Prudência e retidão

Meu Deus, ensinai-me a prudência que a Vós conduz pelo caminho reto do dever e da verdade.

1 – A prudência não se limita a aconselhar-nos as boas obras que devemos fazer para alcançar a nossa santificação, mas acompanha-nos também durante a realização dessas obras, sugerindo-nos a conduta mais adequada ás circunstâncias do momento. A prudência diz-nos, por exemplo, quando é oportuno calar ou falar, agir ou esperar, ceder ou resistir, quando e de que modo praticar esta ou aquela virtude. A prudência é, assim, a grande reguladora de toda a nossa vida, e muito justamente é chamada “auriga virtutum“, quer dizer, aquela que dirige exercício de todas as outras virtudes. No que diz respeito às virtudes morais, a prudência regula-as de modo a manterem a nossa conduta no justo meio, evitando os excessos opostos, que são sempre defeituosos, por exemplo: a demasiada ousadia ou a timidez exagerada, o excesso de atividade ou de passividade, a busca das comodidades ou as penitências que arruínam a saúde, etc… Quanto às virtudes teologais – já que para estas não se trata do justo meio – o papel da prudência consiste em indicar-nos em que circunstâncias ou com que meios devemos praticá-las. Assim, por exemplo, a prudência indicar-nos-á os perigos que ameaçam a fé e a maneira de os evitarmos; inspirar-nos-á com exercer a plena confiança em Deus, sem receio de cair na presunção; ensinar-nos-á a amar a Deus com todo o coração, sem descurar o amor do próximo ou o cumprimento dos nossos deveres; finalmente, a praticar a caridade fraterna com uma dedicação total, mas sem cometer imprudências que poderiam ser muito prejudiciais.

Portanto pode dizer-se que a prudência é útil e necessária em tudo: é como o sal que há de temperar todas as nossas ações. A alma desapegada de si mesma que só põe os olhos em Deus, a alma recolhida que não se deixa dissipar com o tumulto do mundo, percorrerá com facilidade e quase espontaneamente o caminho da prudência sobrenatural e, por este caminho, chegará diretamente a Deus, sem desvios nem perdas de tempo.

2 – “A prudência verdadeira e perfeita aconselha, julga e ordena retamente, em vista do fim último de toda a vida” (S. Tomás IIª IIª, q. 47, a. 13, co). A grande diferença entre a prudência cristã e a prudência do mundo, não está somente na enorme diversidade dos fins a conseguir, mas ainda na escolha dos meios. Ao passo que a segunda não tem escrúpulos de se valer, para alcançar os seus intentos, de meios ilícitos, nem de trilhar os caminhos da mentira, da astúcia, do engano, a prudência cristã rejeita a priori qualquer meio oposto, mesmo levemente, à lei de Deus e só trilha o caminho reto da sinceridade. A prudência cristã pode também sugerir-nos a ideia de adiar para tempo mais oportuno a realização de um projeto, apesar de bom e santo, de não revelar a uma pessoa as nossas intenções, de guardar silêncio a respeito de um determinado assunto, etc., E todavia nunca nos pedirá para faltar ao dever ou à verdade. Quando Jesus dizia que “os filhos deste século são mais hábeis na sua geração que os filhos da luz” (Lc. 16, 8), pretendia certamente estimular-nos a mais prudência e sagacidade na prática do bem, mas certamente não era Sua intenção animar-nos a empregar os meios ilícitos de que se servem com tanta ousadia os filhos das trevas. Não devemos pensar que, por usar apenas de meios bons e retos, a nossa prudência é inferior à do mundo, porque em vez das intrigas e enganos que de modo nenhum podemos imitar, dispomos de um meio muito mais poderoso que, em última análise, obterá sempre a vitória: o recurso a Deus por meio da oração e do sacrifício.

Ao enviar os Seus Apóstolos para o meio do mundo, onde as emboscadas do mal são tantas, Jesus recomendou-lhes: “Sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas” (Mt. 10, 16); indicando ao mesmo tempo estas duas virtudes, prudência e simplicidade, diz-nos claramente que uma nunca deve estar separada da outra, nem uma nos pode servir de pretexto par faltarmos à outra. A prudência não nos deve fazer faltar à simplicidade – é portanto a exclusão de todos os meios que se baseiam na mentira – mas ao mesmo tempo a simplicidade não nos deve fazer faltar à prudência.

Colóquio – “Ó prudência, tu és semelhante a um alto monte; quem nele se alberga conserva-se de saúde, gozando o ar puro e dessas alturas vê e prevê tudo o que deve fazer. Assim, ó Deus, a prudência que de Vós procede, mantém a alma acima das nuvens das paixões e das considerações humanas, confere-lhe maior vigor na virtude, impele-a a honrar-Vos em todas as suas obras e fá-la prever tudo, para se armar de fortaleza contra as tentações. Concedei-me, meu Deus, esta verdadeira e reta prudência, a fim de que ela me leve á união conVosco. E de tal maneira que conduza que, por nenhum motivo ou respeito pela criatura eu deixe de pôr em execução as Vossas obras” (Sta M. Madalena de Pazzi).

“Criai em mim, ó Senhor, um coração puro e infundi em mim um espírito reto. Ensinai-me os Vossos caminhos para que u siga a Vossa verdade. Dai-me a temperança e a prudência, a justiça e a fortaleza fora das quais nada mais há de útil na vida dos homens” (cfr. Sal. 50, 12; Sab. 8, 7).

“Bondade suprema, ó meu Jesus, peço-Vos um coração tão enamorado de Vós que nenhuma coisa da terra possa distraí-lo… um coração livre, nunca seduzido, nunca escravo; um coração reto que nunca ande por caminhos tortuosos” (S. Tomás).

Intimidade Divina, Meditações Sobre a Vida Interior Para Todos os Dias do Ano, P. Gabriel de Sta M. Madalena O.C.D. 1952.

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