Por uma misericórdia de Deus, à qual nunca nos mostraremos bastante gratos, depois da promulgação dos decretos do Santo Padre, o Papa Pio X, as almas piedosas que assistem quotidianamente à Santa Missa, geralmente não deixam de aproximar-se da Sagrada Mesa. Poderia, talvez, parecer supérfluo tratar da assistência ao sacrifício da Missa depois de haver falado da Comunhão. Entretanto, são, para a alma fiel, duas graças distintas; e os frutos “da assistência à missa são, em si, tão preciosos que convém conhecê-los bem: A pessoas que não podem comungar, ou que, havendo comungado numa primeira missa, têm a facilidade de assistir a outra, serão tanto mais levadas a participar do Santo sacrifício, quanto melhor lhe compreenderem os efeitos salutares.
O sacrifício da missa, por ser o sacrifício do próprio Filho de Deus, representa o que há de mais excelente, de mais sublime. “Quando vedes no altar, diz São João Crisóstomo, o sagrado ministro elevando para o céu o Santo holocausto, não creiais que este homem seja o verdadeiro sacerdote; mas, fixando vossos pensamentos acima do que impressiona os sentidos, considerai a mão de Jesus Cristo invisivelmente extendida. (1) É o mesmo sacerdote; é a mesma vítima do Calvário. A morte do Salvador e a Santa Missa não são dois sacrifícios diferentes, mas um só e mesmo sacrifício. Somente a maneira de oferecê-lo é que difere, segundo no-lo ensina o Concilio Tridentino.
Com o mesmo fim por que se imolou no Calvário, Jesus renova o mesmo sacrifício sobre o altar. Presta, a seu eterno Pai, homenagens de adoração verdadeiramente dignas d’Ele, porque, oferecidas por um Deus que se aniquila, têm preço infinito. Oferece-Lhe as únicas ações de graças capazes de agradecer-Lhe condignamente todos os benefícios concedidos à humanidade. Oferece-Lhe, pelos pecados do gênero humano, expiações, as únicas que podem igualar a gravidade das ofensas. Enfim, pede para todos e alcança os socorros necessários para a salvação e até uma superabundância de graças.
Um Deus que, pelos homens, adora, agradece, expia e impetra e, para cumprir esta missão, se aniquila até assumir a forma de uma hostiazinha, pábulo de suas criaturas, que maravilha! E assim Deus é honrado tanto quanto o merece e as dívidas que o homem nunca poderia pagar, são saldadas. O próprio Deus nada podia inventar: não podia dar aos homens mais tocante prova de amor nem mais rico tesouro de graças.
Aos méritos infinitos de Cristo junta-se ainda a eficácia da oração da Igreja que ora pela boca do padre, seu representante. A Igreja, Esposa de Jesus, tão poderosa sobre Seu Coração, intercede, pois, na missa; e que profusão de graças esta sua súplica não faz chover sobre seus filhos!
Eis as fontes de graças a que se saciam os que assistem ao divino sacrifício! Participam da homenagens que Jesus presta a seu Pai e, desta maneira, honram dignamente a seu Deus; agradecem com Jesus; imploram perdão e também intercedem com o Verbo infinito; oram com sua Mãe, a Santa Igreja. Quantos bens espirituais não adquirem assistindo com fervor à Santa Missa!
Por isso, quanta veneração e estima têm demonstrado pelo sacrifício da Missa os verdadeiros amigos de Deus, os quais, com as luzes do Espírito Santo, apreciam tão devidamente as causas santas! São Leonardo de Porto Maurício, prostrado pela doença, arrastava-se à missa e respondia aos que queriam retê-lo: “Não! irei; uma missa vale mais que todos os tesouros.” Santa Joanna d’Arc, na sua ida para Chinon, insistia sem tréguas com seus companheiros, para que assistissem à Santa Missa e tanto instava que conseguia a sua assistência diária. Santa Germana Cousin, sentia-se como que magnetizada ao ouvir os sinos anunciarem o Santo Sacrifício; confiava sua ovelhas à custódia dos anjos e corria a assistir a missa e seu rebanho foi sempre muito bem guardado. O Santo Cura d’Ars conseguira que a quase totalidade de seus paroquianos assistisse cada manhã os sagrados mistérios. Um dos mais célebres solitários da Palestina, Santo Eutímio o Grande, no quarto século, via legiões de anjos a cercarem o altar durante a celebração do Santo Sacrifício. Muitos outros santos vertiam lágrimas de amor ou caíam frequentemente em êxtase quando tinham a felicidade de assistir à missa. São Felipe de Neri escondia-se para celebrar por causa dos êxtases que muita vezes o surpreendiam no altar.
O valor do divino sacrifício é ilimitado; é como um oceano sem fundo no qual cada um haure conforme suas disposições e seu fervor. Os frutos que dele colhemos, estão na razão direta de nossa fé, da nossa confiança, da nossa religião e, sobretudo, do nosso amor. Para mais perfeitamente exercitar estas virtudes, podemos recorrer a vários métodos. Podemos, ou acompanhar atentamente as orações litúrgicas tão lindas e cheias de unção ou meditar no drama do Calvário, de que a missa é o memorial, imaginando estarmos na companhia de Maria Santíssima, de João, de Madalena, ao pé da Cruz, ou aplicar-nos, enfim, a apresentar sucessivamente a Deus, em união com Jesus, nossa adorações, nossos agradecimentos, nossa expiação e nossos pedidos, conforme o fim do sacrifício. Rezando piedosamente o terço, assistimos frutuosamente à missa. Também, e com grande proveito, podemos continuar a nossa meditação, principalmente se nos encontramos numa disposição de amor puro e intenso, e ficarmos intimamente unidos a Jesus, quer nas súplicas e nos ímpetos de amor, quer num amoroso silêncio. Na última Ceia, São João, descansando sobre o Coração de Jesus, contentava-se com amar. No dia seguinte, ele, Madalena, as santas mulheres e a própria Maria Santíssima, amavam, choravam e calavam.
Visita ao Santíssimo Sacramento
A alma desejosa de progredir no amor de Deus não deixa, quando seus deveres de estado não lho proíbem absolutamente, de ouvir, cada manhã, a missa e de receber a sagrada comunhão. Além disso, diligencia voltar, à tardinha, diante do tabernáculo, para prestar suas homenagens a Jesus.
Com efeito, não é só de manhã que o divino Mestre reside em nossas igrejas. Ali está sempre, e sempre para nós; está à nossa espera: será justo que O deixemos sozinho todo o resto do dia sem voltarmos para repetir-Lhe nosso amor e conversar com Ele? Ali está; não num trono de glória, mas num trono de bondade e de misericórdia. A este Cordeiro divino imolado por nós, são devidos louvores, honra, glória e poder nos séculos dos séculos. (1) Estas homenagens, infelizmente, os homens não as prestam como devem ao Deus da Eucaristia; é uma felicidade, para a alma piedosa, consolar a este Rei desconhecido, desagravá-Lo da indiferença de muitos, indo, para isso, cada dia, ao templo, fazer alguns instantes de guarda. Hoje, como sempre, o meigo Salvador, acha suas delicias no convívio com os filhos dos homens; toda alma que O ama deveras quer dar a Jesus esta alegria e delicia-se em Lhe fazer companhia. Não estais ouvindo o Prisioneiro de amor dirigir-vos, sem cessar, lá do fundo do tabernáculo, este doce convite: “Vinde a mim, vós todos que andais fatigados, vós que vergais a peso do fardo, eu vos aliviarei”? Bem raros são, na vida humana, os dias claros, sem nuvem: solicitudes, angústias, labores estafantes, dificuldades mil, ora exteriores, ora íntimas, numa palavra, penas de todo gênero torturam alternativamente e, não raro, simultaneamente, nossos pobres corações. Então, o melhor de nossos amigos, o verdadeiro consolador, o único capaz de espancar a trevas, de nos confortar em nossos desalentos, chama-nos, atrai-nos a Ele. Quão insensatos são os que não respondem a este amoroso convite e deixam de haurir no seu Coração divino a paz e a coragem de que necessitam!
São Francisco Xavier, quando evangelizava as Índias, depois de haver trabalhado o dia inteiro, de sol a sol, catequizando os pagãos convertidos, ia, muita vezes, para descansar, passar a noite junto do Santíssimo Sacramento. O mesmo fazia São Francisco Régis: antes do nascer do dia ia à Igreja e, encontrando-a fechada, ajoelhava-se diante da porta, exposto à chuva e ao frio, até que se abrisse. São Wenceslau, rei, ia a pé, na calada da noite, com o solo coberto de neve, visitar a igreja. Todos os outros santos, todos os verdadeiros amigos de Deus sempre experimentaram estes mesmos atrativos para com o Tabernáculo.
A regra da oração mental que já demos, convém à visita do Santíssimo Sacramento: preparação e presença de Deus, recordação das bondades divinas, do amor de Jesus, atos de gratidão, de humildade e de contrição, pedidos, protestos, promessa e, acima de tudo, amor. A visita ao Santíssimo Sacramento é, a bem dizer, a meditação da tarde, a conversa cheia de abandono e ternura para com o divino Amigo.
Poder-se-ia, mormente em estado de secura ou quando a braços com grandes distrações, valer-se de um livro como a “Imitação de Cristo”, o 4º livro particularmente, ou as “Visitas ao Santíssimo Sacramento”, de Santo Afonso. Seria ainda de real vantagem começar este exercício pela leitura lenta, pausada dos hinos litúrgicos de Santo Tomás de Aquino: Pange língua, Adoro te, Sacris solemniis, Lauda Sion, Verbum supernum.
- Ap., V, 13.
Extraído do Livro “Manual de Espiritualidade” de A. Saudreau, 1937