Hereges e Heresias – A questão eucarística

O mestre da escola de São Martinho de Tours, no século 11, Berengário, foi como a sua vida provou, um hábil dialético, menos versado em questões teológicas e, o que foi pior, orgulhoso e sem sinceridade nas palavras nem nas promessas.

Por certa desarmonia com a escola de Bec, onde Lanfranco brilhava como mestre. Berengário quis atrair os alunos para sua escola ensinando novidades e seguindo mais Escoto Eriúgena, outro dialético já do século nono. E entre outras coisas caiu na questão eucarística.

A princípio parece que Berengário não negava ainda a real presença do Corpo de Cristo na Eucaristia, ensinava apenas que este existe junto coma substância do pão, isto é, existe no pão. Negava portanto, a transubstanciação, como mais tarde chamou a teologia católica esta admirável mudança da substância do pão no Corpo, e da substância do vinho no Sangue de Cristo.

Adelmano, sincero amigo de Berengário, escreveu-lhe tentando desviá-lo deste seu erro. Mas Berengário estava já surdo às vozes do raciocínio e aos conselhos de amigos. Respondeu com atrevimento. E propôs até a Lanfranco uma disputa a respeito da questão.

Quando Lanfranco recebeu esta carta de convite já estava a caminho de Roma. Levou-a e entregou-a ao Papa Leão IX. Este fez ler a carta no sínodo de Roma em 1050, condenou a opinião de Berengário e o convidou a comparecer ao sínodo de Vercelli, no mesmo ano.

Berengário, porém, foi procurar asilo junto ao rei da França, que por sua vez o mandou encarcerar. O sínodo de Vercelli condenou novamente o erro de Berengário. Por dinheiro, este soube livrar-se da prisão em que se achava e começou a angariar adeptos e sócios, que como sempre, apareceram sem tardar.

Novamente condenado no sínodo de Paris, Berengário, em todo caso começou a mostrar-se mais cuidadoso e no sínodo de Tours no ano de 1054, assinou até uma fórmula dogmática que, dizia que depois da consagração, pão e vinho são o Corpo e o Sangue de Jesus Cristo. Mas pouco depois Berengário revogou sua assinatura. O mesmo fez num outro sínodo de Roma, 1059, subscrevendo outra fórmula bem exata e realista, mas sofista como era, explicou-a de modo diferente do sentido que a Igreja dava aos termos, e explicou-a adaptando-a à sua própria opinião. Voltando à França, continuou a propagar o seu erro. Assim passaram-se os anos, entre revogações e renovações de um erro nefasto. Finalmente, num sínodo em Roma, em 1079, Berengário assinou uma fórmula que com toda clareza afirmava que pão e vinho, pela consagração, são mudados substancialmente. Mas até esta fórmula ele soube explicar em favor de suas ideias. Se mais tarde se converteu sinceramente, não se sabe ao certo. Mas é possível, pois morreu em 1088 num mosteiro perto de Tours.

A razão toda deste erro foi simplesmente o orgulho que levou À falta de fé. Porque a Eucaristia é um dos maiores mistérios da nossa Fé. Neste sacramento, quase tudo o que se vê, testemunha contra a real presença do Corpo de Cristo, pois da mudança do pão no Corpo, os nossos sentidos não percebem nada; nem o podem perceber. Testemunham apenas que tanto antes como depois da consagração, o que está sobre o altar é a mesma coisa, pois os nossos sentidos não alcançam imediatamente as substâncias das coisas mas apenas as aparências exteriores, que na Eucaristia ficam as mesmas do pão.

Quem, portanto, nos certifica que depois da consagração está presente o Corpo e o Sangue de Cristo, é só a nossa Fé. Porque cremos em Jesus Cristo, sabemos que é verdade o que Ele disse na última ceia quando instituiu este sacramento: “Isto é o meu corpo – Isto é o meu sangue”. Quem não admite a verdade destas palavras e põe a impressão de seus sentidos acima da sabedoria e veracidade de Deus, natural e logicamente chega a negar a real presença de Jesus Cristo no Santíssimo Sacramento do Altar. Mas deve saber também que não tem mais a verdadeira Fé, aquela Fé absoluta e integral que é exigida para a eterna salvação.

Hereges e Heresias, Frei Mariano Diexhans O.F.M., 1ª Edição, 1946.

Este texto foi útil para você? Compartilhe!

Deixe um comentário