Quem ama o perigo nele perecerá (Ecl. III, 27).
Não basta detestar o pecado; é necessário também estares animada da resolução de fugir enquanto possível, das ocasiões que a ele podem levar.
Todas não se podem evitar: as grandes armadilhas de que está povoado o mundo, e o perigo proveniente das paixões que trazemos dentro em nós, são um grande obstáculo para isso. Contudo há muitas de que podes fugir.
A este número pertencem certas ocupações, companhias, diversões, jogos e livros que te levam como sabes por experiência, a cometer este ou aquele pecado.
Enquanto não fugires delas, não será verdadeiro o propósito que fizeste de te emendares, nem a tua emenda será duradoura.
Constituir-se voluntariamente em ocasião próxima de pecado, é tentar a Deus. Conheces já a tua fraqueza, e sabes por experiência, que posta na ocasião, sempre cais. Em que estribas então a tua confiança? Há de Deus proteger-te com um auxílio mais forte e especial, quando tu te expuseres loucamente ao perigo? Não; o Espírito Santo diz: Quem ama o perigo, nele perecerá (1).
Não exige a justiça que o Senhor te abandone À tua fraqueza, quando voluntariamente te constituis no perigo? Queres que Deus faça um milagre, para que a tua insensatez não te seja prejudicial, para te proteger contra ti mesma?
Consulta a tua experiência. Quantas vezes te enganaste? Tinhas tomado a resolução de te manteres firme e sem vacilar, antes de te expores ao perigo; mas depois, quão amargas lágrimas a tua loucura e imprudência tem de chorar! Quando aprenderás a ser discreta?
E realmente não podia deixar de ser assim. Enquanto a ocasião está longe, julgas-te segura; mas logo que ela se aproxima, as más inclinações levantam-se com novo vigor, os antigos hábitos pecaminosos ressuscitam, a cegueira volta a velar-te os olhos, a vontade vacila, a propensão para o pecado é mais veemente, os pensamentos salutares ocupam um lugar muito secundário, Satanás ganha cada vez mais terreno, e tu, que te deixaste enfraquecer voluntariamente, vacilas e sucumbes por fim à tentação.
Nem podia deixar de acontecer assim, quando ousavas engolfar-te pelos caminhos da perdição, apesar dos avisos do Espírito Santo e da tua consciência: Não ponhas o pé em caminho povoado de escolhos, e não tropeçarás (2).
Bem sei que tem para ti grandes dificuldades quebrar certos laços que te prendem. Renunciar a tal companhia, não tratar com tal amiga, abandonar tal diversão, queimar tal livro, custa-te muito, parece-te impossível.
Mas, compadece-te da tua alma! Que esforço jugarás excessivo, que sacrifício demasiado grande, para conseguires a salvação da alma imortal, a amizade de Deus, a paz do coração, o céu e a eternidade bem-aventurada?
Não faz o home o sacrifício de todos os seus bens para salvar a vida? O mercador, surpreendido no alto mar pela tempestade, corre a lançar ás águas até as mercadorias mais preciosas para se salvar. O enfermo, que se vê na contingência de morrer ou de sofrer uma operação dolorosa, não hesita em recorrer a esta, para prolongar, mais algum tempo os seus dias: e tu não sacrificarás de boa vontade todos os teus bens a troco da vida eterna?
Ânimo, pois. Arma-te com as palavras que saem da boca da Sabedoria eterna: “Se os teus olhos te escandalizarem, arranca-os; porque te é mais conveniente que pereça um dos teus membros, do que cair todo o teu corpo no inferno…” (3).
Coo estremecerás de júbilo e alegria, quando quebrados os vínculos do pecado, alcançares aquele descanso íntimo, aquela paz que vale além de quanto se pode imaginar! (4)
A nossa alma libertou-se como a ave da rede dos caçadores: as redes romperam-se, e nós recuperamos a liberdade. O nosso auxílio está no nome do Senhor que criou o céu e a terra (5).
A Virgem Prudente, Pensamentos e Conselhos acomodados às Jovens Cristãs, por A. De Doss, S.J. versão de A. Cardoso, 1933.
(1) Ecl. III, 37.
(2) Ecl. XXXII, 25.
(3) Mat. V, 29-30.
(4) Fil. IV, 7.
(5) Salm. CXXIII, 7-8.
Última atualização do artigo em 24 de janeiro de 2025 por Arsenal Católico
