentimento de suavidade e doçura.
A caridade fraterna deve desabrochar neste espírito de suavidade que dulcifica as chagas alheias em vez de as irritar, alivia o peso em vez de o aumentar, facilita e suaviza o cumprimento do dever em vez de o tornar mais duro. A caridade pratica esta doçura para com todos, mesmo para com so obstinados, os lentos e preguiçosos em corresponder ao bem, os fracos que sempre recaem nos mesmos defeitos. Ainda que num coração não haja senão uma só parcela de bem é necessário rodeá-la de cuidados amorosos a fim de a ajudar a desenvolver-se. por isso, quem aprendeu a doçura de Jesus, “não apagará a torcida que ainda fumega”.
2 – Nos contatos com o próximo, a nossa caridade é muitas vezes submetida a duras provas e em face da conduta irritante de certas pessoas, os propósitos de doçura são bem depressa substituídos por movimentos de indignação e de cólera. Isto não deve desanimar-nos, pois se trata, em geral, de reações espontâneas, independentes da vontade; mas também não nos deve autorizar a seguir os impulsos da paixão sob o pretexto de que é muito difícil resistir e de que nos sentimos arrastados contra a nossa própria vontade. Em nossas mãos está sempre o poder de reagir e tanto mais facilmente o conseguiremos, quanto mais pronta, enérgica e ao mesmo tempo suave, for a nossa reação. Sta Teresa do Menino Jesus ensinava a uma noviça: “Quando estiver zangada com alguém, o meio de encontrar a paz é rezar por essa pessoa e pedir a Deus que a recompense por a ter feito sofrer”. E sugeria prevenir estes choques procurando “acalmar o coração com antecedência” (1).
Se vemos o próximo irritado e lhe respondemos com ira, não fazemos mais do que aumentar o incêndio, quando afinal o que importa é extinguir a cólera, opondo-lhe doçura e mansidão. Porém, a doçura não e condescendência e muito menos conivência com o mal: há casos em que, segundo ensina o Evangelho, a correção fraterna é um dever imperioso e então é um verdadeiro ato de caridade. Mas para que de fato o seja, nunca se pode fazer com intenção de humilhar, de mortificar e muito menos de ofender o culpado, nunca pode ser inspirado, nem sequer indiretamente, em motivos pessoais, tendentes a fazer valer os próprios direitos e razões, a desforrar-se de qualquer ofensa recebida. Em tais circunstâncias, a correção, longe de ser um ato de caridade, seria absolutamente contrária a esta virtude, e em lugar de fazer bem, produziria antes o efeito oposto. Só um desejo imparcial e sincero do bem alheio pode tornar caridosa e eficaz a correção fraterna e esta deve ser feita com tanta bondade que o nosso irmão sinta nela muito mais o amor que lhe temos do que a humilhação de ser repreendido. Foi assim que Jesus tratou os culpados; todos foram curados pelo Seu amor e pela Sua doçura.
Colóquio – “Ó Senhor Jesus que ao morrerdes sobre a cruz tínheis um coração tão doce para conosco, que nos amáveis tão suavemente quando nós mesmos éramos a causa da Vossa morte e que não pensáveis noutra coisa senão em obter o perdão para os Vossos verdugos quando eles Vos martirizavam e insultavam cruelmente, ajudai-me, eu Vo-lo suplico, a suportar com doçura as imperfeições e os defeitos do meu próximo.
“Ensinai-me a responder aos que me desprezam e murmuram de mim, com humildade, doçura e invariável bondade de coração, sem nunca me defender de modo nenhum. Por Vosso amor, quero deixar a cada um dizer o que lhe apeteça, pois o que vale não são as palavras, mas o amor, e quem mais amar será mais amado e glorificado. Ajudai-me, pois, ó meu Jesus, a amar-Vos e a amar todas as criaturas por Vosso amor, particularmente aquelas que me desprezam, sem me deixar perturbar pelos seus desprezos, mas esforçando-me por praticar a humildade e a doçura; então sereis Vós a minha coroa.
“Ensinai-me a proceder sempre com doçura e suavidade, sem perder a paz com ninguém. Tudo o que puder fazer e obter com amor, fá-lo-ei; o que não puder fazer e obter sem atritos, deixá-lo-ei. Ajudai-me Vós a servir-me das aversões e repugnâncias que encontrar nos contatos com o próximo para exercitar a virtude da doçura, sendo amável para com todos ainda que me sejam contrários ou me causem dissabores.
“Enfim, proponho, com o Vosso auxílio, ó Deus amabilíssimo, aplicar-me a alcançar a doçura do coração para com o próximo, considerando-o uma criatura Vossa destinada a gozar-Vos eternamente no Paraíso. É bem justo que àqueles a quem Vós suportais, ó Senhor Deus, também eu suporte com ternura e com grande compaixão das suas enfermidades espirituais” (cfr. S. Francisco de Sales).
Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.
(1) Conselhos e Lembranças recolhidos pela Ir. Genovena da Santa Face.
Última atualização do artigo em 24 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico