Filólogos e arqueólogos, críticos e juristas celebraram o dia 18 de Outubro de 1947 como o 49 centenário do nascimento de um dos eruditos mais afamados do 16º século. Nós, congregados, temos maior direito de regozijo; pois trata-se de comemorar o nascimento de um filho de Maria que não somente se distinguiu nas le· tras humanas, que não somente glorificou sua Rainha e Mãe celeste em valiosas obras, mas que é ainda um exemplo vivo de como um servo de Maria não se perde.
Foi na pequena povoação de Overijssche, situada entre Bruxelas e Lovaina, na Bélgica, no 18º dia do Mês do Rosário de 1547 que nasceu Justo Lípsio, ou, como, no vernáculo flamengo se chamava, Joest Leps.
Desde os primeiros anos de vida, deu prova de uma inteligência extraordinária. Com seis anos, começou o estudo do latim e, quando com 12 anos se transferiu para o colégio dos jesuítas em Colônia, já escrevia versos e fazia discursos na língua do Lácio. Seus mestres favoreciam o estudo dos idiomas clássicos. Isto, por sua vez, moveu o jovem a ingressar na Ordem a que pertenciam seus mentores. O pai de Justo, porém, não concordava. Quis que o filho estudasse filosofia e direito. Justo mudou-se para a universidade de Lovaina. Com 19 anos, publicou a primeira obra, com o título: “Váriae Lectiones”, obra esta que dedicou ao Cardeal Granvella.
Este poderoso príncipe da Igreja chama o jovem autor para Roma. Aqui lhe estão à disposição as vastas bibliotecas e os riquíssimos tesouros de documentos e monumentos da antiguidade clássica. Na Cidade Eterna, lança os fundamentos daquele saber excepcional que assombrou o mundo culto da época e que ainda irradia de suas muitas obras. Mas foi aí também que começou a sentir o espírito da revolta religiosa que, com seu sopro mortal, fazia fenecer tanta flor de graça e santidade.
Por isso, sua volta para Lovaina, onde, com companheiros levianos, se entregou a uma vida dissoluta. foi desastrosa. Irrequieto, afastava-se da única fonte da paz. A mesma pátria não tem já atrativos para ele. Dirige-se para Viena e de lá para a universidade protestante de Jena, onde leciona história e professa abertamente o luteranismo.
Mas não acha sossego. Volta para Lovaina onde adquire o título de doutor em direito e é nomeado professor desta ciência. Publicando a primeira edição crítica de Tácito, mostra mais uma rica faceta de seu gênio. A universidade calvinista de Leiden (Holanda) quer incluí-lo no seu corpo docente. Nessa cidade, Justo edita eruditos trabalhos sobre Valério Máximo, Sêneca e outros, e passa do luteranismo ao calvinismo. Lecionando na universidade de Leiden história literária, dá-se conta do rigorismo teológico da doutrina de Calvino e sente saudades da liberdade verdadeira que oferece a Igreja de Cristo aos. seus filhos. Pretextando motivos de saúde, dirige-se para Spaa, com a intenção de voltar para o seio da Igreja católica. E, em Março de 1591, na igreja dos jesuítas de Mogúncia, reconciliou-se com a fé dos seus antepassados.
Muitos são agora os oferecimentos honrosos de bispos, reis e príncipes. Até o Papa Clemente VIII convida-o para que ocupe uma cátedra universitária. Justo, porém, prefere a sua antiga Alma Mater de Lovaina por dois motivos: é o amor à pátria, é a modéstia, – prova irrefutável de sua conversão sincera. Mas o modesto professor de latim e história antiga não pode declinar da nomeação para Historiador da Coroa com que Filipe II, rei da Espanha, o quis distinguir.
Sua fama de docente atraiu a muitos, entre os quais os arquiduques Alberto e Isabel. O exemplo deste insigne príncipe teve os efeitos mais salutares, não só para o povo católico em geral, senão especialmente para Lípsio. Renovou nele a sua antiga devoção a Maria Santíssima. O que viu nos santuários marianos de Hal e Montaigu (Bélgica) levou o Congregado Justo Lípsio a descrever a munificência da Rainha dos Céus em latim clássico nas duas obras: “Diva Virgo Hallensis. Beneficia ejus et miracula fide atque ordine descripta”, e “Diva Sichemiensis sive Aspricollis”. E para manifestar de algum modo sua gratidão devida à excelsa Padroeira, pelos lumes recebidos na sua atividade de escritor, ofertou à imagem veneranda de Hal uma pena de prata.
Rodeado de padres franciscanos e jesuítas, o grande latinista, no leito de morte, pediu que mais uma vez rezassem com ele a Ladainha de Nossa Senhora e declarou ser sua maior consolação o ter venerado a Maria Santíssima desde a sua infância.
O Congregado Justo Lípsio morreu em Lovaina, aos 24 de Abril de 1606. Conforme sua última vontade, seu coração foi levado para a igreja dos padres jesuítas em Lovaina.
Mariano Célebres, por Werner J. Soell, S. J., 1955.
Última atualização do artigo em 4 de fevereiro de 2025 por Arsenal Católico